Crise no Brasil freia expectativas de editoras na Feira de Frankfurt
Menos títulos sendo comprados e ausência de tendências literárias definidas. Assim se desenha a próxima Feira do Livro de Frankfurt —que abre a sua 70º edição na próxima quarta-feira (10)—, para editoras brasileiras.
De acordo com editores e agentes ouvidos pela Folha, o cenário político conturbado pré-eleições, o real desvalorizado frente ao dólar (moeda na qual são negociados alguns contratos) e a crise no mercado editorial brasileiro, que se arrasta desde 2014, vão tornar a visita anual aos pavilhões da feira um tanto morna.
Tomás Pereira, um dos donos da Sextante, diz que o evento é uma oportunidade de comunicar ao mercado internacional sobre o que está acontecendo no Brasil, “para que eles entendam que estamos passando por um momento difícil e por isso adotamos uma postura mais cautelosa”.
Ele afirma que sua editora não está “em um momento de arroubos” para a compra de novos títulos, e cita um fator complicador em relação ao ano passado: os problemas financeiros pelos quais passam as principais redes de livrarias do país, a Saraiva e a Livraria Cultura, que se intensificaram em 2018. “Este é o elefante na sala”.
A Saraiva, que responde por cerca de um terço das vendas de livros no país, está atrasando o pagamento a editores, bem como a Cultura. As duas redes somadas chegam a representar 50% do faturamento de algumas editoras. Para piorar o quadro, a Cultura comprou as operações da Fnac em 2017 e logo em seguida iniciou um processo de fechamento de lojas da rede francesa, o que significa um canal a menos para o escoamento de títulos.
O publisher Otávio Marques Costa, da Companhia das Letras, afirma que a editora tem um bom estoque de direitos adquiridos e está sem necessidades urgentes na área literária. Diz ter comprado “três ou quatro títulos” nas negociações que antecedem a Feira e que o momento é de cautela agora e de incógnita no ano que vem.
O achatamento do mercado no Brasil parece acompanhar uma tendência mundial. De acordo com relatório divulgado pela Feira de Frankfurt recentemente, na última década houve encolhimento do mercado livreiro na grande maioria dos países, com exceção da China. Só na Alemanha, sede da Feira, o número de consumidores de livros diminuiu mais de seis milhões entre 2012 e 2016.
Em paralelo a um cenário de negócios desolador, os editores não enxergam tendências editoriais claras, como foram os romances de suspense na linha do sueco Stieg Larsson há alguns anos ou as obras a respeito do “hygge”, o suposto segredo dinamarquês para a felicidade que fez sucesso no ano passado.
“Saber o que deve decolar por lá é um pouco como descobrir como ganhar a Mega-Sena”, brinca Ana Paula Hisayama, responsável pela área de direitos autorais da editora Todavia. Ela afirma que “as tendências vão e vem e acompanham ou são ditadas pelo que faz sucesso no audiovisual, como ficção científica”. Diz ainda que tem visto com frequência títulos sobre árvores, o excesso de informação, inteligência artificial e questões de gênero.
Para Sônia Jardim, presidente da Record, títulos de não ficção, autoajuda e desenvolvimento pessoal devem ser os mais procurados, já que figuraram na lista de mais vendidos de 2018.
Otávio Costa, da Companhia, também afirma que “não consegue identificar uma onda, embora haja muita coisa sobre o governo Trump e política interna americana” sendo publicada. Segundo ele, apesar do interesse crescente por livros de não ficção que tematizam ameaças à democracia, não haver um nicho comercial claro pode ser bom, pois evita que a editora “entre pelo cano” ao investir em modas que podem não vingar por aqui.
Evento mais importante do mundo para o mercado editorial, a Feira do Livro de Frankfurt reúne anualmente, em outubro, cerca de 7,3 mil expositores de mais de 100 países durante cinco dias. Este ano, a Geórgia é a nação homenageada. Em 2013, foi o Brasil.