Mulher que acusa indicado à Suprema Corte de agressão vai depor no Senado dos EUA
Christine Blasey Ford, a mulher que acusa de agressão sexual o indicado pelo presidente americano à Suprema Corte do país, confirmou que vai testemunhar ao comitê do Senado na próxima quinta-feira (27).
A denúncia da professora colocou em dúvida a aprovação do nome do juiz conservador Brett Kavanaugh à mais alta corte dos EUA, que parecia certa até a publicação de reportagem sobre o incidente pelo jornal The Washington Post, no último dia 16.
Os republicanos têm maioria no Senado, que precisa aprovar o nome de Kavanaugh, indicado por Donald Trump; por isso, até a denúncia, havia poucas dúvidas de que ele seria confirmado. Mas a revelação de Ford colocou em dúvida o voto de alguns republicanos moderados, alguns dos quais insistiram para que Ford fosse ouvida no Senado antes da votação.
Ford afirma que o ataque sexual por parte de Kavanaugh, na época com 17 anos, teria ocorrido em Maryland, durante um encontro de adolescentes.
Ela, então com 15 anos, afirma que ele a forçou a deitar em uma cama de costas e a bolinou, esfregando seu corpo contra o dela. Também teria tentado tirar seu maiô e as roupas que vestia por cima. Quando a então adolescente tentou gritar, ele colocou a mão em sua boca, segundo ela, que conseguiu escapar após um amigo dele, que assistia a tudo, pular sobre eles.
Kavanaugh nega que o incidente tenha acontecido.
Detalhes de como deve ser a audiência ainda estão sendo negociados entre os senadores e os advogados de Ford. Ela concordou em testemunhar após o juiz, mas ainda não está claro quem fará as perguntas a ela.
Os senadores republicanos do comitê queriam contratar uma advogada externa, uma mulher, para questionar Ford, já que todos os congressistas do comitê são homens. A ideia é evitar a imagem de uma mulher sendo quesitonada por um painel só de homens.
"A dra. Ford acredita que é importante que os senadores a ouçam diretamente sobre a agressão sexual cometida contra ela. Ela concordou em ir em frente [com a audiência]", disse a advogada de Ford, Lisa Banks.
Alguns republicanos vêm reafirmando seu apoio a Kavanaugh. "O que eu devo fazer, arruinar a vida do cara por causa de uma acusação? Eu não sei quando aconteceu, onde aconteceu, e todo mundo que supostamente estaria lá diz que não aconteceu. A não ser que haja algo a mais, não, não vou arruinar a vida do juiz Kavanaugh por causa disso", disse o senador republicano Lindsey Graham, da Carolina do Sul.
Já a senadora democrata Mazie Hirono, do Havaí, que vem defendendo Ford publicamente, disse que tem dificuldade de acreditar em Kavanaugh. "Há tantas indicações da falta de credibilidade dele", disse ela.
O depoimento de Ford também preocupa a Casa Branca de Trump, já que a fala da professora pode não só prejudicar as chances de Kavanaugh como estimular mais mulheres a ir às urnas nas eleições legislativas de novembro para votar contra republicanos.
Assessores vinham insistindo para que Trump evitasse comentar o caso, mas, na sexta-feira (21), o presidente questionou a credibilidade de Ford, causando reações imediatas nas redes sociais e de ativistas ligadas ao movimento #metoo.
"Eu não tenho dúvidas de que, se o ataque contra a Dra. Ford tivesse sido tão grave quanto ela diz, as acusações teriam sido imediatamente registradas junto às autoridades da lei por ela ou por seus amados pais", escreveu o republicano em uma rede social nesta sexta (21).
A declaração do presidente levou diversas mulheres a usarem hashtag #WhyIDidntReport (por que eu não denunciei) em redes sociais, por meio da qual usuárias contaram os motivos de não terem ido às autoridades pelos ataques que sofreram.
Em artigo publicado nesta sexta (21) no Washington Post, a escritora Patti Davis, filha de Ronald Reagan, defendeu Ford e relatou que também sofreu um estupro, há cerca de 40 anos.
A audiência de Ford no Senado traz à memória a denúncia de Anita Hill, professora de direito que acusou o juiz Clarence Thomas de assédio sexual em 1991; ele foi confirmado à Suprema Corte apesar das denúncias e lá está até hoje.
"Se o Senado atropelar [a denúncia], haverá uma forte reação. O Senado falhou no teste em 1991. Como o Senado lida com isso, como os republicanos lidam com isso, será um teste; será que em 2018, em meio ao #metoo, podemos ser melhores? Sinto que estamos falhando se não lidarmos com isso corretamente", disse a senadora democrata Patty Murray, do estado de Washington.
A própria Anita Hill escreveu no New York Times na última semana, dizendo que o Senado deve levar a sério as acusações. "A Comissão Judiciária do Senado de 2018 deve mostrar clara compreensão de que a violência sexual é uma realidade social à qual deputados devem reagir. Um curso justo, neutro e cuidadosamente desenhado é a única maneira de tratar o próximo depoimento da dra. Ford e do juiz Kavanaugh", escreveu ela.