Mulheres, a Terceira Via

Estão iludidos aqueles que comparam o papel das mulheres nas presidenciais americanas de 2016 com o das brasileiras em 2018.

Na altura, elas votaram contra Donald Trump, mas o colégio eleitoral, uma bizarrice local, garantiu a vitória do candidato republicano.

A calamitosa campanha de Hillary Clinton, acusada de instrumentalizar a causa das mulheres, ajudou a reforçar estereótipos sobre o suposto caráter divisivo, e até contraproducente, da "questão de gênero". Um termo revelador do desdenho de alguns em relação ao potencial das mulheres na politica.

Antes de se iniciarem as batalhas eleitorais de 2018, analistas políticos alegadamente progressistas recomendavam aos candidatos evitarem a armadilha identitária.

Esses analistas deveriam, pois, reexaminar suas pressuposições mais empedernidas. Retomada pelas novas gerações, a dinâmica do ativismo das mulheres evoluiu bastante nos últimos anos.

Sem um comando central, as manifestações se amalgamam de maneira difusa até ganhar corpo e tomar a rua para expressar sua força e voz. Como se viu no #elenão, são as celebridades que correm atrás do movimento, e não o contrário.

Nos Estados Unidos, as organizadoras do #metoo assumiram a liderança da oposição contra Trump.

O número de mulheres competindo a cargos políticos pelo Partido Democrata passou de 205 em 2016 a 387 nas eleições de meio de mandato marcadas para novembro deste ano.

Principais responsáveis por impedir os avanços da agenda trumpista em nível estadual, os seus coletivos estão resistindo ao desmantelamento dos parcos cuidados de saúde e à implementação de medidas anti-imigrantes.

Na semana passada, uma ilustre desconhecida teve a coragem de desafiar o indicado de Trump para a Suprema Corte.

Muito mais do que o atrelamento a uma agenda eleitoral, o engajamento político das mulheres se tornou um fenômeno de resistência social.

O Brasil que se mostrou ao mundo com a excepcional manifestação deste sábado tem muito mais a ver com os Estados Unidos da era pós-Trump.

Verdadeira terceira via desta campanha, o #elenão, que tem na sua origem a "primavera feminista" de 2015 contra Eduardo Cunha e a sua agenda medieval, pode decidir os rumos do país no segundo turno.

Os políticos se enganam ao pensar que vão negociar o seu voto com promessas de mais participação no governo. A "bancada da saia" só existe na cabeça fisiológica dos cartolas de Brasília.

Para atender as expectativas do #elenão, os presidenciáveis deverão comprometer-se a conferir um papel central às mulheres na formulação de políticas públicas que garantam o seu lugar nas profissões e nos empregos, inclusive nas ciências exatas e nas profissões técnicas.

Em outras palavras, a emancipação feminina deverá ser uma parte integral do projeto de retomada da economia.

Esperemos que os milhares de grupos aglutinados em torno do mote #elenão organizem convenções para detalhar iniciativas regionais nas próximas semanas.

E que os candidatos tenham a coragem de encarar o debate. Boa sorte a eles e elas.

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