A ditadura da não monogamia

Toda forma de amor vale a pena, a gente sabe, já deveria estar cansado de saber. Mulher com homem, homem com homem, mulher com mulher. Mas principalmente aquele modelo de relação em que não se tem exclusividade, em que ninguém é de ninguém, o mais apreciado e difundido pelos estudiosos do comportamento, que decretaram o fim do amor romântico.

Há tempos ouço sobre esse divórcio entre a felicidade e o “até que a morte os separe”. E sempre fez todo sentido. Quando a gente é só hormônios desgovernados, curiosidade e liberdade. “Não tenho tipo, tenho pressa” é um lema que combina com o conceito de amor livre e de satisfação garantida. Para que repetir a mesma refeição todos os dias quando podemos nos lambuzar?

E eu que passei parte da vida liberando desejos, equilibrando namoros, casos, trombadas, achando a grama do vizinho mais verde e o próximo sempre mais atraente que o atual, me pego numa crise sem precedentes porque não tenho a menor vontade de partir dessa relação para uma, se não melhor, mais fresca. Não tenho o mais remoto desejo de pedir um vale night e me entreter com doces e deliciosos desconhecidos. De flertar no balcão do bar ou no sinal do trânsito, distribuir likes para mocinhos trabalhados no tanquinho e na belezura, partir da timeline para o inbox e pular das discussões filosóficas sobre a política externa americana para a cama de algum seguidor do Twitter.

Baita crise perceber que estou fora de moda, que me contento com essa prisão monogâmica que tanto me foi alertada por terapeutas sexuais, psicólogos e psicanalistas. Não tenho mais tesão por ninguém que não seja meu digníssimo, e lá se vão seis anos de união. Especialistas dirão que são os hormônios que falham, que ando distraída para as tentações do mundo, que basta olhar em volta, que estou presa ao tipo de relacionamento imposto pelas sociedades patriarcais que dominam o mundo.

Talvez.

Talvez me falte empenho em entender que o amor daquele jeito que conhecemos é apenas obrigação, que agora está liberado o “não tem tu, vai tu mesmo” ou ainda “tem tu, mas vou ali e já volto”. Sei que estou errada, que a ditadura da monogamia acabou e estou livre para chafurdar sexualmente pela vida sem me importar com os julgamentos de uma sociedade que ainda insiste num conceito tão retrógrado quanto o de amar e desejar exclusivamente alguém. E, veja só que loucura, ser correspondido.

Pode ser que eu apenas estivesse cansada de pular de uma cama para a outra, de amar João, mas querer dar para José, já de olho em Pedro. Pode ser que eu estivesse empapuçada de sexo avulso, de satisfação efêmera, de colecionar histórias inacabadas, de não ter saudade, de não olhar para a frente e ser feliz com a mesma paisagem.

Pode ser que eu esteja errada e que o amor romântico seja apenas insegurança e carência afetiva e que no final a gente saia por aí para satisfazer alguns vazios que esse amor, segundo os especialistas, não preenche. Pode ser só preguiça de ser charmosa e interessante por causa de meia hora de prazer, seguida de despedidas sempre desconfortáveis.

Ou não. Pode ser que, mesmo careta, ultrapassado, seja afinal a tal sorte de um amor tranquilo e completo. E que ao acabar com a ditadura da monogamia a gente não precise instaurar outra no lugar. 

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