Luta política dá tom a disco que celebra carreira de Ricardo Vilas
Entre as fotos do encarte de “Canto de Liberdade”, 27º álbum do cantor e compositor carioca Ricardo Vilas, destaca-se a que o registra antes de embarcar para o exílio como um dos presos políticos trocados pelo embaixador americano Charles Elbrick, sequestrado no Rio de Janeiro por militantes da luta armada, em 1969.
Vilas voltou para o Brasil em 1979 e foi diretor musical do “Sítio do Pica-Pau Amarelo”, além de ter dirigido o programa Globo de Ouro. São 50 anos de carreira, celebrados em “Canto de Liberdade”.
Nas 14 faixas do disco, no entanto, o artista traz muito do momento congelado em preto e branco daquela foto.
Oito das músicas são de Vilas e seis são de mestres da MPB. Entre elas, “Apesar de Você”, de Chico Buarque, atualizada na introdução e no final, e que Vilas deixa voar solta, alada por um samba suingado para o violonista Domingos Teixeira deitar e soar.
“Ponteio”, de Edu Lobo e Capinam, vencedora do 3º Festival da Música Popular Brasileira, em 1967, é mantida quase intacta.
Mais sambas e sembas (gênero musical popular angolano) estão no disco. Os sembas são dois: “Diferenças”, de Vilas, e “A Luta da Vida”, dele com Filipe Zau, reforçada por uma banda de músicos angolanos para legitimar o gênero.
Entre os sambas, dois clássicos de Zé Kéti, “Opinião” e “A Voz do Morro”, com direito a mais suingue, além de “O Morro Não Tem Vez”, de Tom Jobim e Vinicius de Moraes, e “Aquele Abraço”, de Gilberto Gil. “Canto de Liberdade”, de Vilas e Marquinhos de Oswaldo Cruz, protagoniza mais um canto de resistência.
A parceria de Vilas com Paulo Sergio Valle em “O Sim e o Não” lembra os sambas de Wilson das Neves e versa sobre a desigual relação entre homem e mulher.
A música “Circo de Horror”, composta no exílio por Vilas, foi regravada e retoma a triste experiência do artista como prisioneiro político no Rio.
Outra “tristona” é “Anjos”, música de Vilas dedicada a Stuart Angel Jones e Sonia Maria Lopes de Moraes, que pagaram com suas vidas por resistirem ao regime militar.
Segundo Millôr Fernandes, “a liberdade começa quando a gente aprende que ela não existe”. Vilas aprendeu e a musicou em disco de maneira justa.