Diplomata brasileiro é demitido após republicar textos que debatem crise na Venezuela
O embaixador Paulo Roberto de Almeida foi demitido nesta segunda-feira (4) do cargo de diretor do Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais (Ipri), órgão vinculado ao Ministério das Relações Exteriores. Ele assumiu a direção do instituto em meados de 2016, durante a gestão de Michel Temer (MDB).
A demissão ocorreu após Almeida republicar, em seu blog pessoal, também nesta segunda-feira (4), três textos recentes sobre a crise na Venezuela, um assinado pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, outro pelo embaixador e ex-ministro Rubens Ricupero e o terceiro pelo atual ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo.
Araújo, em seu texto, critica as posições de FHC e Ricupero sobre a situação venezuelana, afirmando que os dois "escreviam seus artigos espezinhando aquilo que não conhecem, defendendo suas tradições inúteis de retórica vazia e desídia cúmplice”.
No texto em seu blog, Almeida diz querer estimular o debate sobre a política externa brasileira com a republicação dos artigos.
No dia 24 de fevereiro, o embaixador agora demitido havia publicado um texto crítico ao escritor Olavo de Carvalho, que indicou ao presidente Bolsonaro nomes para compor o ministério do atual governo, entre eles, o de Araújo.
Almeida foi comunicado da dispensa por telefone pelo chefe de gabinete de Araújo, Pedro Wollny. Procurado, não quis comentar os motivos da demissão.
“Meu blog é um espaço de liberdade, de debate aberto e de interesse público”, disse. “Aparentemente vou ter de voltar à biblioteca do Itamaraty para poder trabalhar”, afirmou, em referência aos quase 14 anos de governos petistas em que afirma ter sido excluído de qualquer atividade no ministério.
“Durante todo esse tempo de exílio involuntário, fiz da biblioteca do Itamaraty o meu escritório de trabalho, uma vez que não dispunha de nenhum outro local na Secretaria de Estado das Relações Exteriores”, disse Almeida.
Rubens Ricupero vê na dispensa de Almeida um “ato confessadamente de repressão político-ideológica, de patrulhamento ideológico que lembra os momentos mais sombrios da ditadura militar, da qual o atual presidente é confessadamente admirador”.
Segundo Ricupero, “aparentemente, não é debate que deseja a direção do Itamaraty, pois a simples republicação de artigos lhe inspira medidas repressivas". "À luz desse fato concreto, qual é a autoridade moral que tem esse governo para denunciar a repressão do regime de Maduro?”
O Itamaraty afirmou que a mudança da diretoria do Ipri, “no contexto da troca da grande maioria das chefias do ministério das Relações Exteriores, já estava decidida e foi comunicada ao atual titular”.
Paulo Roberto Almeida é diplomata desde 1977 e já serviu nas embaixadas de Paris e de Washington, entre outros postos de destaque. Em 1984, obteve o doutorado em Ciência Política pela Universidade Livre de Bruxelas, na Bélgica.
Fundado em 1987, o Ipri é um instituto voltado ao desenvolvimento e à divulgação de estudos e pesquisas sobre temas relativos às relações internacionais, à realização de cursos, seminários e conferências na área de relações internacionais, entre outras atividades.