A pauta da masculinidade
A pauta masculina surge como reação a décadas de movimento feminista e está na ordem do dia. Ela revela que confundir masculinidade com machismo é injusto com os homens. Se alguém ainda duvida disso, basta lembrar que existem hoje algumas mulheres militando pelo antifeminismo (meus sais! é duro ter que escrever essa frase), prova de que discursos misóginos podem sair da boca de qualquer um.
Homens que se identificam com a agenda feminista não deveriam fazê-lo por dó ou paternalismo —só cai nesse equívoco quem é bem intencionado, mas não entendeu nada.
A busca por uma relação igualitária entre os gêneros é encampada por aqueles que reconhecem a oportunidade de se livrar dos ditames de uma masculinidade opressiva. Assumir uma vida amorosa baseada no afeto e não na dependência financeira está entre as metas almejadas, assim como o respeito todas as orientações sexuais. Estar junto aos filhos, deixando de ser o pai que chega para dar a bronca ou que só traz o dinheiro para casa, se mostra uma das aspirações.
A pauta é grande e também inclui a possibilidade de estabelecer relações fraternas com outros homens com trocas profundas e íntimas ao invés de competir, exibir ou fazer network.
A vida social dos homens, mesmo quando intensa, nem sempre revela encontros suficientemente significativos. A ausência dessa troca mais profunda promove desajustes sociais, sensação de isolamento, sofrimentos não compartilhados e diversos sintomas que escutamos diariamente no divã.
Além disso, homens têm se movimentado na defesa das mulheres e outras minorias vítimas de um discurso patriarcal, que promove violências que englobam tanto o feminicídio quanto a tragédia de Suzano.
Nesse sentido, a iniciativa de universitários integrantes de Comissões Anti-Opressão (CAO), que buscam inibir os casos recorrentes de ataques sexuais a mulheres nos campi, tem sido inspiradora. Casos de racismo, homofobia, transfobia, entre outras minorias, também estão na agenda dessas comissões, que visam conscientização e solidariedade.
Uma das ações é promover rondas em sistema de revezamento na tentativa de aumentar a segurança dos alunos em dias de festa ou encontros sociais. Elas inibem as ocorrências de crimes e os jovens se prontificam a levar vítimas à delegacia ou encaminhá-las onde for necessário.
Formadas por alunos voluntários, essas comissões demonstram que podemos ensinar aos rapazes formas mais efetivas de contribuir para a causa das mulheres do que gestos paternalistas e inócuos.
O movimento masculino demorou para tomar corpo, mas é muito bem-vindo, pois tem trazido frutos promissores. Grupos se espalham pela cidade para discutir a crise da masculinidade, que passa a ser encarada como uma oportunidade de transformação e reconhecimento. Jovens da periferia se reúnem para debater sua posição no mundo a partir da questão da masculinidade, da raça e da condição social e usam a virtualidade para ampliar o alcance das discussões. Ícones da mídia, que costumam ser modelos para outros homens, passam a oferecer alternativas identificatórias para uma masculinidade que não combina com violência e ignorância.
É necessário coragem para tratar de um tema fadado à crítica pronta e à truculência disfarçada de potência viril.
Se a ideia neste momento é "que ninguém solte a mão de ninguém", os homens vão precisar perder a vergonha de andar de mãos dadas para que as mulheres possam oferecer-lhes as suas.