Dandara mostra em show sua vivência estrangeira

Acontece hoje (20), no jardim da piscina do Sesc 24 de Maio, às 19h, em São Paulo, o show Estrangeira, da cantora paulistana Dandara, 28, que mora há um ano e meio na Suíça.

O Música em Letras esteve ontem (19) no ensaio do show com a artista que gravou com exclusividade para o blog (assista no final do texto) “Estrangeira”, dela, Paulo Monarco e Bruno Batista.  “Essa canção narra um deslocamento de um corpo feminino por lugares e paisagens. É a chegada de uma mulher em uma cidade, e de não sacar o que está rolando nesse lugar, mas de saber que ela está ali para fazer rolar”, falou a cantora que será acompanhada por Paulo Monarco (guitarra) e Jota Erre (percussão e programações), que em breve encontrarão a artista na Europa, onde realizarão uma série de shows passando por Lion, Zurich, Coimbra e Lisboa entre outras cidades.

Dandara tem em sua formação musical uma passagem pelo curso de canto popular da ULM (Universidade Livre de Música). Também cursou Ciências Sociais na USP (Universidade de São Paulo), sem concluir. A concepção do show Estrangeira – que será lançado em disco, com 11 faixas, em dezembro- surgiu há dois anos, quando Dandara voltou para o Brasil, após realizar uma residência artística de três meses em Munique, em 2016. Alguns fatos levaram-na a sentir na pele o que é ser estrangeira. “Passei por preconceitos e atravessamentos de conflitos, de códigos, como não dominar a língua e condutas culturais dos espaços. Também enfrentei, por exemplo, [na Alemanha e na Finlândia] situações de violência, de gente me pegar na rua, falar coisas e passar a mão no meu cabelo, na minha bunda e no meu corpo. Isso foi muito forte para mim”, disse a artista que nas ocasiões percebeu-se sem encaixe e sendo “o outro”.

Dandara, sua filha Serena, e o percussionista Jota Erre (Foto: Carlos Bozzo Junior/Folhapress)

Filha de um nordestino, negro, com uma paulistana, branca, a artista explica uma das inspirações de sua busca: “Estamos em um momento, no mundo, muito agudo com relação às migrações, ao trânsito nas fronteiras e de intensificação dessas vozes reacionárias de afirmação de nacionalidade e de estereótipos. Isso por um lado é positivo no sentido identitário, e por outro, negativo, no sentido de exclusão.”

Entre as músicas do show, Dandara interpreta “Um Índio”, de Caetano Veloso; “Rosa dos Ventos”, de Bruno Batista (que no disco conta com a participação do Duofel); e “Herói”, de César Lacerda. “Falar sobre ser estrangeira e sobre estar em trânsito, em outro lugar, é reafirmar sua origem, e essa canção do César fala de uma maneira muito forte sobre as alegres contradições de sermos brasileiros.”

Para Dandara, a ideia de nacionalidade tem de ser revista. “A gente vai mudar isso; já estamos em processo de transformação da ideia de fronteira, de delimitação de espaço geográfico e de ressignificação da ideia de estado, nação, pertencimento e identidade relacionada ao país”, disse a artista que se tivesse de escolher uma outra nacionalidade optaria novamente pela brasileira, “pela pluralidade que é ser brasileiro”.

Dandara (Foto: Carlos Bozzo Junior/Fohapress)

Segundo Millôr Fernandes (1923-2012), estrangeiro é “um cara que não nasceu no mesmo país que as outras pessoas”. Para Dandara, a questão do estrangeiro envolve o  conceito de alteridade: “Além de carregar minha voz e colocá-la em trânsito, e em movimento para outro espaço e outro lugar, com minha cultura, esse é um exercício muito forte de observação, respeito, abertura e amorosidade do outro para o outro. É quando estamos em uma situação na qual sabemos que o outro somos nós.”

Assista, a seguir, a cantora interpretando “Estrangeira”, acompanhada por Jota Erre na percussão, com a presença de Serena, filha da artista.