Ala vai de Luxemburgo para campeão da NBA
Alfonzo McKinnie não estava exatamente ficando rico com o basquete, jogando pelo Rayos de Hermosillo na principal liga do esporte no México, mas seu contrato incluía um benefício: 40% de desconto nas “buffalo wings” em um bar esportivo perto do ginásio.
Lá, ele se acomodava diante de um telão, com uma porção de “buffalo wings”, e assistia ao Golden State Warriors jogar sem ele nos playoffs da NBA — o que era compreensível, já que o time nem sabia que McKinnie existia.
Isso aconteceu no segundo trimestre de 2016, e o glamour do basquete de elite parecia muito distante.
“Eu assistia a cada jogo”, disse McKinnie. “E provavelmente comi tudo que havia no cardápio daquele bar”.
Naquele momento, McKinnie havia acabado de passar oito meses jogando por um dos piores times na segunda divisão do basquete de Luxemburgo e por isso o México era grande avanço.
Para um ala desconhecido de 2,03 m de altura e com um joelho que passou por cirurgia, era bom estar pelo menos no mesmo continente em que nasceu. “Dizia a mim mesmo que era preciso jogar onde as luzes brilham”, disse McKinnie. “Minha sensação era a de que era lá que eu queria estar, e que lá era meu lugar”.
Graças ao poder do pensamento positivo e a uma imensa determinação, ele enfim havia provado que tinha lugar não só na NBA, mas na equipe mais temida da liga. O jogador reconhece o quanto sua história é interessante. “Fico muito empolgado com isso também”, disse. “Não posso culpar as pessoas por essa reação”.
O Warriors, que conquistou dois títulos consecutivos na NBA, conseguiu se reforçar para a nova temporada, mas nenhum dos novos contratados teve impacto semelhante ao de McKinnie, 26, que garantiu uma das últimas vagas no elenco do time durante treinos de pré-temporada.
Seu momento de vitória surgiu na semana passada, contra o Chicago Bulls, quando ele marcou 19 pontos e teve 10 rebotes em uma vitória fácil.
Se o seu desempenho ficou à sombra do de Klay Thompson, que estabeleceu um novo recorde na NBA com 14 arremessos de três pontos convertidos, McKinnie ainda assim ficou feliz por estar acertando seus arremessos diante de parentes e amigos.
O desempenho dele não foi acidente. McKinnie já mostrou que pode influenciar o resultado, vindo do banco.
Em um jogo muito disputado com o Minnesota Timberwolves, ele fez uma enterrada, apanhou um rebote defensivo e acertou um arremesso de três pontos, em um período de 55 segundos no quarto quarto, ajudando seu time a selar mais uma vitória.
“Ele foi uma grande surpresa para nós”, disse o treinador Steve Kerr. “Entrou no time e realmente aproveitou a oportunidade que surgiu para ele”.
McKinnie sabe que na verdade não deveria estar ali, dividindo o vestiário com jogadores como Stephen Curry e Draymond Green. Ele vem ouvindo a mesma pergunta muitas vezes, recentemente, e ela é mais ou menos a seguinte: Como isso é possível?
McKinnie não foi recrutado por uma grande universidade, quando estava no segundo grau em Chicago. Ele estudou na Eastern Illinois, e mais tarde se transferiu para a Universidade do Wisconsin, em Green Bay, onde sua carreira na quadra foi interrompida por um par de cirurgias no joelho direito.
Como aluno de quarto ano, na temporada de 2014-15, ele começava às vezes como titular, e teve média de oito pontos e 5,3 rebotes por jogo.
Mas McKinnie sentia ter mais a oferecer, e por isso terminou em Luxemburgo, jogando para um time chamado East Side Pirates.
McKinnie teve seus momentos espetaculares por lá — em geral enterradas—, e isso lhe permitiu montar um vídeo que ele colocou no YouTube. Mas mesmo assim, o futuro o preocupava. Parecia que ele estava jogando em Plutão. “Tive dúvidas”, ele disse.
Depois da temporada, ele voltou a Chicago e recebeu um telefonema de um amigo que estava jogando no México. “O que ele me disse foi, literalmente, ‘nem desfaça as malas’”, conta McKinnie.
Ele jogou dois meses pelo Hermosillo, da Liga Nacional de Baloncesto Profesional. O México o agradou —“o México é ótimo”, ele diz —, ainda que um dos times da liga jogue em uma quadra aberta, com uma espécie de toldo industrial por sobre a área.
Mas ele foi ganhando confiança. Estava jogando bem e começando a perceber que seria capaz de bom desempenho em um campeonato mais difícil — se lhe dessem uma chance. O que aconteceu, em lugar disso, foi uma série de pequenos avanços, cada qual permitindo que ele chegasse mais perto do que desejava.
Depois de sua passagem pelo México, aceitou convite para jogar em um torneio de basquete com equipes de três jogadores — mas só porque Randy Brown, treinador assistente do Bulls, estava dirigindo alguns dos treinos, em Chicago. “Ele me disse que aquela era uma oportunidade para que as pessoas vissem meu jogo”, diz McKinnie. “E eu pensei que não tinha muito a perder”.
Ele terminou representando os EUA no Mundial de basquete de três jogadores, disputado na China, o que aumentou sua visibilidade. Brown garantiu que manteria contato.
E foi isso que aconteceu. McKinnie estava dormindo no sofá de sua mãe, algumas semanas mais tarde, quando o telefone tocou. Era Brown, perguntando se ele podia correr até o centro de treinamento do Bulls para jogar com alguns dos integrantes da equipe. “Nem parei para escovar os dentes”, disse McKinnie.
Ele estava começando a impressionar técnicos e olheiros — por sua capacidade de salto e de rebote —, mas disse que ainda assim teve de pagar para participar de seletiva aberta do Windy City Bulls, um time da G League, a liga de desenvolvimento de jogadores da NBA. Ele foi escolhido e tornou-se All-Star na G League, com 14,9 pontos por jogo.
McKinnie jogou a temporada passada na G League, desta vez pelo Raptors 905, ainda que tivesse tido alguns momentos em quadras maiores. Ele jogou 14 jogos pelo Toronto Raptors na NBA, com um total de 53 minutos em quadra, o que bastou para que soubesse que queria mais.
Também disse ter aprendido muito na temporada passada com Jerry Stackhouse, então treinador do Raptors 905, que o ensinou a defender o perímetro contra alas.
Nova oportunidade surgiu alguns meses atrás, quando o Warriors o convidou para treinar. O consenso era de que McKinnie estava a caminho de assinar um contrato duplo, com o Warriors e seu time de desenvolvimento. Mas ele queria mais. Em suas palavras, “sabia o que precisava fazer”.
O fato de que Patrick McCaw estivesse — e continue — envolvido em uma disputa com o Warriors ajudou sua causa, porque isso abriu uma vaga no elenco. Mas McKinnie a conquistou por mérito.
“Alfonzo não tem medo do momento”, disse DeMarco. “É por isso que os colegas de time amam jogar com ele, e que a comissão técnica confia nele”.
Tradução de Paulo Migliacci