'Nova História do Cinema Brasileiro' aborda desde primórdios até produção contemporânea
Os passos iniciais da produção de filmes no Brasil se restringiram a Rio e São Paulo? Qual é a participação de diretoras na história do cinema do país? Já se filmaram faroestes por aqui?
Ao longo de mais de mil páginas, os dois volumes da recém-lançada “Nova História do Cinema Brasileiro” respondem a questões como essas, entre tantas outras. Sob a organização dos professores Fernão Pessoa Ramos e Sheila Schvarzman, a obra vai da primeira filmagem no país, no final do século 19, à produção contemporânea.
O lançamento ocupa um espaço importante como obra de referência. Em 1990, saiu “História do Cinema Brasileiro”, também organizado por Fernão Ramos, livro que ganhou algumas reedições, mas saiu de catálogo na mesma década.
Desde então, o docente da Unicamp planeja outra obra, mais abrangente. Pouco mais de dez anos atrás, ele começou a conversar com Sheila, professora de pós-graduação da Anhembi Morumbi, para que coordenassem juntos essa “Nova História”.
Os volumes reúnem textos inéditos de 23 autores. No primeiro capítulo, “Os Primórdios do Cinema no Brasil”, o pesquisador José Inácio de Melo Souza consolida seus estudos sobre Cunha Sales, responsável pela primeira filmagem de que se tem notícia no país, uma cena litorânea de novembro de 1897, no Rio.
Melo Souza também comenta os chamados filmes cantantes, que demonstram a versatilidade de exibidores e diretores do cinema silencioso. A projeção exibia cantores europeus interpretando árias famosas e, atrás da tela, havia barítonos e sopranos brasileiros dublando a música. Em 1909, sessões de “A Viúva Alegre” no Rio receberam mais de 180 mil espectadores.
Nos capítulos seguintes, o livro mostra como esses primeiros anos do século 20 foram inventivos em outros centros além de São Paulo e Rio. Há textos sobre esse período no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, em Pernambuco e na região amazônica.
O cinema silencioso ganha, portanto, uma relevância inédita, considerando as obras anteriores com esse perfil.
Ao fim dos dois volumes, as mulheres também saem fortalecidas. “Como o eixo é cronológico, não fazia sentido abrir um capítulo sobre a mulher no cinema brasileiro”, afirma Ramos. “O que fizemos foi dar ênfase à presença feminina dentro dessas ondas da produção do país.”
É a chance de conhecer cineastas como Gilda de Abreu (1904-1979), que lançou o melodrama “O Ébrio”, em 1946. A assistência de direção também coube a uma mulher, Arlete Lester, conforme lembra Sheila. “Foi um estouro de bilheteria”, diz a professora.
Também se sobressaem duas Helenas, Solberg e Ignez. A primeira, Helena Solberg, despontou junto com a turma do cinema novo e, nas décadas seguintes, fez documentários nos EUA e na América Latina. A segunda, Helena Ignez, começou a carreira como atriz e hoje acumula prêmios como diretora.
A produtora Aurora Duarte é uma das protagonistas do capítulo “O Cinema Paulista para Além dos Estúdios”, de Flávia Cesarino Costa e Laura Loguercio Cánepa. As pesquisadoras contam como a decadência de estúdios como a Vera Cruz abriu espaço para o surgimento de gêneros alternativos, como os faroestes, a partir da década de 1950.
“A Morte Comanda o Cangaço”, um nordestern (derivação nacional do western) de sucesso em 1960, só se tornou viável graças à produção de Aurora, também atriz.
Os três capítulos finais são dedicados à produção das últimas duas décadas. Assinado pelo crítico Carlos Alberto Mattos, o texto “Documentário Contemporâneo” descreve e analisa especialmente a obra de Eduardo Coutinho.
Segundo Fernão Ramos, apesar de restrições e deformidades, o cinema brasileiro passa por um momento de dinamismo. “É uma arte viva e presente.”
Nova História do Cinema Brasileiro
Organizadores: Fernão Pessoa Ramos e Sheila Schvarzman. Edições Sesc. R$ 92 (cada volume). O e-book (R$ 46 cada volume) inclui três textos e uma filmografia (1969-2015) que não estão na versão física