Antissemitismo cresce na Alemanha e Berlim aponta procurada especial

O aumento dos casos de antissemitismo e sua maior virulência levaram o Ministério Público de Berlim a designar uma procuradora especial para lidar com o tema no âmbito da cidade-estado.

Com anos de experiência na acusação dos chamados “crimes politicamente motivados” em nível estadual e federal, a jurista Claudia Vanoni, 44, assumiu a procuradoria especial no último dia 1º.

Segundo dados do Departamento para Pesquisa e Informação sobre Antissemitismo (Rias, na sigla alemã), foram registrados 947 casos de antissemitismo na capital alemã em 2017, contra 510 em 2016. Em 2015, haviam sido 405.

Os registros incluem agressões físicas, ataques verbais, propaganda, danos à propriedade, ameaças e outros. Partem de pessoas identificadas como de esquerda e direita; de alta e baixa escolaridade; de cristãos, muçulmanos e ateus.

“O antissemitismo está ancorado em quase todos os grupos políticos, sociais e religiosos, é desprezível, e cabe a nós combatê-lo”, disse o senador Dirk Behrendt (Verde) à publicação Jüdische Allgemeine.

Do total de casos em 2017, 204 tiveram como alvo instituições judaicas; 164, entidades da sociedade civil; 128, instituições israelenses; 98, indivíduos; e 35, memoriais do Holocausto.

Levantamento preliminar de janeiro a junho deste ano indica a manutenção dos níveis do ano passado. Porém, o teor dos eventos tem mudado, afirmou o porta-voz do Rias, Alexander Rasumny.

“Temos muito mais ataques violentos e mais ameaças de violência do que em 2017, e isso é um desenvolvimento muito preocupante”, afirmou.

Outra mudança, diz ele, ocorre no discurso público: afirmações que antes eram socialmente inaceitáveis passaram a ser normalizadas, como o negacionismo e ataques à memória do Holocausto.

“Há apenas algumas semanas, houve um escândalo quando um grupo de políticos foi a Oranienburg, cidade onde há hoje um memorial no antigo campo de concentração [Sachsenhausen]. Vários deles questionaram a veracidade das câmaras de gás. Isso é algo que tem se tornado aceitável ao longo dos anos.”

A visita do grupo, capitaneado pela líder do partido ultranacionalista Alternativa para a Alemanha, Alice Weidel, acabou sendo interrompida. Mais de 200 mil pessoas foram presas em Sachsenhausen entre 1936 e 1945, a maioria prisioneiros políticos mas também muitos judeus.

Outra tendência é o antissemitismo direcionado ao Estado de Israel, o que, diz o Rias, afeta as políticas de memória.

Rasumny também vê correlação indireta entre o aumento do antissemitismo e o crescimento de atitudes xenofóbicas no país, sobretudo após a entrada em massa de refugiados em 2015 como parte de uma política do governo da chanceler Angela Merkel.

“O antissemitismo difere do racismo, mas muitas vezes eles se combinam. Se você olha para as teorias de conspiração nos protestos da extrema-direita, eles dizem que há uma substituição na população, dando a entender que os refugiados valem menos e estão substituindo os chamados alemães étnicos”, explica.

“Então a pessoa começa a questionar, nessa teoria, de quem é a ideia de substituir a população, por que isso ocorre e quem se beneficia, e a resposta costuma ser que se trata de ‘conspiração judaica’.”

Rasumny aprecia a criação do cargo de procurador especial para o antissemitismo, afirmando que muitas vítimas não denunciam ataques por não confiarem no sistema judicial ou na polícia. “Essa posição vai ajudar as pessoas a recuperarem a confiança.”

“Por meio de organizações como o Rias, jogamos mais luz nos últimos anos sobre o campo negro do antissemitismo em Berlim, e esperamos que aumente a disposição para que mais crimes sejam reportados”, afirma Behrendt.

Mas Rasumny vê necessidade de um trabalho maior de conscientização em todos os níveis de educação e, sobretudo, de eco no sistema legal.

Desde 2017, a Alemanha adota a definição de antissemitismo aprovada no ano anterior pela Aliança Internacional para a Memória do Holocausto. Só agora, porém, essa definição tem sido incorporada nos sistemas judiciais dos diferentes estados alemães.

“Antissemitismo é uma percepção de judeus que pode ser expressada como ódio em relação a judeus. Manifestações retóricas ou físicas de antissemitismo são direcionadas a indivíduos judeus ou não judeus e/ou suas propriedades, instituições comunitárias e estabelecimentos religiosos”, diz a declaração de Estocolmo.

Manifestações antissemitas podem ter por alvo Israel, mas não quando as críticas são similares àquelas feitas contra outros países. O texto também esclarece que atos antissemitas só são considerados criminosos quando isto está previsto na lei —na Alemanha, o negacionismo é ilegal.

Atos criminosos são antissemitas, por sua vez, quando o alvo são pessoas ou propriedades selecionadas porque são, ou são percebidas como, judeus ou ligados a judeus.

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