Cresce a oferta de produtos e serviços individuais no Japão
De tempos em tempos, Masaki Kitakoga, 33, se refugia em uma pequena cabine de karaokê no meio do animado bairro de Shinjuk, em Tóquio, e canta por 90 minutos completamente sozinho.
Kitakoga é mais um consumidor que prefere desfrutar serviços e produtos sem amigos ou familiares, uma tendência que vem ganhando força no Japão.
A figura do cliente desacompanhado ganhou um nome próprio, "ohitorisama". Essa forma de consumo se tornou um dos nichos preferidos das empresas japonesas por sua alta lucratividade.
Analistas dizem que a composição demográfica do Japão —mais de um terço dos domicílios é formado por apenas uma pessoa— torna o país o lugar ideal para o "mercado solitário". Em uma sociedade compulsiva por trabalho, intercontectada e de ritmo rápido, tem crescido o número de pessoas que procuram ter tempo para si mesmas.
Sinais da economia solitária podem ser encontrados por toda a parte no Japão, desde cinemas que oferecem poltronas com divisórias a parques temáticos em que frequentadores sem acompanhantes podem furar a filas em algumas atrações.
Mercados vendem condimentos e verduras em porçoes individuais e agentes de viagem elaboram roteiros voltados para o viajante solitário.
Karaokê, geralmente considerado a atividade arquetípica do Japão, é um forte exemplo.
Há seis anos, a rede Koshidaka percebeu que 30% de seus consumidores em algumas cidades chegavam sozinhos. Sua direção decidiu criar as "1Kara", micro-cabines para cantores solo.
Hoje a companhia administra oito salões de karaokê e "milhares" de solitários concorrem pelas salas individuais, afirma Daiki Yamatan, porta-voz da rede.
"É uma experiência libertadora", diz Kitakoga. "Eu gosto de cantar. Mas, além disso, vir aqui me permite aliviar o stress".
Com o aumento da demanda por serviços individuais, o tabu associado a fazer certas atividades sozinho diminuiu, afirma ele, que ocasionalmente também sai para cantar com seus amigos.
Muitos dos que frequentam as casas de karaokê sozinhos relatam que apreciam a oportunidade de cantar apenas suas músicas preferidas, sem ter que ceder a pressões do grupo que pedem clássicos que todos conhecem.
"Sociedade supersozinha" se tornou uma expressão recorrente entre cientistas sociais e gurus de marketing.
"Negócios estão oferecendo uma série de bens e serviços direcionados aos consumidores que apreciam atividades individuais", afirma Motoko Matsushita, consultora sênior do Instituto Nomura Research.
"A profundidade e variedade desses serviços refletem a expansão dessa tendência de mercado", diz ela.
Espaço pessoal
Pesquisas mostram que os consumidores japoneses —principalmente os jovens— valorizam mais passar tempo sozinhos do que com amigos e familiares.
Dados oficiais mostram que a proporção de lares com pais e filhos está gradualmente diminuindo, uma vez que cada vez menos os adultos têm relacionamentos e formam famílias.
Em 1980 no Japão, apenas um em cinquenta homens com até 50 anos de idade nunca havia se casado; entre as mulheres, o índice era de uma a cada vinte e duas.
A transformação demográfica ocorre ao mesmo tempo em que o país enfrenta o envelhecimento de sua população —cerca de 18% dos japoneses têm mais de 65 anos.
O uso de redes sociais também tem contribuído para o crescimento dessa tendência, segundo especialistas. Cansados do contato constante, indivíduos procuram cada vez mais passar tempo sozinhos.
Restaurantes também estão se beneficiando desses consumidores. Na rede de lámen "Ichiran", é possível fazer uma refeição sem praticamente nenhuma interação humana.
Após fazerem seus pedidos em distribuidoras automáticas, os clientes se sentam em mesas separadas por divisórias para comer sem distrações, uma experiência bastante diferente dos restaurantes tradicionais em que chefs e garçons gritam em salões abertos.
"Atendíamos assim antes mesmo dessa tendência de atividades solitárias começar. O conceito de 'espaço pessoal' tem sido bem recebido em mercados estrangeiros também", diz Satomi Nozaki, porta-voz da rede de restaurantes que também possui unidades no exterior.
Além do karaokê, Kitakoga também gosta de viajar sozinho —ele foi para uma ilha remota no sul do Japão no ano passado.
"Com certeza também teria sido divertido viajar com meus amigos. Mas eu sabia exatamente o que queria fazer lá e foi fantástico porque pude seguir meus planos, no meu ritmo."