Fabricantes de remédios dos EUA podem ter de revelar preços em comerciais de TV
O secretário da saúde dos Estados Unidos propôs nesta segunda-feira (15) que as companhias farmacêuticas sejam compelidas a incluir os preços de tabela de seus remédios em anúncios de televisão dirigidos aos consumidores —o mais audacioso elemento em uma série de esforços do governo Trump para reduzir os gastos do público com medicamentos.
Sob uma proposta de regulamentação federal apresentada por Alex Azar, secretário da saúde e serviços humanos do governo Trump, os fabricantes de remédios teriam de anunciar um preço de tabela, e garantir esse preço por pelo menos 30 dias, para qualquer medicamento cujo custo seja coberto pelos programas federais de saúde Medicare e Medicaid e cujo preço seja superior a US$ 35 (cerca de R$ 129) por mês.
No Brasil, a propaganda da maior parte dos remédios é proibida, exceção feita às drogas sem necessidade de prescrição médica.
"Às vezes o governo precisa dar o primeiro passo, a fim de desordenar um sistema quebrado e ditar novas regras de comportamento", disse Azar, que costuma defender abordagens de mercado, em discurso perante a Academia Nacional de Medicina dos Estados Unidos, na segunda-feira.
A mudança, que alimentará meses de debate antes que entre em vigor em sua forma final, intensifica o cabo de guerra entre a indústria farmacêutica e o secretário da saúde, que tem origens no setor e vem se
esforçando para eliminar qualquer percepção de que se alinha com seus antigos colegas nas companhias de medicamentos.
O regulamento proposto é o mais recente esforço do governo Trump e de alguns legisladores para revelar os preços de tabela de remédios em comerciais de TV —uma estratégia que serviria para testar a premissa dos proponentes, de que os consumidores ficariam mais atentos aos preços, o que ajudaria a reduzir os aumentos de preços dos produtos farmacêuticos, que vêm sendo uma das principais causas dos custos incomumente elevados dos tratamentos de saúde americanos, nos últimos anos.
Horas antes do discurso de Azar diante da Academia Nacional de Medicina, a principal organização de lobby do setor farmacêutico anunciou uma nova ação voluntária que, em lugar da medida proposta, direcionaria os consumidores a um site das empresas farmacêuticas contendo informações
quanto a preços.
O anúncio pela PhRMA, a associação setorial das empresas fabricantes e de pesquisa de produtos farmacêuticos dos Estados Unidos, foi visto por especialistas como tentativa de evitar regulamentação federal mais agressiva.
Azar divulgou um comunicado antes de seu discurso, dizendo que "o setor farmacêutico continua resistindo a oferecer transparência real quanto aos seus preços", e que o governo precisava ir além do que ele definiu como "um pequeno passo na direção certa" pelo setor.
As companhias farmacêuticas também estão enfrentando pressão do Congresso. Uma proposta bipartidária que exigiria que as empresas incluíssem os preços dos remédios em sua publicidade televisiva foi aprovada no Senado mas terminou removida de um anteprojeto de lei orçamentária da Câmara dos Deputados no mês passado.
A ação voluntária pelo setor, que será adotada em 15 de abril, ofereceria aos pacientes diversas informações sobre preço, entre as quais o preço de tabela de um remédio, o custo que o paciente teria de
cobrir por um tratamento com ele e os programas de assistência a pacientes disponíveis.
Steve Ubl, presidente da PhRMA, argumentou que revelar o preço de tabela de um remédio em um comercial de TV causaria "muita confusão, seria enganoso, não estabeleceria o contexto necessário e não é o que os pacientes querem ou precisam".
Ele previu que revelar o preço, que não refletiria o que a maioria das pessoas pagaria por um medicamento, desestimularia pacientes de buscar tratamento médico, porque a parcela do custo que um paciente precisa cobrir varia de acordo com seu plano de saúde.
Rachel Sachs, professora associada de direito na escola St. Louis de direito, Universidade Washington, disse que não estava claro de que maneira ou por que revelar os preços nos comerciais causaria redução nos preços dos remédios.
"Colocando isso de lado, o que a PhRMA decidiu fazer é claramente uma tentativa de prevenir que o público fique preocupado", disse Sachs. "Em termos realistas, quantos pacientes visitarão esse site? E se o fizerem, as informações adicionais que encontrarão lá podem causar muito mais confusão."
Restam muitas questões sobre o site: o "preço de tabela" do remédio pode variar dependendo de sua dosagem e formulação. E as empresas teriam de escolher de que maneira revelá-lo, nesse caso. O custo direto dos remédios pode variar de acordo com o plano de saúde de um paciente, de zero ao preço total do medicamento, e por isso não fica claro que importância uma faixa estimada de preços ou um preço médio teria para os pacientes.
Ubl disse em entrevista que haveria potenciais preocupações com as leis de liberdade de expressão e questões judiciais, se o governo adotar uma regra que requer a presença de informações sobre preços em comerciais, sinalizando que uma proposta nesse sentido causaria uma disputa judicial prolongada entre o governo dos Estados Unidos e um dos lobbies mais poderosos do país.
Sachs disse que se surgir uma disputa judicial quanto à questão, isso poderia desviar o governo de seu esforço mais amplo para reduzir o custo dos remédios, que inclui dezenas de propostas políticas; "Será lamentável se a agência optar por gastar seu capital legal em regulamentações que não terão impacto óbvio sobre os preços dos remédios", disse Sachs. "Há tantas ações que o governo poderia empreender... que fariam diferença significativa para os pacientes."