Maduro autoriza Cruz Vermelha a levar ajuda humanitária à Venezuela
A Cruz Vermelha informou nesta sexta-feira (29) que obteve permissão do regime de Nicolás Maduro e da oposição, comandada por Juan Guaidó, para dar início a uma operação de entrada de ajuda humanitária na Venezuela.
A missão será similar àquela que a organização atualmente mantém na Síria, onde, segundo a ONU, 89% da população vive na pobreza e depende de ajuda alimentar internacional, afirmou Francesco Rocca, presidente da Federação Internacional da Cruz Vermelha.
A entidade advertiu que não aceitará ser alvo de interferência política em meio à luta entre o regime chavista e a oposição.
"Em um período de aproximadamente 15 dias, estaremos preparados para oferecer ajuda (...) Esperamos ajudar 650 mil pessoas a princípio", disse Rocca. A Venezuela tem cerca de 30 milhões de habitantes.
Quase um quarto da população da Venezuela necessita de ajuda urgente, segundo a ONU.
Os primeiros suprimentos incluem equipamentos médicos, kits para cirurgias e geradores. A Venezuela sofreu dois grandes apagões no último mês.
Rocca afirmou que a organização agirá de acordo com seus princípios de "imparcialidade, neutralidade e independência", "sem aceitar a interferência de ninguém".
"Esta missão obviamente não resolverá todos os problemas da Venezuela e ninguém deve presumir que esta é uma solução completa", disse.
O anúncio foi recebido por Guaidó como uma vitória da pressão da oposição sobre Maduro.
"O regime reconhece seu fracasso ao admitir a existência de uma emergência humanitária total produzida por eles", afirmou ele, que é reconhecido como presidente interino da Venezuela por mais de 50 países, dentre eles Brasil e Estados Unidos.
Em meio à escassez aguda de alimentos básicos e medicamentos, a entrada da ajuda humanitária tornou-se um dos elementos centrais da luta pelo poder entre Maduro e Guaidó.
Por causa da hiperinflação que atinge o país, comida e remédios têm se tornado inacessíveis a uma parcela cada vez maior da população, causando aumento nos índices de desnutrição, especialmente de crianças, e de doenças preveníveis.
Em 23 de fevereiro, Nicolás Maduro impediu a entrada de toneladas de alimentos, remédios e itens de primeira necessidade enviados pelos EUA. Os mantimentos entrariam no país pelas fronteiras com o Brasil e a Colômbia.
Os tumultos deixaram cerca de sete mortos e dezenas de feridos. Maduro negava a existência de uma "emergência humanitária" na Venezuela e rejeitava a ajuda, considerando um pretexto para uma intervenção militar liderada pelos Estados Unidos, desde que o presidente Donald Trump não descartou o uso da força para forçar a saída Maduro.
Rocca expressou a disposição por parte da Cruz Vermelha de trabalhar com esses suprimentos acumulados nas divisas da Colômbia e do Brasil com a Venezuela, mas sob as regras da instituição.
"Essa é uma questão muito politizada... Se essa ajuda estiver de acordo com nossas regras e nossos protocolos, é claro que estamos dispostos a distribuí-la", concluiu.
Nos últimos anos, o regime de Maduro tem usado a distribuição de alimentos e acesso a atendimento de saúde como ferramentas para angariar apoio da população carente.
O ditador disse repetidas vezes que o país não precisa de ajuda internacional.
Para manter sua imparcialidade, a Cruz Vermelha anunciou que irá distribuir os suprimentos diretamente a oito hospitais que a organização possui na Venezuela, contornando assim as redes de fornecimento do regime.
O Itamaraty informou à Folha que o governo brasileiro não foi contatado pela Cruz Vermelha para o envio de ajuda humanitária.
Ajuda chinesa
O ministro das Indústrias, Tareck El Aissami, afirmou nesta sexta que a Venezuela recebeu uma remessa de 65 toneladas de medicamentos chineses.
Pequim apoia o ditador Nicolás Maduro e e tem grandes investimentos no setor petrolífero venezuelano.
Segundo o ministro, a China está ajudando Caracas a neutralizar os esforços americanos para minar o regime chavista.
"Este é um exercício de soberania, independência e dignidade", disse El Aissami sobre os pacotes, que incluem suprimentos médicos e remédios analgésicos e para tratamento de diabetes, entre outros.
"Estamos derrotando o bloqueio que o imperialismo americano quer impor", afirmou.
O ministro não classificou a remessa como ajuda humanitária, dizendo que a Venezuela tinha "saudáveis relações comerciais" para garantir o fornecimento dos produtos.
A Cruz Vermelha não foi citada por El Aissami e já havia anunciado que não se envolveria na distribuição dos medicamentos chineses.
Na última década, a China emprestou cerca de US$ 50 bilhões à Venezuela por meio de acordos de troca de financiamentos por petróleo.
Após os recentes apagões ocorridos no país, Pequim também se ofereceu para ajudar a reformar o sistema de fornecimento de energia elétrica.