A boa ideia de Maia
Rodrigo Maia, empoderado como poucas vezes se viu um presidente da Câmara dos Deputados pelo vácuo da insanidade bolsonarista, quer introduzir o futebol brasileiro na era moderna.
Em encontro na CBF ele defendeu a ideia já tentada diversas vezes sem sucesso no Brasil: obrigar os clubes a se transformarem em empresas.
Quer mais: quer abri-los ao capital estrangeiro porque é a única maneira que vê de torná-los competitivos e capazes de manter seus jogadores no país.
Maia diz já ter conversado com o ministro da Economia Paulo Guedes e que deve apresentar nos próximos meses um projeto de lei que introduza o futebol na contemporaneidade.
Botafoguense que é, ele está vendo seu clube correr o risco de desaparecer, mas não é por motivo tão pessoal que pensa no tema: "Um clube associativo não vai atrair capital estrangeiro. Fora o Flamengo, o Corinthians e o Palmeiras, os demais clubes caminham para uma situação de inviabilidade. O atual modelo não gera bons clubes de futebol", exagera com boa dose de razão, porque, na verdade, nem mesmo o trio tem garantia de autossustentabilidade.
E não é a primeira vez que Maia pensa no assunto.
Na virada do século, ainda em seu primeiro mandato, já manifestava curiosidade sobre o tema e ouvia opiniões a respeito.
Talvez pela primeira vez desde que Charles Miller, em 1894, trouxe o futebol ao Patropi alguém, com o poder de Maia, esteja pensando com método e ferramentas sobre a necessária revolução feita há tanto em outros países e apenas ensaiada por aqui, sempre derrotada pelo reacionarismo dominante na cartolagem nacional.
Maia deve se preparar para enfrentar forte resistência, não da imprensa ou da opinião pública, ao contrário, mas da superestrutura do esporte e de seus representantes na bancada da bola.
É famosa a tentativa semelhante feita na Argentina, ainda na gestão do mafioso Julio Grondona na Associação de Futebol da Argentina.
Em 1998, o então presidente do Boca Juniors, Mauricio Macri, apresentou a Grondona o projeto das Sociedades Anônimas Desportivas, que reagiu com grande entusiasmo e o incentivou a levar a ideia a seus pares na AFA.
Marcou-se a reunião com os 25 representantes da federação, não sem antes Grondona se reunir com todos eles.
Macri fez a apresentação que seria a salvação dos falidos clubes argentinos sob respeitoso silêncio e redobrada atenção de Don Julio que, ao cabo da fala do cartola xeneize, perguntou: "Alguma dúvida, alguém quer mais explicações?".
Diante do mutismo geral, determinou: "Votemos, então!", algo surpreendente em sua gestão, sempre caracterizada por acordos de bastidores.
Imediatamente 24 mãos se levantaram rejeitando a proposta de Macri.
Grondona então levantou-se da cabeceira, caminhou vagarosamente em direção a Macri, abraçou-o e lamentou alto e bom som: "Perdimos, Mauricio, perdimos!".
O neoliberal Macri chegou à Presidência da Argentina, mas não só faz péssima gestão, como até hoje não conseguiu operar a mudança estrutural essencial também para o futebol dos hermanos.
Aliás, como Zico e Pelé nas leis que levaram seus nomes, obrigados a recuar da obrigatoriedade para apenas permitir a transformação dos clubes em empresas.
A diferença é que Maia sabe que precisa fazer, tributariamente, a mudança ser mais vantajosa que o atual regime do clube associativo.