Haverá mobilização se próximo governo cortar verbas, diz presidente do COB
Quando Paulo Wanderley Teixeira, 68, assumiu o comando do COB (Comitê Olímpico do Brasil), há um ano, os bastidores do esporte olímpico brasileiro estavam de cabeça para baixo.
O ex-presidente da CBJ (Confederação Brasileira de Judô) encontrou uma entidade com a credibilidade abalada, punida pelo COI (Comitê Olímpico Internacional) e com problemas para encontrar novos patrocinadores.
Teixeira era vice de Carlos Arthur Nuzman, que comandou a entidade por mais de duas décadas e renunciou após acusação de participar de compra de votos para a eleição do Rio como sede dos Jogos de 2016 —o que ele nega.
Nos 12 meses seguintes, o dirigente deu início a um processo de enxugamento das contas. Demitiu funcionários, diminuiu delegações para eventos e ainda tenta mudar a sede da entidade do prédio atual na Barra da Tijuca (no qual precisa pagar aluguel) para o Parque Aquático Maria Lenk, administrado pelo COB.
Começando o segundo ano do mandato (que termina em 2020), o dirigente mostra preocupação quanto a cortes de verbas que podem ocorrer no esporte após a eleição presidencial e não descarta mobilizar forças para evitá-los.
Sem patrocínios que façam aporte significativo no comitê, a entidade depende quase exclusivamente de verbas federais oriundas da Lei Piva —que repassa parte da arrecadação com loterias para os esportes olímpicos.
*
Folha - Qual o balanço que você faz de seu primeiro ano na presidência do COB?
Paulo Wanderley Teixeira - Estamos avançando. Hoje o COB está sendo melhor visto por todos os segmentos, não apenas o esportivo. Fizemos enxugamento da folha de pagamento, mudança estatutária, tivemos a chegada de novos diretores... Passei muito tempo sozinho aqui dentro, o que foi uma coisa positiva, porque eu tive um intensivo do COB nos primeiros meses.
A reestruturação financeira foi a parte mais complicada?
Foi a mais trabalhosa, mas que era algo que eu tinha que fazer de forma emergencial. Em função de contenção de recursos, reduzir custos era fundamental para otimizar nossos investimentos.
Qual foi a porcentagem desta redução?
Em um ano, o COB reduziu 15% o número de funcionários, 30% de folha de pagamentos [salários e encargos] e 30% no valor dos contratos firmados pelo comitê.
Há algum temor pelo que pode vir do novo presidente da República em relação ao esporte?
Só espero que quem vencer [Jair Bolsonaro ou Fernando Hadadd] tenha a sensibilidade para manter avanços que o esporte teve no Brasil nos últimos anos. Quero acreditar que os candidatos estão pensando de forma positiva no esporte brasileiro, apesar de não estarem comentando abertamente. Não seria razoável encolher o esporte.
A ameaça de retirar verbas para o esporte de base, feita pelo atual governo este ano, é um sinal de que o segmento esportivo pode esperar por redução de orçamento a partir do ano que vem?
A edição da Medida Provisória 841 [que dava parte da arrecadação das loterias federais para a segurança pública e diminuía os recursos destinado ao esporte], que deu toda aquela turbulência, serviu para o esporte se unir em uma causa comum e fortaleceu essa união. Estamos atentos, mas temos que esperar as pessoas sentarem e tomarem posse no novo governo. Se for o caso, novamente o esporte irá se mobilizar e buscar uma solução que não caminhe para trás.
O COB conseguiu captar algum patrocinador neste último ano?
Ainda não. Estamos prospectando e vendo um cenário que começa a ficar positivo, nada fechado ainda.
A que você deve essa saída de apoiadores do COB? Ao final do ciclo olímpico anterior ou à saída de Nuzman sob acusação de corrupção?
Todos esses pontos têm influência no processo. A situação política e econômica do país, retração de mercado, tudo tem ligação. Quando termina um megaprojeto, como foi a Olimpíada, é natural que as empresas promovam uma certa retração, mas essa nuvem está se dissipando.
Qual foi a importância da revogação da punição do COI ao COB [suspendeu o comitê e congelou repasse de R$ 7 milhões] em fevereiro nesse processo?
Na verdade, o COI quis se resguardar com a punição, mas as medidas imediatas que estávamos tomando em relação à questão estatutária e outras inovações, ajudou também a solucionar essa questão, três meses e pouco após a sanção. Foi um reflexo positivo.
Por que foi adiada a opção de mudar o local da sede do COB para o Parque Aquático Maria Lenk?
Verificou-se o que precisaria ser feito, e o estudo foi levado para o conselho de administração do COB, que então optou para que a mudança ocorra no segundo semestre de 2020. Avaliou-se a questão de ocupação do espaço, algumas reformas estruturais que precisariam ser feitas, cabeamento de internet etc.
Por que programar a mudança só para depois da Olimpíada de Tóquio?
Porque o foco estará todo nos Jogos. Faremos a mudança de forma total, não ficará nenhum puxadinho do COB aqui no prédio atual [localizado na Avenida das Américas, na Barra da Tijuca]. O incômodo que uma mudança dessas causaria em plena fase de preparação olímpica também foi levada em conta.
O judô teve um desempenho muito abaixo do esperado no último Mundial. Exemplos como esse ligam um sinal de alerta?
Aconteceu um deslize neste Mundial, alguma coisa dentro da CBJ, e não conseguiram repetir os resultados anteriores. Mas a equipe teve a presença de atletas mais novos, o que aponta um bom caminho para 2020 e 2024, como Daniel Cargnin, Jéssica Pereira e a Beatriz Souza. Nem tudo foi terrível. Tenho certeza que a CBJ irá corrigir a rota.
O COB já chegou a falar em enviar 250 atletas para os Jogos de Tóquio. Seria um número semelhante à delegação que esteve em Londres-2012. Você imagina que esse número possa aumentar?
Deverá ficar em 250, porque nossa delegação no Rio foi atípica. Esse total de 465 atletas não acontece sempre. O mundo ideal seria ter mais atletas na delegação, com reais chances de medalha. Faríamos todo o esforço para levar todo mundo, mas evidentemente foge de nossa realidade econômica. Até porque você não descobre grandes talentos a apenas dois anos dos Jogos Olímpicos. Só se for um ET que esteja escondido por aí.