Apoio à reforma é boa notícia, mas guerra cultural é ameaça
O presidente Jair Bolsonaro não acredita em pesquisas feitas pelo Datafolha. Direito dele, e perto de outras crenças do mandatário, é quase benigno.
Ruim para ele será a impossibilidade de comemorar em público, salvo uma aplicação vigorosa de óleo de peroba nesta manhã, o resultado do levantamento do prestigioso instituto segundo o qual 41% dos brasileiros apoiam sua proposta de reforma da Previdência.
OK, a maioria (51%) é contra, mas quando Michel Temer (MDB) apresentou a sua versão do projeto, nada menos que 71% dos brasileiros o rejeitavam. Há uma inflexão aqui.
Esse apoio, que vem sendo registrado em pesquisas feitas por institutos menores junto a parlamentares, sugere que uma versão aceitável ao mercado da reforma deverá passar. Pode não render o R$ 1 trilhão mágico de Paulo Guedes em dez anos, mas qualquer coisa em torno de R$ 500 bilhões estará na conta.
Parlamentar tem medo de rua e urna. As ruas estão quietas e, por ora, mesmo a grande rejeição a Bolsonaro (só 1/3 do eleitorado o aprova, segundo o mesmo Datafolha) não implica barulho à vista —a esquerda hoje é um grande espantalho enfeitado com a máscara do Lula, mas só isso.
E urna só haverá em 2020, nas eleições municipais. Quem não sair candidato terá muito tempo para ver absorvidos os impactos de ter votado pela reforma. Se a esperada melhoria no ambiente econômico vier logo, tanto melhor para a relação deles com a base. Se não vier, aí é outra história.
Opositores da medida, e falo aqui de gente que nega o rombo do INSS e não só quem pede ajustes mais humanos da proposta de Guedes, parecem estar perdendo o domínio que tiveram por anos sobre a narrativa pública da necessidade da reforma. Isso é boa notícia para o país.
A questão central, contudo, é outra. Ainda que a reforma esteja aprovada até o fim do ano, o que não será um passeio no parque a despeito deste apoio razoável, a inabilidade política do governo e sua capacidade de se enrolar em crises gratuitas o manterá com uma espada de Dâmocles sobre a cabeça.
A manutenção do clima de guerra cultural com a indicação de um olavista para o lugar de um olavista no MEC não é exatamente auspiciosa. O pessoal que Bolsonaro ouve sobre esse flanco da administração, filhos à frente, só quer saber de ser uma destrutiva “vanguarda antiestablishment” —como definiu o assessor Filipe Martins.
Na mesa ao lado, só observando enquanto resmungam queixas, estão os militares. Como reclamou o general Augusto Heleno, eles não são só uma ala. São várias.
Mas o desaguadouro com verniz legal de seus descontentamentos ainda é o integrante do grupo que teve voto, Hamilton Mourão. Logo, eles só observam, e o general na vice se movimenta como esteio institucional do governo para as mais diversas plateias.