Cartunista Ziraldo ganha megaexposição em São Paulo para comemorar seus 80 anos de carreira
São Paulo
Ziraldo Alves Pinto tinha apenas seis anos quando viu seu primeiro desenho estampar as páginas do jornal. Na época, foi sua mãe quem enviou o trabalho à extinta Folha de Minas.
Hoje, nenhum sobrenome é necessário para apresentar o pai da Turma do Pererê e do Menino Maluquinho, e uma megaexposição vai celebrar os 80 anos desde aquele trabalho.
“É a maior exposição já realizada de Ziraldo, com mais de 500 obras”, afirma Ricky Goodwin, um dos curadores da mostra, que começa nesta sexta-feira (12), Dia da Criança, no Sesc Interlagos, na zona sul de São Paulo.
Desenvolvida ao longo de dez meses, ela é descrita por Goodwin como uma exposição familiar, já que foi criada por Daniela Thomas, filha do desenhista, e Adriana Lins, sobrinha dele, além de Goodwin, que trabalha com o Ziraldo há 47 anos: “É como um segundo pai”, brinca ele.
Fazendo uma retrospectiva da carreira do cartunista, a mostra coloca a família também como seu público-alvo, pensando nos avós fãs da revistinha do Pererê; nos pais que cresceram com o Pasquim (publicação semanal satírica que circulou de 1969 a 1991); e nos filhos que acompanham o Flicts e o Maluquinho, por exemplo.
Ziraldo abriu todos os seus arquivos para a exposição. Deixou mostrar os desenhos mais frágeis, do começo de sua carreira. Não vetou nem dirigiu nada, afirma a filha. Ele, no entanto, não quis ver muito do projeto, apesar de ser um palpiteiro, mas perguntou diversas vezes se “vai ficar direitinha?”.
A exposição será dividida em três camadas: as obras, o processo de criação e as referências usadas pelo artista. Em vez de legendas, terá historinhas de como Ziraldo fez, anedotas que ele recorda sobre cada uma delas.
Haverá também momentos para brincar, interagir e desenhar. “Nada muito digital, por que Ziraldo é meio avesso a essas coisas”, lembra Thomas.
Uma parte da mostra trará ainda desenhos que Ziraldo fez quando estava preso. Ao todo, o artista foi detido quatro vezes durante a ditadura (1964-1985), principalmente pela oposição que o Pasquim fez ao regime. Nessas ocasiões, ele usava seu conjunto de hidrocor para desenhar, às vezes um simples limoeiro que imaginava no pátio cinza da do local.
Ziraldo não é esperado para a inauguração, por conta do AVC (acidente vascular cerebral hemorrágico) que sofreu no dia 26 de setembro. Hoje, ele se recupera, ainda no hospital.
DESENHO, DATILOGRAFIA E XEROX
O mundo digital passa longe de Ziraldo. O mineiro de Caratinga gosta mesmo é de desenhar arqueado sobre a prancheta, ou sobre a mesa de jantar. Faz e refaz dezenas de vezes um desenho até atingir a proporção exata, sempre assobiando, mostrando cada novo risco a quem estiver por perto.
A recordação é da filha Daniela, da época em que ela ainda vivia na casa do pai. Se ele não estivesse seguindo essa descrição, estaria com certeza na máquina de escrever, que se ouve do outro lado da rua, digitando cem palavras por minuto. “Tem enorme orgulho do diploma de datilógrafo, até mais do que o de direito!”, conta ela.
Avesso ao mundo digital, “não consegue usar o mouse de jeito nenhum e também não consegue desenhar num lugar e ver o que está acontecendo em outro. O xerox foi o mais avançado que conseguiu: corta um desenho, cola em outra posição, passa guache branco e depois refaz o xerox até chegar onde quer”, conta ela.
Passados 80 anos de carreira, no entanto, Ziraldo se limitava aos trabalhos originais antes do AVC: um novo livro, um novo personagem. O universo do Menino Maluquinho, por exemplo, tem um desenhista específico para fazê-lo, assim como o trabalho de coloração.
ONDA DE EXPOSIÇÕES
Seja pelos 80 anos de carreira ou pelo 86 anos de vida, que Ziraldo completo no próximo dia 24 de outubro, outras exposições estão sendo preparadas em homenagem ao cartunista na capital paulista.
Além da do Sesc Interlagos, que começa nesta sexta (12), ele terá trabalhos expostos em uma mostra da editora Melhoramentos, a partir de 18 de outubro, e em uma outra, no MIS (Museu da Imagem e do Som), em 14 de novembro.
Ziraldo, que tem trabalhos publicados pela Melhoramentos há 37 anos, foi o escolhido para abrir oficialmente a Casa Melhoramentos, na Vila Romana, zona oeste de São Paulo. Para isso, será feita a mostra “Os Planetas de Ziraldo”, com eixo central na coleção “Meninos dos Planetas”, que mostra a paixão dele pelo espaço e pelos planetas.
Essa exposição também foi feita pela filha e pela sobrinha do cartunista, Daniela Thomas e Adriana Lins, que também são responsáveis pela mostra do Sesc. Ela também será gratuita e ficará aberta até 22 de dezembro.
Já no MIS, Ziraldo será um dos artistas com ambiente temático na exposição “Quadrinhos”, que fará uma retrospectiva do universo dos HQs. O desenhista vai dividir espaço com outros artistas ou editoras, como Mauricio de Sousa, Los 3 amigos, Disney, Marvel e DC, até 31 de março de 2019 —a entrada é de R$ 30 (tem meia-entrada).
O museu levou 18 meses para reunir os cerca de 500 itens que serão expostos e incluem a primeira aparição de Luluzinha, publicada na revista The Saturday Evening Post em 1935; a edição número 1 de “O Pato Donald” (1950); e uma ilustração original de Tintim, de “As Aventuras de Tintim”, uma das histórias mais conhecidas do belga Hergé (1907-1983).