Otimismo de ruralistas com Bolsonaro impulsiona 'Tinder do campo'
Ribeirão Preto (SP) – O otimismo do setor rural com o novo governo não se traduz apenas na previsão de venda recorde de colheitadeiras ou na perspectiva de regras mais permissivas para aumentar as áreas de plantio. O campo está se movimentando de maneiras menos óbvias, como pude constatar na semana passada na Agrishow, principal feira agrícola do país, em Ribeirão Preto (SP).
Num estande relativamente modesto (ao menos se comparado aos monstrengos que as grandes empresas de máquinas montaram), os irmãos Rafael e Roberto Fabrizzi Lucas apresentavam o MF Rural, um serviço que é uma espécie de Tinder do campo.
O conceito é simples: produtores ou trabalhadores rurais anunciam seus produtos numa plataforma online, e os interessados dão uma espécie de “match”. “É um site para captar interessados em comprar e vender. A partir do momento em que se encontram, já não temos mais envolvimento”, diz Rafael, 35.
A plataforma surgiu modestamente em 2004, criado por uma família de veterinários: pai e quatro filhos. No ano passado, cresceram 15%, e neste ano esperam no mínimo repetir a dose. “Vendemos de galinhas a fazendas”, afirma Roberto, 38.
O serviço é um termômetro do setor. No ano passado, dizem os irmãos, foi claramente possível identificar o efeito da vitória de Bolsonaro sobre os negócios. “De outubro a dezembro as vendas superaram nossas previsões em 5%”, afirma Rafael.
Roberto afirma que a vitória de Bolsonaro foi bem recebida pelo setor. “Ele está tirando a visão de que produtor rural é bandido”, diz.
Os usuários pagam uma taxa fixa e única para o site que varia entre R$ 199 e R$ 299 a depender da visibilidade buscada, no modelo “anúncio eterno”: o produto só é retirado do ar depois de vendido.
O site surgiu quando o pai de Rafael e Roberto, que tocava uma fazenda na região de Marília (SP), cansou-se de procurar insumos e ferramentas de que precisava. Pensou primeiro em abrir uma loja física na cidade, mas depois foi convencido pelos filhos que o futuro era online.
O investimento inicial foi de R$ 12 mil (“em três cheques, para 30, 60 e 90 dias”, lembra Roberto). Atualmente, o site tem 2,2 milhões de acessos por mês e emprega 30 pessoas. É possível anunciar animais, aviões e até usinas de cana. O produto mais caro já vendido, dizem os irmãos, foi uma jazida de ouro, no valor de R$ 2,5 milhões. O mais simples, um saquinho de ovos de codorna em conserva por R$ 12,50.
Outros dois exemplos de empreendedorismo na feira vieram de Gramado (RS). Uma loja de produtos de couro e outras de facas pegaram a estrada e, após 1.500 km de viagem, aportaram na Agrishow.
Quando digo pegaram a estrada, é literal: ambas funcionam em caminhões adaptados que se desdobram e viram lojas bastante confortáveis.
Loja de calçados montada em caminhão na Agrishow (Fábio Zanini/Folhapress)
Na feira agrícola, despertavam curiosidade de quem passava por perto. O nome da loja de couro me deixou intrigado: “Malacara”. Menos mau que vende mais calçados do que malas.