Com debate político morno, convenção do PDT vira palco para índios e regionalismos
Enquanto os caciques partidários não chegavam, quem fazia sucesso na convenção pedetista era um cacique tukano.
De cocar de penas de gavião real na cabeça, Álvaro Sampaio era parado por correligionários para tirar fotos, sobre placas de grama recém-transplantadas na entrada da sede nacional do PDT.
Outros índios, esses guajajaras, vendiam colares, brincos e chocalhos ao lado de estandes de movimentos LGBT, negro, sindical, das mulheres trabalhistas e de aposentados.
Filiados do partido, entre eles Túlio Gadelha, suplente de deputado federal e namorado da apresentadora Fátima Bernardes, comentavam o apoio do centrão a Geraldo Alckmin (PSDB). O tom geral era que o revés "desembolava o meio de campo" e permitia reforçar o discurso de esquerda.
Sem grandes surpresas sobre a direção política do evento, a convenção que oficializou a candidatura a presidente de Ciro Gomes virou ocasião oportuna para gravar cenas de campanha eleitoral.
Cinegrafistas, fotógrafos e até um pequeno drone branco —que precisou se livrar da companhia incômoda de dois urubus— registravam tudo, enquanto a lojinha do partido vendia camisetas de malha fria com o símbolo pedetista (mão que empunha uma rosa) por R$ 30.
Ao lado, a Juventude Socialista pedia R$ 20 pelo modelo azul-turquesa que homenageava Leonel Brizola (1922-2004), fundador do partido.
O político também recebera homenagem menos glamurosa no auditório. Era uma grande foto de seu rosto a imagem escolhida para indicar a entrada do banheiro masculino no auditório; o retrato de sua mulher, Neuza Goulart, identificava o feminino.
Enquanto as estrelas da festa não chegavam, o trio Pé de Serra tocava triângulo, acordeão e zabumba, e um grupo jogava capoeira.
Pelo palco, passavam conjuntos regionais —tambor de crioula, forró cearense, farra de boi—, enquanto um telão projetava ao fundo imagens de Ciro em sabatinas, palestras e entrevistas.
Às 11h34, quando Cid Gomes —irmão do candidato e coordenador da campanha— chegou, grupo tradicional gaúcho entoava o trecho “Felicidade foi-se embora”, da canção de Lupicínio Rodrigues.
A produção até tentou que Ciro entrasse ao som de "Minha vida é andar por esse país", de Luiz Gonzaga, mas o cronograma falhou. A música terminou 90 segundos antes que ele cruzasse o portão.
Cercado por jornalistas, políticos e membros do partido, ele subiu ao palco "de improviso" para cantar o hino nacional e agradecer ao povo.
A ideia era que o locutor usasse o estilo repentista para apresentá-lo —rimando Ciro com admiro e zangado com honrado—, mas foi preciso repetir os versos iniciais três vezes até que o candidato estivesse mais bem enquadrado pela grua montada em frente ao palco.
Às 12h42, começou finalmente o momento mais esperado da convenção, o discurso do candidato oficial. Em 31 minutos, ele repetiu temas, exemplos, frases e até mesmo momentos de pausa de sua fala na sabatina da CNI, no começo do mês.
Já a recepção da plateia foi outra. Enquanto os industriais o haviam aplaudido cinco vezes e vaiado uma, entre seus pares ele foi interrompido por palmas 13 vezes.
No saldo final, o evento mostrou certo desequilíbrio entre os símbolos do lema de campanha, "Força e paixão para mudar o Brasil".
Por oito vezes no discurso Ciro repetiu a frase "o Brasil precisa mudar".
A força dominou as placas que os fotógrafos do partido pediam aos participantes que erguessem: "corajoso", "experiente", "preparado", "ficha limpa" e "pulso firme" eram os adjetivos escolhidos.
Já a paixão teve menos ibope. Animado com a perspectiva de faturar num evento que prometia reunir 1.800 pessoas, o vendedor de churros João Batista Martins estava desanimado no final da festa.
Saíram apenas 60 unidades, e, dos três recheios oferecidos, o sabor "Beijinho" encalhara.