Ex-governador do Rio acusa Pezão | 'Foi um erro de apego ao poder, um vício', diz Cabral sobre propina
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB) admitiu em depoimento ao juiz federal Marcelo Bretas --responsável pelas ações da Operação Lava Jato na primeira instância no Rio-- o recebimento de propina durante os anos que compreenderam os seus dois mandatos e apontou o ex-governador Luiz Fernando Pezão (MDB) como recebedor de valores indevidos. Cabral definiu a cobrança de propina em seu governo como um "vício" e um "erro de postura" --é a primeira vez que ele admite na Justiça ter recebido propina.
De acordo com Cabral, Pezão "recebia cerca de R$ 150 mil que eu mesmo mandava entregar a ele desde que ele era secretário de Obras e não é uma mentira de qualquer delator". Cabral disse que o pagamento era mensal, mas não afirmou por quanto tempo perdurou. Ex-aliado de Cabral, Pezão está preso desde novembro, investigado por recebimento de propina --sua defesa tem dito que ele "jamais cometeu qualquer ato ilícito".
O ex-governador admitiu ter combinado propina sobre a compra de material na área da saúde e envolveu o então diretor do Into (Instituto Nacional de Traumatologia e Ortopedia) e ex-secretário da área Sérgio Côrtes no recebimento de valores indevidos.
Foi um erro meu de postura, de apego a poder, a tudo isso. Um vício.
Sérgio Cabral, ex-governador do Rio
Questionado sobre a campanha que levou Pezão ao governo fluminense, Cabral afirmou que os valores chegaram a R$ 400 milhões financiados por empresários via caixa 2. O custo, de acordo com o balanço de campanha fornecido pelo site do TSE, girou em torno de R$ 45 milhões --na ocasião, o teto de gastos era de R$ 85 milhões, segundo o site de TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O depoimento prestado hoje acontece depois do vazamento de trechos do depoimento Cabral ao MPF (Ministério Público Federal) no último dia 21. Na ocasião, ele admitiu pela primeira vez ter recebido valores ilícitos supostamente pagos durante a reforma do Maracanã, a desapropriação do Porto do Açu e a construção da linha 4 do metrô. A divulgação dos depoimentos foi feita pela "TV Globo".
Em outros depoimentos prestados a Bretas, Cabral havia negado o recebimento pessoal de propina, mas admitido a prática de caixa 2 para fundos de campanha. Desta vez, o depoimento acontece no contexto da Operação Fratura Exposta, desdobramento da Lava Jato no Rio, que apura um esquema de fraudes na compra de próteses para o Into do Rio de Janeiro e para Secretaria Estadual de Saúde.
O depoimento de hoje acontece a pedido da nova defesa de Cabral que, na primeira vez em que foi convidado a depor no âmbito da Fratura Exposta, preferiu o silêncio.
"Ao assumir o mandato, apresentei o Sérgio Côrtes (então diretor do Into) ao Arthur Soares, que, na ocasião, já era o 'número um' da prestação de serviços do estado e era alguém que eu convivia enquanto político. Àquela altura, ele já havia me ajudado com campanhas com caixa dois, mas não o conhecia pessoalmente. Quando acabou a eleição, avisei ao Côrtes que combinaríamos uma propina de 3% pra mim e 2% pra ele na área da saúde, na compra de materiais. A tradição de antes (do meu mandato) era de até 10% de propina. Governos anteriores cobravam, segundo o Arthur. Foi um erro meu de postura, de apego a poder, a tudo isso. Um vício", reconheceu.
A reportagem procura as defesas de Pezão, Sérgio Côrtes e Arthur Soares sobre as acusações de Sérgio Cabral.
Condenado no total a 198 anos e seis meses de prisão, Cabral trocou a sua defesa em dezembro do ano passado. Na época, cogitou-se uma delação premiada do ex-governador. No entanto, o acordo nunca foi confirmado.