Lula permanece preso após guerra de decisões no TRF-4
Uma ordem de um juiz plantonista do TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) que já foi filiado ao PT abriu uma guerra de decisões envolvendo a soltura do ex-presidente Lula neste domingo (8) e escancarou uma disputa de forças no Judiciário.
O presidente do tribunal regional, Carlos Eduardo Thompson Flores, foi chamado a arbitrar o caso e decidiu, à noite, contra o ex-presidente, que continuará preso.
Rogério Favreto, juiz plantonista que não tem atribuição direta sobre a Operação Lava Jato, decidiu pela manhã, durante seu plantão no tribunal, atender a pedido de três deputados petistas para libertar Lula sob o argumento de que o ex-presidente, ao ficar preso, tem cerceados seus direitos de pré-candidato à Presidência.
A ordem foi em direção oposta ao entendimento do juiz Sergio Moro, do trio de juízes responsável por julgar casos da operação no tribunal regional e do STF (Supremo Tribunal Federal), que decidiu em abril negar um habeas corpus preventivo ao ex-presidente. Ele está preso em Curitiba há três meses.
O pedido favorável a Lula havia sido protocolado na noite de sexta-feira, apenas 32 minutos depois de Favreto assumir o plantão do TRF-4. A estratégia petista e a iniciativa do plantonista geraram reações quase instantâneas.
Mesmo em férias, Moro, responsável pela condenação que provocou a prisão do ex-presidente, escreveu um despacho cerca de três horas depois, quando a decisão foi divulgada, afirmando que não é da alçada de Favreto ordenar a libertação. Pediu ainda uma manifestação sobre a situação a João Pedro Gebran Neto, relator da Lava Jato no TRF-4.
"Se o julgador ou a autoridade policial cumprir a decisão da autoridade absolutamente incompetente, estará, concomitantemente, descumprindo a ordem de prisão exarada pelo competente colegiado da 8ª Turma do Tribunal Regional", disse Moro.
Gebran escreveu despacho pouco depois, chamando para si a atribuição de decidir o caso, apesar de não estar no plantão do fim de semana. Ele determinou que a ordem não fosse cumprida, disse que o colega de tribunal foi "induzido a erro" e afirmou que a distribuição do caso em um plantão "chama a atenção".
Favreto, então, em novo despacho às 16h12, subiu o tom. Deu um prazo de uma hora para que a soltura de Lula fosse consumada, negou que tenha cometido um erro e afirmou que levaria à Corregedoria do tribunal regional e ao Conselho Nacional de Justiça detalhes da atuação de Moro no caso para avaliar "eventual falta funcional".
Ele voltou a afirmar que o não cumprimento da ordem de libertação seria uma "desobediência de ordem judicial, nos termos legais".
Às 19h30, Thompson Flores deu a palavra final no caso: disse que Gebran, como relator da Lava Jato no tribunal, tem a prerrogativa de decidir sobre o assunto, ainda que a situação tenha ocorrido em um plantão.
Para ele, os fundamentos do novo pedido de habeas corpus não diferem dos que já haviam tramitado nesse tribunal, como a que contestava a prisão após condenação em segunda instância.
MAIS REAÇÕES
O imbróglio repercutiu no meio político e jurídico.
A presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, divulgou nota afirmando que os ritos do Poder Judiciário devem ser cumpridos e que a Justiça é impessoal e garantida a todos os brasileiros. Ela é a plantonista do STF durante o recesso do Judiciário.
"A democracia brasileira é segura e os órgãos judiciários competentes de cada região devem atuar para garantir que a resposta judicial seja oferecida com rapidez e sem quebra de hierarquia, mas com rigor absoluto no cumprimento das normas vigentes."
Os procuradores da Lava Jato afirmaram que Favreto agiu em "absoluto desrespeito às reiteradas decisões das diversas instâncias do Poder Judiciário" e que iriam trabalhar "de modo articulado e intenso" contra a decisão.
Petistas e aliados passaram o dia pressionando para que a decisão de Favreto fosse cumprida logo e reclamaram das respostas dos outros juízes. A ex-presidente Dilma Rousseff disse que a permanência na prisão representaria "quebra de hierarquia no Judiciário".
O pré-candidato petista ao governador paulista, Luiz Marinho, convocou apoiadores para ir ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo (SP), para esperar o ex-presidente. Lá, o petista fez seu último ato público antes de ser preso, em abril.
Simpatizantes estiveram ainda nas proximidades da sede da Polícia Federal em Curitiba, onde ele está detido. Opositores de Lula também foram ao local, mas para protestar contra a ordem.
Um dos deputados que protocolaram o pedido, Wadih Damous (PT-RJ), disse que Lula, ao ser informado do despacho a seu favor, afirmou que "nunca acreditou" que a decisão fosse cumprida.
O ex-presidente ainda tenta obter sua liberdade com um outro pedido, no STF.