Brancos e nulos somam 9,6%, índice recorde em 2º turno pós-ditadura
Brancos e nulos somaram 9,6% do total de votos no segundo turno da eleição presidencial deste ano, o maior índice já registrado no país desde o fim da ditadura militar.
Após a redemocratização, seis disputas presidenciais foram realizadas em dois turnos —as exceções foram as de 1994 e 1998, ambas vencidas por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) na primeira fase.
Nas outras disputas em duas etapas (1989, 2002, 2006, 2010, 2014), a soma dos chamados votos inválidos sempre ficou na casa dos 6%.
Pesquisa Datafolha divulgada no sábado (27) já indicava que fatia expressiva do eleitorado iria às urnas sem optar por nenhum candidato. Os brancos, nulos e indecisos, de acordo com o instituto, chegavam a 13%, o maior índice para uma medicação às vésperas da eleição —em segundos turnos de eleições anteriores esse número chegou no máximo a 10%.
Os votos brancos neste segundo turno representaram 2,14%, número similar ao de anos anteriores. De 1989 para cá, o recorde de brancos foi registrado no segundo turno de 2010, 2,3% do total.
O salto nos inválidos desta vez deveu-se ao crescimento expressivo dos votos nulos. Eles chegaram a 7,43%, contra uma faixa de 4% nas corridas eleitorais passadas.
Até este ano, a maior taxa de voto nulo desde o fim da ditadura havia sido registrada no segundo turno de 2006, com 4,7% do total.
Pesquisas no campo das ciências sociais indicam que sobretudo o voto nulo representa um sentimento de ceticismo e protesto.
“Grande parte do eleitorado não aceitou nenhum dos dois candidatos”, resume Fernando Abrucio, cientista político e professor da Fundação Getulio Vargas.
Ele estima que a soma de votos brancos, nulos e de abstenções chegue a 30 milhões de pessoas.
“Mesmo havendo na disputa um candidato que se apresenta como antissistema, como Jair Bolsonaro (PSL), grande parcela do eleitorado demonstrou rejeitar as opções oferecidas. Depois de tantos episódios traumáticos no país, o eleitor ainda não fez as pazes com a política”, diz o professor.
Ele argumenta que o quadro de sucessivos tormentos no Brasil desde 2014 —inúmeros casos de corrupção revelados pela Lava Jato, recessão, impeachment de Dilma Rousseff (PT), alta impopularidade de Michel Temer (MDB), prisão do ex-presidente Lula (PT)— levaram a um sentimento de descrédito pela política tradicional que ainda não cicatrizou.
“Até por isso, será gigantesca a tarefa que Bolsonaro terá pela frente. Não apenas recuperar a economia do país, mas também reconectar a sociedade com a política, reabilitar a política aos olhos do cidadão comum. Isso exigirá muito mais moderação do que ele demonstrou até agora”, avalia Abrucio.
Sérgio Ferraz, pesquisador e doutor em ciência ppolítica pela USP, faz diagnóstico parecido.
"O eleitor se sentiu incapaz de endossar o PT, por conta do profundo sentimento antipetista que mais uma vez se revela, que já era forte em 2016. Por conta da a associação do partido com a corrupção, com o fracasso da politica econômica de Dilma. E também sentiu vontade de endossar a candidatura de Bolsonaro, baseada em um discurso extremamente agressivo, marcado pelo ódio, pela apologia da violência. Essas condutas acabaram por inibir a adesão desse eleitor", afirmou.
Bolsonaro
venceu a eleição com 55% dos votos válidos, mais do que Dilma registrou em 2014 (51,6%), mas menos que Lula (61,7% em 2002 e 60,8% em 2006) e um pouco abaixo de Dilma em 2010 (56%).
No primeiro turno deste ano, brancos e nulos somaram 8,8% —menos que os 9,64% da primeira etapa de 2014 e muito próximos dos resultados de 2006 e 2010.
Pesquisadores apostavam em um número maior, e as primeiras pesquisas da corrida presidencial pareciam corroborar essa ideia —Datafolha apontou 22% em agosto. O clima de forte polarização, entretanto, parece ter levado o eleitor descontente a aderir a alguma candidatura na tentativa de evitar um mal maior.