Autora de 'Jesus', Paula Richard fala dos desafios de retratar personagem tão conhecido

A dramaturga que assina a trama de "Jesus", novela que estreia nesta terça (24) na Record, não se considera religiosa. Paula Richard é católica não praticante e não tinha uma Bíblia na estante até começar a escrever histórias do gênero na emissora.

Da colaboração na equipe de roteiristas de "Os Dez Mandamentos" (2015) ao comando de "O Rico e Lázaro" (2017), acumula seis obras bíblicas.

A autora não vê problema, por exemplo, em haver uma peça teatral em que Jesus é representado como transexual: estamos falando de "O Evangelho Segundo Jesus, Rainha do Céu", com a travesti Renata Carvalho, que sofreu diversas censuras neste ano e no ano passado e também foi atacada pelo prefeito do Rio de Janeiro, o bispo Marcelo Crivella, como "ofensiva aos cristãos".

"Para mim, não é ofensiva. É ficção. Se as pessoas querem usar a imagem dele para passar uma outra imagem, aí é com elas", diz. "Eu, enquanto criadora, não posso ser a favor de qualquer tipo de censura. Posso não concordar com o que você diz, mas você tem o direito de dizê-lo."

A "questão do bom gosto", esta sim, entra em jogo, avalia. "Uma coisa pode ser ruim, aí depende de critérios do artista. Mas não me coloco na posição de julgar essa versão porque eu não a vi. De qualquer forma, vou ser sempre a favor da liberdade de expressão", prossegue.

Paula é uma mulher de 52 anos que começou sua carreira como produtora de TV e cinema, passou por circuitos independentes e, aos 38 anos, desempregada, pediu modelos de roteiro a amigos da área. Tornou-se autodidata na escrita de novelas e séries.

O nome Richard vem do ex-marido, um francês. Morou sete anos no país, onde teve três filhos.

Para retratar a figura de Jesus, Paula passou por uma questão comum entre autores que se propuseram à mesma tarefa. Como revisitar o ícone que foi apresentado público primeiramente em quatro evangelhos e, depois, multiplicou-se pela produção literária e visual de dois milênios?

Jesus não está apenas nos corações dos fiéis. Foi pintado por Leonardo da Vinci (1452-1519), Paul Gauguin (1848-1903), Candido Portinari (1903-1962). Tornou-se musical da Broadway nos anos 1970, versão frequentemente atacada por religiosos radicais. E foi retratado, por exemplo, em um livro de José Saramago (1922-2010), "O Evangelho Segundo Jesus Cristo", muito crítico à Igreja Católica.

A aposta da Record é que uma novela, por sua extensão, dá conta de contemplar todos os evangelhos, o de Mateus, o de Lucas, o de João e o de Marcos.

Dudu Azevedo, um galã de outras investidas bíblicas da emissora, ocupa o papel principal. No elenco, estão Vitor Novello (Judas), Camila Rodrigues (Maria Madalena) e Claudia Assunção (Maria de Nazaré).

A opção de não fechar a trama em um evangelho apenas "é complicada", diz a autora. "Tive que fazer escolhas cronológicas."

Os primeiros capítulos já mostram a crucificação. Depois, a trama retorna à manjedoura. Há um salto cronológico que, como na Bíblia, oculta a infância de Jesus.

A trajetória original do personagem foi preservada, garante a autora, mas os personagens que cruzam seu caminho ganharam adaptações. "A gente sabe qual é a história de Maria, por exemplo, mas depois ela desaparece [da narrativa dos Evangelhos]. Na novela, a gente vai transformar Maria em uma pessoa que atravessou toda a história. A mesma coisa vale para os apóstolos", descreve a autora.

Maria Madalena não será prostituta —uma imagem de construção bastante controversa. "O que está escrito é que ela foi dominada por sete demônios. Ela deu abertura para eles dominarem. Coisa errada ela fez. Ela foi curada por Jesus, mas não se crava que ela foi prostituta", conta.

A cena em que Madalena é curada por Jesus terá pitadas de filmes de terror. "Para mim, a referência é 'O Exorcista'. Não vai ter ela torcendo o pescoço, mas vai ter um pouco desse clima."

A criação da imagem de prostituta tem a ver com o contexto histórico, prossegue Paula: "Houve escolhas arbitrárias na própria Igreja Católica. Em determinado momento, Madalena foi tachada de prostituta. Mas essa é uma coisa de querer diminuir a presença feminina". A escritora diz isso com o amparo de uma equipe de historiadores especializados no assunto. Camilo Pellegrini é seu braço direito na roteirização.

Paula conta também que, antes de começar a criação da trama, reuniu-se com o Bispo Edir Macedo, dono da Record e fundador da Igreja Universal do Reino de Deus. Segundo ela, o bispo apenas pediu para que "a mensagem de Jesus pudesse ser compreendida".

A autora acredita que não é preciso "ter uma religião para gostar de Jesus". "Há muitos estudiosos da Bíblia que são ateus. Fé, sim, tem ali, mas Jesus não pregou nenhuma religião." Jesus, para ela, "quebrou paradigmas em nome da tolerância".

Jesus

Seg. a sex, a partir das 20h45, na Record

Da Bíblia para a tela

Pôncio Pilatos (Nicola Siri)

 

Ator italiano participou de novelas da Rede Globo como 'Belíssima'. Na Record, fez 'Milagres de Jesus'

Herodíade (Vanessa Gerbelli)

Atriz está de volta à Record após passar por novelas da Globo como 'Sete Vidas', 'Novo Mundo' e 'Malhação'

Simeão (Paulo César Pereio)

Aos 77 anos, o ator de extensa quilometragem pela primeira vez participa de uma novela de temática bíblica

Maria de Nazaré (Claudia Mauro)

 

Na Record, atriz que será a mãe de Jesus fez a novela 'O Rico e Lazáro'. Antes, na Globo, fez 'O Beijo do Vampiro'

Judas Iscariotes (Guilherme Winter)

 

Depois de interpretar Moisés em 'Os Dez Mandamentos', Winter atua como o apóstolo que trai Jesus

Maria Madalena (Day Mesquita)

 

Atriz fez 'O Negócio', série sobre prostituição da HBO. Também atuou em 'Os Dez Mandamentos' e 'Terra Prometida'

Satanás (Mayana Moura)

Após novela 'Tempo de Amar' da Rede Globo, atriz encarna personagem com a missão de trazer o caos ao mundo

Barrabás (André Gonçalves)

 

Ator fará o criminoso escolhido para ser libertado em vez de Jesus. Na Globo, atuou em tramas como 'Salve Jorge'

Source link

« Previous article Banido, Del Nero articula para colocar aliado na Federação Paulista
Next article » Guerra que corta Ucrânia há quatro anos se mistura à vida de moradores