Com duas famílias, atacante do Palmeiras mudou de casa pelo futebol

Foi num campinho de terra do Clube Desportivo Municipal Cidade Líder, na zona leste, em 2007, que Felipe Pires despertou a admiração de Reynaldo Fonseca. O taxista costumava ir ao local para levar seu filho Lucas, amigo do então menino de 11 anos, hoje atacante do Palmeiras.

 Os dois compartilhavam do mesmo sonho de se tornar jogador de futebol, mas Felipe quase desistiu de seu maior desejo para ajudar a família.

Mais velho de oito irmãos, ele teria de começar a trabalhar junto com seu pai. Reynaldo, porém, viu que o garoto tinha potencial e, para que ele não desistisse do futebol, resolveu investir não só na carreira dele como dar suporte aos seus familiares.

“Falei que a gente daria uma cesta básica para ajudá-los. Fizemos uma reunião de famílias para conseguirmos doar alimentos para eles”, conta o taxista, que lembra que Felipe pegava chuteira emprestada para treinar.

 Além das doações, Reynaldo levava Felipe aos treinamentos. Foi então que a mãe de Felipe, Andreia Cristina, sugeriu que ele fosse morar com a família do taxista.

 “Passaram-se cerca de 15 dias e então a mãe dele disse que poderia ser melhor o Felipe morar na minha casa.”

 Não foi fácil para Andreia, mas ela acreditou no potencial de seu garoto e também viu uma oportunidade de o seu primogênito ter uma vida melhor a partir daí.

 “Nunca é fácil ficar longe da família, ainda mais no meu caso. Temos uma família muito grande, com muitos irmãos, todos bastante unidos, e eu ainda sou o mais velho. Sempre fui muito apegado a minha mãe. Foi um momento bem difícil, mas tive que tomar essa decisão pra ir em busca dos meus sonhos e tive muito apoio”, disse o camisa 27 do Palmeiras à Folha.

 A insegurança de deixar o lar no qual deu seus primeiros passos foi grande, mas a chance de crescer profissionalmente através de sua segunda família foi importante. Apesar de estar mais distante dos pais e irmãos, Felipe recebia visitas dos familiares. Na casa de Reynaldo, além de Lucas, moravam também a esposa do taxista e a filha do casal.

 “Fiquei muito inseguro. Era bem pequeno e apareceu o Reynaldo, um cara super do bem e que queria me ajudar. Do nada, tive que sair de casa e me acostumar a morar com outra família”, disse Felipe, que relembrou o quanto foi difícil para sua mãe.

 “Na época, minha mãe ficou um pouco chateada e com receio, mas ela sabia que não ia conseguir me ajudar a ir em busca desse sonho. A única saída era essa.”

 No novo lar não havia distinção entre os dois. Mesmo assim, Felipe demorou um pouco a se adaptar. A princípio, preferia comer depois, pois tinha medo de que faltasse algo a alguém da casa.

 “Quando ele veio, não comia mistura, ele não tinha o hábito, pois era humilde e tudo era muito dividido na casa dele”, relatou Renata Fiorentini, cunhada de Reynaldo, que sempre ajudou o jogador da forma que podia.

 Felipe também era bom aluno. Terminou os estudos sem repetir de ano. Para poder se dedicar integralmente aos treinos, ele frequentava a escola durante a noite.

 Graças à toda dedicação, Felipe e Lucas foram disputar o Campeonato Paulista sub-17 pela Associação Desportiva Guarulhos. E foi justamente contra o Red Bull que o menino brilhou.

Na ocasião, o Red Bull vencia o duelo por 3 a 0, mas Felipe marcou três vezes e garantiu o empate de sua equipe. Foi então que o time sediado em Campinas prestou atenção no atacante. 

Felipe foi contratado pelo Red Bull. Teve o apoio de Reynaldo, mas Felipe precisou abrir mão de dar sequência aos testes que fazia no Corinthians. Ao escolher assinar contrato, ele passou a receber um salário mínimo, que era repassado quase que integralmente à família biológica.

Em poucos meses de Red Bull, já em 2014, Felipe teve a oportunidade de fazer um intercâmbio na Áustria. Ele foi para atuar no Liefering e, no ano seguinte, no Red Bull Salzburg. Se quisesse permanecer no país, ele precisaria aprender a falar a língua alemã. Para seguir carreira, o jogador estudava alemão de 3 a 4 horas diariamente.

 Assim como acontece com vários atletas _inclusive com Lucas_, Felipe pensou em abandonar o futebol.

 “Quando cheguei na Áustria foi extremamente difícil. Fazia muito frio, nevava, eu não falava a língua, não conseguia me comunicar. Lembro que ligava para os meus pais dizendo que queria voltar, mas a minha minha família me apoiou. Minha mãe me falava que era a oportunidade que eu sempre quis e que Deus estava me dando.”

Depois de quatro anos na Europa, entre Hoffenheim-ALE, Frankfurt-ALE e Austria Wien, Felipe Pires retornou ao Palmeiras já como profissional. Por ter saído muito novo do país, voltou como um desconhecido que busca seu espaço num time recheado de estrelas e comandado por um técnico multicampeão, Luiz Felipe Scolari.

 Agora, Felipe busca não apenas uma chance de virar ídolo no alviverde, mas também quer ser notado nacionalmente para realizar um outro sonho: vestir a camisa da seleção brasileira.

 “Ele me diz: ‘ainda vou vestir a camisa da seleção’. Ele sempre colocou isso como foco principal. Até quando ele veio para o Palmeiras ele me disse que se fosse bem teria chances de chegar na seleção. Ele veio para o maior clube do Brasil com esse intuito de crescer e chegar na seleção, como ele sempre falou que era um sonho dele”, conta o melhor amigo de Felipe, o xará Felipe Paulini.

 No mundo do futebol, Felipe fez várias amizades, uma delas especial: André Ramalho, atualmente no Red Bull Salzburg. Segundo Ramalho, Felipe tem tudo para se dar bem com o técnico Felipão.

 “Pelo que eu sinto e pelo que foi conversado, percebo que ele está se sentindo muito bem. Foi muito bem recebido, pois acho que tudo isso reflete sim dentro de campo. Eu vejo como o Felipão deu moral para ele [Felipe Pires] na pré-temporada, estava mesmo procurando um jogador como Felipe, de velocidade”, disse o amigo.

 “Ele vem entrando nos jogos, já fez gol e, pra mim, isso é só um reflexo do que vem acontecendo fora de campo, que é quando mais o jogador se sente bem num lugar, mais as coisas fluem”, completou Ramalho.

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