Abraham Weintraub precisa acabar com o diversionismo no MEC
A mudança no Ministério da Educação (MEC) pode ser uma boa notícia se o novo ministro, Abraham Weintraub, dedicar seu tempo ao enfrentamento dos verdadeiros desafios da educação brasileira.
Nos últimos 100 dias, com Ricardo Vélez Rodríguez no cargo, infelizmente, o que se viu foi o oposto: a ideologização de questões técnicas como a alfabetização, a ameaça de tutela das avaliações educacionais e o desejo de reescrever a história, propondo que os livros didáticos deixassem de nomear como ditadura um regime que caçou direitos políticos, censurou a imprensa e as artes e perseguiu seus opositores, causando indignação até mesmo entre os militares.
Sobrou política e faltou gestão ao ex-ministro da Educação. Os principais programas do MEC estão paralisados, há incerteza nos estados e municípios quanto ao repasse de recursos de programas pactuados na gestão anterior e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) corre o risco de não ocorrer, o que prejudicaria milhões de alunos.
Os problemas da educação básica brasileira são graves e conhecidos. Metade dos alunos não está alfabetizado entre oito e nove anos de idade, 40% não termina o ensino médio antes dos 19 anos e daqueles que terminam apenas 7 em cada 100 sabem o esperado em matemática.
Nossas crianças ainda não estão nas creches e pré-escolas. E nossos professores não têm formação inicial e continuada adequadas para o salto que a educação brasileira precisa urgentemente dar.
Para enfrentar os problemas reais da educação o novo ministro deve inicialmente romper com o diversionismo ideológico e organizar uma equipe coesa e tecnicamente capaz, em oposição ao arquipélago que se transformou o MEC nesses 100 dias.
O Brasil felizmente conseguiu produzir um razoável consenso entre especialistas e gestores educacionais de diversas matizes sobre o que deve ser feito na educação.
É fundamental que o MEC exerça seu papel e inicie já o diálogo com o conjunto de secretários estaduais e representantes dos dirigentes municipais de educação para desenhar uma agenda comum para os próximos anos.
Caberá também ao ministro e sua equipe dar solução rápida que garanta a realização do ENEM no prazo correto, destravar programas de transferências financeiras já pactuadas com os municípios e garantir apoio técnico aos estados e municípios para a implementação da nova Base Nacional Curricular Comum.
Paralelamente às urgências, o MEC precisa iniciar o desenho da nova proposta do Fundeb, o fundo que garante o financiamento da educação básica. O fundo vence em 2020 e sua renovação depende de uma emenda constitucional.
Criado em 1997 e ampliado em 2007, o fundo foi responsável pela elevação do número de alunos matriculados nas escolas e pela melhoria da remuneração dos professores, especialmente nas regiões mais vulneráveis do Brasil.
Espera-se que sua nova formatação possa contribuir para reduzir desigualdades regionais no financiamento educacional, garantindo um sistema mais equitativo.
Como se vê, a agenda é extensa e desafiadora, compreendendo ainda uma nova política para o ensino médio e a implementação de um sistema único de educação que organize as atribuições dos estados, municípios e da União.
Para dar conta desta agenda, todas as ações do novo ministro e sua equipe devem ser coerentes com um único objetivo: a garantia do direito de aprender de todas as crianças e jovens brasileiros.
Em uma democracia, o lugar da promoção de ideologias é a praça pública. De um Ministério da Educação espera-se tão somente que se dedique à nobre tarefa de garantir educação de qualidade para todas as nossas crianças e jovens.
Alexandre Schneider é pesquisador do CEPESP/FGV e consultor em educação, ex-secretário Municipal de Educação de São Paulo