Mourão se contrapõe a Bolsonaro em almoço com moderados nos EUA
Enquanto o presidente Jair Bolsonaro foi recebido em uma espécie de Santa Ceia da direita durante sua visita a Washington, há 20 dias, o vice-presidente Hamilton Mourão será recepcionado nesta segunda-feira (8) em um almoço de moderados, com pensadores, acadêmicos e jornalistas da centro-direita e centro-esquerda americana.
No encontro, na residência do embaixador do Brasil nos EUA, Sérgio Amaral, haverá inclusive a presença de um proeminente ambientalista, Thomas Lovejoy, conhecido por defender a biodiversidade e o combate ao desmatamento na Amazônia.
A questão do clima e preservação do ambiente é tratada habitualmente com descaso pelo governo Jair Bolsonaro.
O roteiro de compromissos de Mourão na capital americana é um contraponto à agenda do presidente, que, quando esteve nos EUA, cumpriu uma agenda de encontros somente com autoridades alinhadas ao seu pensamento ideológico conservador.
Além de Lovejoy, vão participar do almoço o ex-embaixador no Brasil Thomas Shannon, que chegou a ser o terceiro na hierarquia do Departamento de Estado americano, com posições de liderança em governos democratas e republicanos, e o jornalista e escritor venezuelano Moises Naím, pesquisador do Carnegie Endowment for International Peace.
Os outros convidados são Paulo Sotero, diretor do Brazil Institute do Wilson Center; Adrienne Arsht, vice-presidente do conselho do think tank Atlantic Council; e o economista Fred Bergsten, diretor emérito do Peterson Institute of International Economics.
A lista de convidados foi elaborada pelo embaixador, que não teve a mesma função quando da visita de Bolsonaro. Na ocasião, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, e o diplomata Nestor Foster, que deve ficar com o cargo de Amaral, executaram a função.
Na terça-feira (9), Mourão faz outro movimento diferente do de Bolsonaro e se reúne com parlamentares dos EUA.
Em março, o presidente solicitou um encontro com a presidente da Câmara, a democrata Nancy Pelosi, líder de oposição a Donald Trump. A reunião, porém, que não aconteceu, segundo o gabinete de Pelosi porque o Congresso estava em recesso.
O vice-presidente também se reuniu no sábado (6) com representantes da comunidade brasileira em Boston. A iniciativa foi interpretada como uma resposta a Bolsonaro, que, três semanas antes, criticara os imigrantes.
Autoridades americanas afirmam que o roteiro de Mourão está sendo observado com atenção. Isso porque empresários e integrantes do governo dos EUA consideram pouco comum um vice viajar ao país tão pouco tempo depois de um presidente ter passado por lá.
A tentativa do general de encontrar tanto representantes do Partido Republicano, do presidente Trump, como do Democrata, de oposição à Casa Branca, foi vista por analistas como um importante movimento político.
No bipartidarismo americano é desejável o diálogo com ambos os lados para que se tenha uma relação política e diplomática eficaz.
Na terça, Mourão se reúne com senadores liderados pelo republicano Marco Rubio, a principal voz no Congresso em assuntos latino-americanos e grande defensor da aproximação com o Brasil. Rubio, que faz parte da bancada anti-castrista, defende uma abordagem mais dura com a ditadura de Nicolás Maduro, na Venezuela.
Além dele, deve comparecer ao encontro com o vice brasileiro o senador Bob Menendez, democrata, que também tem como um de seus focos os assuntos latino-americanos. Ele pode, por exemplo, querer falar sobre o sequestro internacional de crianças, já que foi um dos responsáveis por apresentar o projeto de lei Sean and David Goldman, implementado após o caso do menino Sean Goldman.
Sean foi levado pela mãe brasileira ao Brasil sem autorização do pai, o que configura sequestro internacional. Após a morte da mãe, houve disputa judicial entre os avós e o pai pela guarda do menino, que hoje vive nos EUA.
A legislação prevê diversas retaliações contra países que não cumprem determinações da Justiça relativas a sequestros internacionais de menores pelos pais. Há outros casos de mães brasileiras que levaram embora seus filhos de pais americanos e que estão sendo processadas pela Justiça.
Além de Rubio e Menendez , os senadores republicanos Jim Risch, Rick Scott e Ted Cruz devem estar presentes. Cruz é conservador e defende a construção de um muro na fronteira dos EUA com o México.
Do lado democrata, Tom Udall e Tim Kaine, candidato a vice-presidente na chapa de Hillary Clinton em 2016, são convidados para a reunião com Mourão.
Em sua Santa Ceia da direita, Bolsonaro chegou a dizer que o comunismo não pode imperar, reforçando a aproximação ideológica de seu governo com o de Trump.
Mourão quer estabelecer uma linha mais moderada e tem, nas últimas semanas, se colocado do outro lado do tabuleiro em temas polêmicos tratados pelo presidente e seu principais auxiliares.
Mourão, por outro lado, cancelou uma entrevista que daria para a rede de TV CNN, alvo frequente de críticas de Trump. Em vez disso, ele deve falar com a Bloomberg.