BPC e aposentadoria rural são muito maiores que Bolsa Família, diz ministro
O ministro Osmar Terra (Cidadania), que gere o Bolsa Família, minimizou o impacto do programa sobre os mais pobres. A declaração ocorre no momento em que a concessão da ampliação do programa representa um agrado direto ao público mais crítico ao presidente.
Promessa de campanha, a medida do 13º atingirá principalmente áreas que menos votaram em Bolsonaro na última eleição e onde a popularidade de seu governo também está mais baixa nos primeiros cem dias de mandato —especialmente na região Nordeste.
“O maior programa de proteção às famílias mais pobres não é o Bolsa Família, é o BPC [Benefício de Prestação Continuada], do governo Fernando Henrique [Cardoso]. O BPC é o dobro do Bolsa Família em recursos. Aposentadoria do trabalhar rural é do Itamar Franco, que é maior que todos os outros juntos”, disse o ministro de Bolsonaro.
Terra falou com a Folha nesta quinta-feira (11), dia em que o governo Bolsonaro anunciou a concessão de 13º para os beneficiários do Bolsa Família. O Ministério da Cidadania mandou um comunicado informando da iniciativa instantes depois da cerimônia dos cem dias no Palácio do Planalto.
A concessão do 13º terá um custo anual de R$ 2,6 bilhões, mas, por outro lado, não haverá reajuste no valor do benefício neste ano.
Ela beneficia diferentes áreas do país que têm em comum a população de baixa renda e será oficializada após Bolsonaro registrar a largada com pior avaliação entre presidentes em primeiro mandato —segundo pesquisa Datafolha, 30% consideram a gestão ruim/péssima, 32%, ótima/boa, e 33%, regular.
No Nordeste, Bolsonaro teve na eleição 30% dos votos no segundo turno, contra 70% de Fernando Haddad (PT). É justamente nessa região em que a presença do Bolsa Família é mais marcante —ao menos 12% da população recebe esse benefício. No Sudeste, que deu grande vantagem ao presidente na eleição, são 4% de beneficiários.
Tanto o BPC quanto a aposentadoria rural estarão sujeitos a um endurecimento caso a reforma da Previdência seja aprovada pelo Congresso da forma como foi enviada pelo governo. Osmar Terra afirmou, contudo, que o texto final deve ser alterado.
“O ministro Paulo Guedes [Economia] já falou que o BPC deverá ser preservado”, disse. “O produtor rural [aposentadoria no campo] está se discutindo, vamos ver.”
Para o ministro, “o texto tem que ser o necessário e tem que poupar os mais pobres. Tem que cobrar a parte dos que ganham mais”, disse, ecoando críticas de congressistas ao projeto original.
Para Osmar Terra, não é uma estratégia política do governo se apropriar de programas voltados aos mais pobres, em geral associados à esquerda. “Não tem cor partidária nem ideológica. Acho que a esquerda pode até querer tomar conta, dizer que é dela, mas não é”, afirmou.
“O BPC e a aposentadoria do trabalhador rural, tudo isso são programas muito maiores que o Bolsa Família ou do mesmo tamanho, no caso do Bolsa Escola, e ninguém reivindica para esquerda ou para a direita”, concluiu.
O investimento no Bolsa Família tem potencial de melhorar a imagem do presidente também nas capitais —onde ele conseguiu boa base na campanha, mas com periferias que deram menor votação ao então candidato do PSL.
Em São Paulo, por exemplo, Bolsonaro obteve seus melhores desempenhos eleitorais nos bairros mais ricos, como Indianópolis, Jardins e Santana. E chegou a perder nos mais carentes, como Capão Redondo, Grajaú e Cidade Tiradentes —locais com mais potenciais beneficiários do programa Bolsa Família.
Outro efeito positivo para Bolsonaro pode ser a tentativa de capturar, mesmo em parte, uma bandeira que deu ajuda ao PT a obter seguidas vitórias em eleições presidenciais.
Pesquisas já mostraram forte relação entre ser beneficiário do programa e a maior probabilidade de votar no PT. Por exemplo, uma feita por Elaine Licio, Lucio Rennó e Henrique Castro, da UnB (Universidade de Brasília), que analisaram a vitória de Lula em 2006.
Outro trabalho, de Sergio Simoni Junior, da USP, mostrou efeito parecido do Bolsa Família até em pessoas que não recebiam pelo programa, mas conheciam algum beneficiário. O pesquisador verificou essa relação nas vitórias do PT em 2006 e 2010.
Na última terça (9), em evento público, Bolsonaro se apresentou como defensor do Bolsa Família, embora tenha complementado que “o que tira o homem e a mulher das questões difíceis que se encontram é o conhecimento”. Antes de ser candidato à Presidência, ele havia classificado o programa como “caridade”.
Pelo Bolsa Família, 14,1 milhões de famílias em situação de pobreza ou extrema-pobreza recebem recursos do governo. O valor médio do benefício distribuído é de R$ 186,94 mensais, segundo dados de março, e a previsão orçamentária para o programa em 2019 é de R$ 30 bilhões.
Thais Bilenky , Gustavo Uribe , Bernardo Caram , Ricardo Della Coletta e Talita Fernandes