Comediante quer ser visto como Macron da Ucrânia
Favorito para conquistar a Presidência da Ucrânia neste domingo (21), Volodimir Zelenski está empenhado em mudar sua imagem no Ocidente de “outsider” para a de uma espécie de Emannuel Macron do seu país.
Tanto é assim que o comediante que surgiu na campanha eleitoral em janeiro para chegar ao segundo turno deste domingo com em torno de 50% das intenções de voto foi se encontrar com o presidente francês na sexta retrasada (12).
Ele enfrentará o impopular presidente Petro Porochenko, que vem registrando de 15% a 30% nas pesquisas mais recentes. Parece improvável que, mesmo com as usuais acusações de fraudes, ele consiga mudar o placar.
Será um salto e tanto para o ator sem experiência política prévia que vive, na TV, um professor de história que acabava sendo eleito presidente após ter seu discurso contra a corrupção viralizado na internet pelos seus alunos.
De sua forma própria, Zelenski se insere na onda antipolítica que já deu ao mundo Donald Trump, Jair Bolsonaro e Viktor Orbán, entre outros. Não é um antiglobalista declarado, mas seu eleitorado parece beber da mesma fonte de fastio com a política tradicional.
O cálculo aparente de Zelinski é tentar mostrar-se como uma força não alinhada com os blocos tradicionais da política ucraniana, capaz de fazer o país avançar em seu conflito existencial entre ser parte da esfera russa de influência ou integrar o Ocidente.
Desde o fim da Guerra Fria, em 1991, isso significava basicamente políticos pró e contra Moscou, que era a metrópole dominante na região desde os tempos imperiais.
A questão é que em 2014 o acerto implodiu quando o governo de Vladimir Putin reagiu à derrubada do então presidente pró-russo.
O Kremlin patrocinou a anexação da península de maioria russa da Crimeia e fomentou uma guerra civil inconclusa, que já deixou 13 mil mortos no leste separatista da Ucrânia.
Isso alijou a Ucrânia de 12% de seu eleitorado e, mais importante, inviabilizou as chances de qualquer político abertamente pró-Moscou no pleito de 2014 e no realizado no dia 31 de março passado.
Outra ideia que Zelinski foi buscar com Macron, segundo relatos de analistas ucranianos, diz respeito à montagem de apoio político.
Como na França, a Ucrânia escolhe seu Parlamento depois da eleição presidencial. Só que os franceses tiveram um mês para referendar o En Marche! de Macron, uma amálgama de gente de toda coloração política.
Zelenski, se eleito, terá seis longos meses para fazer o mesmo. O lado positivo é a possibilidade de avaliar com cautela a facciosa movimentação da política local e evitar alianças com a versão local da “velha política” —grupos ligados a Porochenko e à ex-primeira-ministra Iulia Timochenko, que ficou em terceiro lugar no primeiro turno.
Já a face negativa é a perda progressiva de poder político ao enfrentar as primeiras medidas de governo com um Congresso hoje dominado pelo partido de Porochenko (138 de 450 deputados).
As pesquisas de opinião dão hoje ao Servo do Povo, o partido de Zelenski que tira seu nome do programa de TV que o catapultou à fama, cerca de 25% de apoio. O chamado Bloco de Oposição, que reúne políticos associados a uma atitude menos hostil a Putin, tem 15%, empatado com o Bloco Porochenko (14%) e o Pátria, de Timochenko (12%).
Para os russos, o jogo é de espera. “A elite sempre viu a Ucrânia como nossa. Não será um presidente novo que mudará a situação, mesmo que ele se veja como um Macron”, diz Alexei Kolesnikov, do Centro Carnegie de Moscou.
Alguns analistas pensam diferente e acham que Zelenski pode ser útil ao Kremlin por sua fraqueza aparente.
Por outro lado, tudo o que ele disse até agora tendeu à neutralidade. Quer a Crimeia de volta, mas não chama Putin de facínora como faz Porochenko. Defende o Ocidente, mas é reticente sobre adesão a instituições ocidentais.
Além da inexperiência, um problema para ele é sua ligação com Ihor Kolomoiski, o segundo homem mais rico da Ucrânia e dono do canal de TV que o lançou.