General do governo Bolsonaro descarta qualquer ação militar contra a Venezuela

Citado pelo presidente eleito, Jair Bolsonaro (PSL) como ministro da Defesa do seu governo a partir de janeiro, o general da reserva do Exército Augusto Heleno Ribeiro Pereira, que hoje completa 71 anos de idade, rechaçou qualquer possibilidade de o Brasil participar de um plano militar para desestabilizar o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro.

A Folha divulgou nesta segunda-feira (29) que um alto funcionário do governo da Colômbia disse que se Bolsonaro "ajudar a derrubar Maduro com uma intervenção militar, terá o apoio da Colômbia”. Augusto Heleno disse que tal hipótese "contraria os princípios das relações exteriores" do Brasil, que preveem a não ingerência em assuntos internos de outros países.

A seguir, trechos da entrevista.

Quais são os planos para o Ministério da Defesa, uma vez confirmado o resultado das eleições? Não tenho por enquanto planos para o Ministério da Defesa. Primeiro porque não estou nomeado, não sou ministro, não posso ter planos para um troço sobre o qual não tenho nenhuma ingerência legal. Além disso, preciso conversar com o general [atual ministro da Defesa] Silva e Luna, que é meu amigo pessoal, para ele me passar as coisas, para conversar com todo mundo lá. Conversar com os comandantes das Forças. Se acontecer de eu ser ministro da Defesa. Isso aí não está confirmado. Isso precisa ser confirmado por um decreto, um documento que tem que ser publicado em Diário Oficial. É a mesma coisa de um camarada ser anunciado como técnico do Flamengo começar a dar palpite na escalação e não foi contratado. Então não funciona isso. É falta de ética.

O presidente eleito não convidou o sr. ainda? Ele já anunciou, já falou, mas o decreto é que diz que você é ou não alguma coisa nessa área pública e na burocracia do sistema. O camarada não pode [dizer] ‘Ah, então tá bem, eu já vou anunciar que a garagem do bloco A vai passar para o Bloco C’. Pô, isso é falta de ética. O sujeito tem que colocar as mãos onde permitiram que ele alcance. Não adianta colocar a mão onde ele não está autorizado a colocar. Daqui a pouco o próprio ministro, que por acaso é muito meu amigo, vai dizer, ‘Pô, vem cá, tu vais ficar dando palpite aqui? Tu não és ministro’.

Falemos então sobre os temas, não sobre sua condição de futuro ministro? Depende de temas que você quer falar.
 
Por exemplo, em entrevista hoje o sr. mencionou a questão da educação, que os militares poderiam atuar nessa área... [Interrompendo] Não, peraí, eu não falei. O problema das entrevistas é esse. São as coisas que, mexe uma palavra, e a coisa muda de sentido. A pergunta foi: ‘Quais são as áreas que o sr. acha que os militares podem atuar?’ Eu disse defesa, segurança pública, infraestrutura, que os militares conhecem muito bem, e no caso da educação, não resta dúvida de que o sistema militar de educação conseguiu ser preservado e tem êxitos evidentes. Então pode se pensar num militar que tenha experiência na área da educação e pode ajudar. Não quer dizer que não tenha inúmeros civis com a mesma capacidade. Então isso foi uma pergunta dentro de um contexto. ‘Onde poderiam [ajudar]?’ Não quer dizer que vai acontecer.

O que eu disse é que a experiência que os militares têm na área de educação e que se reflete no sistema militar de educação nos credencia para, se for o caso, ter atuação na área de educação. Mas não quer dizer que vá ser um militar nem que isso tenha nem pensado nem esboçado. Nunca ouvi falar nisso.

Não chegou a ser discutido? Não, nada disso foi discutido. A nomeação de ministro é do presidente da República e ele é que vai decidir, ninguém está dando palpite nisso aí.
 
Como general da reserva e observador, o sr. defende a extensão da intervenção no Rio? Não, peraí. Isso é outro problema. Tá vendo, vocês querem sempre pendurar a gente num pepino. [risos] A intervenção no Rio de Janeiro está regulada por um outro decreto que diz que ela vai até 31 de dezembro. Essa atribuição é do presidente Michel Temer. A partir do dia 31 de dezembro, o Rio tem outro governador e o Brasil tem outro presidente da República. E a situação [atual] do Rio de Janeiro é diferente da situação que motivou a intervenção. Os dois vão ter que estudar e verificar qual é a possibilidade de “como vamos seguir com o problema de segurança pública do Rio de Janeiro”. Ninguém também vai dar palpite, é um assunto deles, eles vão ter que discutir isso.

Mas, no seu íntimo, como especialista em segurança e defesa... [Interrompendo] Não vou dar palpite nisso aí. Hoje eu tenho uma posição que não permite dar palpite, não posso ser palpiteiro. Estou dentro de uma equipe de governo.

Mas o sr. não será consultado, em algum momento, entre dezembro e janeiro, porque afinal de contas... [Interrompendo] Se eu for consultado por quem de direito, aí sim eu tenho obrigação de dar a minha opinião. Até por um dever de lealdade. Mas publicar minha opinião num jornal antes de eu ser consultado, eu estou dando palpite numa coisa que não é da minha alçada, não vou dar.
 
Então o sr. por enquanto prefere não comentar. Lógico, lógico. É uma questão de ética, uma coisa que o Brasil está muito esquecido. Ética, honestidade intelectual, austeridade, são coisas que o pessoal está esquecendo que existe e eu quero resgatar isso aí.
 
É que sentimos que entre militares da ativa há aquela resistência de participar desse tipo de operação porque sabem que não atinge as razões de fundo da segurança pública. Não, isso aí é outra coisa que eu não vejo dessa maneira. Eu vejo que é uma missão que as Forças Armadas podem cumprir eventualmente, por determinação do presidente da República, seguindo algumas normas a quem pede essa atuação. E os militares há muito tempo dão exemplo de cumprimento de missão. A missão é dada e eles vão cumprir. É lógico que é uma missão muito difícil, custosa para quem participa porque acaba empenhando o sujeito seriamente e quase que o dia inteiro, todos os dias, e isso é óbvio que não pode ser do gosto de ninguém esse tipo de operação. Não é sonho de ninguém fazer uma operação contra os seus compatriotas para fazer cumprir a lei e a ordem. Mas não vejo nenhuma resistência a isso não. Pelo contrário, vejo muita vibração do pessoal estar participando de uma missão real, para a qual estão preparados.
 
Hoje integrantes do governo da Colômbia sugeriram que “se o presidente Bolsonaro ajudar a derrubar [presidente venezuelano Nicolás] Maduro com uma intervenção militar, terá o apoio da Colômbia”. Como o sr. recebe essa declaração? Isso contraria os princípios das nossas relações exteriores. Nós temos como preceito fundamental a não ingerência – acho que está escrito inclusive na Constituição – a não ingerência em assuntos internos de outros países. Isso também é especulação.
 
O sr. não concorda com essa hipótese? Não é questão de concordar ou não concordar. Está escrito que nós não teremos ingerência em assuntos internos de outros países. Não tem que concordar, o país é democrático, está escrito na Constituição. Isso aí é um dos pontos que o Brasil assume o compromisso mundialmente de não ter ingerência em assuntos internos de outros países.

O sr. entende que esse tipo de discurso pode levar a um caminho perigoso na relação com os países vizinhos? Acho que não vai levar a nada perigoso porque nós não vamos caminhar nessa direção.
 
Outro ponto: como o senhor pretende trabalhar o equilíbrio interno entre as três Forças, Exército, Marinha e Aeronáutica, porque as últimas duas ficariam em tese subordinadas a um general do Exército da reserva, o senhor, escolhido para o Ministério da Defesa? Isso é muito fácil, isso aí não é um problema. E não estou falando por mim. O próprio Silva e Luna tem tido uma aceitação total. Nós somos por formação, por convicção, pessoas disciplinadas que não criam problemas. Estamos acostumados a trabalhar em grupo, em fazer operações conjuntas. Então isso aí é uma fofocada que toda vez tentam fazer, não existe isso, não tem essa história.
 
Não se falaria em um rodízio entre as Forças para ocupar o Ministério? Esse rodízio não está previsto. Aonde está previsto o rodízio [Estado Maior Conjunto das Forças Armadas], tem sido respeitado. Isso não é objeto de rodízio, é uma atribuição do presidente da República escolher seus ministros de Estado. Não é obrigado a fazer rodízio.
 
Neste ano, com a intervenção no Rio, o sr. deu várias declarações sobre regras de engajamento, que no seu entender tinham que ser mudadas. O sr. continua com a mesma visão, o sr. acha que uma nova possível intervenção deve mudar as regras de engajamento? Isso também hoje eu estou numa posição... Uma coisa é você ser franco-atirador, tá, você fala as coisas... Agora eu não tenho que me manifestar publicamente sobre isso. Aí eu tenho que tratar com o presidente da República que é quem pode atuar nessa direção.

As Forças Armadas sempre batem na tecla da necessidade de recursos e de constância de repasse de recursos para os projetos estratégicos. O que pode ser feito pelo governo Bolsonaro para dar conta dessa demanda? Isso é meio que um vício brasileiro, aprova um Orçamento e depois contingencia. Eu acredito que a área econômica, quando faz isso, é porque tem necessidade, não vou desmerecer o trabalho deles. É lógico que, em termos de planejamento, isso não é bom. Se puder evitar... Claro, cada caso é um caso, cada ano é um ano diferente, há surpresas boas e ruins, então a gente não pode sair crucificando quem apela para esse contingenciamento em razão de uma situação crítica na área financeira. Então vamos aguardar para ver o que vai acontecer.

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