Para se popularizar no Japão, NBA ensina beabá da liga a jornalistas

Pete Pranica, veterano locutor televisivo do Memphis Grizzlies, parecia estar demonstrando um passo de dança, em uma sala de reuniões em Tóquio, explicando a narradores e comentaristas japoneses como funciona a regra da NBA que define como falta projetar o quadril para barrar a passagem de um adversário, quando um jogador está fazendo um corta-luz.

Ele disse aos seus colegas jornalistas, por meio de um intérprete, que os telespectadores "esperam que você saiba tudo que se pode saber sobre a NBA".

Por dois dias, no final de setembro, usando um quadro de mensagens, vídeos e uma apresentação de PowerPoint, Pranica, com paciência e muita agilidade mental, explicou toda espécie de coisa, de mudanças nas regras às perspectivas de cada um dos times na nova temporada do basquete profissional masculino americano, e falou também sobre os preparativos para transmitir um jogo.

Ele estava vestido de modo casual ---uma camisa polo com o logotipo do Grizzlies e calças claras---, mas sua mensagem era séria.

A NBA está presente no Japão, a terceira maior economia do planeta, há três décadas, e 12 partidas de temporada regular foram disputadas no país de 1990 para cá. Mas alguns dos narradores e comentaristas que assistiram ao curso de Pranica tinham pouca experiência na transmissão de jogos da liga, já que dedicaram boa parte de suas carreiras a narrar futebol, beisebol ou basquete colegial.

Um deles perguntou a Pranica se era verdade que a soma dos números das camisas dos árbitros em uma partida de NBA não podia passar de 100.

"Até onde eu saiba, não", ele respondeu diplomaticamente, o que explica a urgência de seu seminário.

No Japão, a NBA não é assistida com o mesmo fervor e profundidade de conhecimento vistos em outros países asiáticos como as Filipinas, onde o basquete é o esporte coletivo mais popular.

Na China, maior mercado da NBA fora dos Estados Unidos, cerca de 300 milhões de pessoas praticam o esporte, e 640 milhões de telespectadores assistiram aos jogos da liga na temporada passada.

"As Filipinas são a referência para nós quando pensamos no tipo de popularidade que gostaríamos de ver em mercados como o do Japão", disse Matt Brabants, vice-presidente mundial de distribuição de mídia e operações de negócios da NBA, em entrevista por telefone. "E temos de trabalhar para isso".

Para expandir sua presença no Japão, na temporada passada a NBA assinou uma parceria com a Rakuten, gigante do comércio eletrônico e internet sediada em Tóquio, para transmissão ao vivo de suas partidas em todo o país.

A Rakuten, que tem a aspiração de concorrer com a Amazon, também se tornou patrocinadora mundial da liga, em um contrato plurianual cujo valor foi estimado em US$ 225 milhões.

A Rakuten também se tornou patrocinadora dos uniformes do Golden State Warriors, por valor estimado em US$ 60 milhões por três temporadas. O nome da empresa aparece nos uniformes do time e em seu centro de treinamento.

A Rakuten representa a parceria de mídia mais inclusiva que a NBA já firmou no Japão. Mas embora diversos jogadores japoneses de futebol e beisebol tenham desfrutado de carreiras internacionais importantes, apenas um jogador nascido no Japão já foi parte de um time da NBA.

O armador Yuta Tabuse jogou quatro partidas e um total de 17 minutos pelo Phoenix Suns em 2004 ---o que não é a espécie de carreira que encantaria um país, como por exemplo a de Yao Ming no Houston Rockets, que levou o jogador ao Hall da Fama do basquete e fez muito por promover a NBA na China.

Em país insular como o Japão, que tem espaço limitado para seus 127 milhões de habitantes, há apenas 30 quadras públicas de basquete, o que restringe o desenvolvimento de uma cultura amadora do esporte, de acordo com a Fiba, a federação internacional da modalidade.

Nos últimos anos, a administração do basquete profissional no Japão esteve em desordem. A Associação Japonesa de Basquete foi suspensa em 2014 pela Fiba por operar duas ligas profissionais concorrentes.

A questão foi resolvida, e a federação japonesa foi readmitida em 2015. As duas ligas profissionais se fundiram e agora criaram um campeonato com três divisões chamado B.L. League, que disputou seu primeiro torneio em 2016-2017, e envolve acesso e descenso, como no futebol profissional.

Mas as regras e táticas do basquete não são tão compreendidas no Japão quanto nas Filipinas e China, disse J.R. Henderson, californiano que foi parte da equipe da Universidade da Califórnia em Los Angeles que conquistou o título universitário da NCAA em 1995, e que joga profissionalmente no Japão desde 2001.

"Não é a NBA que eles não entendem; é o basquete", ele disse em entrevista por telefone. "Não entendem as regras, os padrões de substituição, os motivos para os pedidos de tempo em determinados momentos do jogo, as razões para que o ritmo do jogo se acelere e se desacelere".

Henderson, 41, jogou 30 partidas na NBA pelo então Vancouver Grizzlies, na temporada 1998-1999, e agora se naturalizou japonês, sob o nome J.R. Sakuragi.

Ele joga pelo Aisin Seahorses, na primeira divisão do basquete japonês. Seus colegas de time conhecem bem a NBA e tentam imitar o comportamento dos astros da liga americana, disse Henderson. Em seu time, "as coisas não são diferentes do que são com a torcida americana".

Fora do círculo do basquete, comentou Henderson, seria difícil encontrar alguém que saiba quem é Carmelo Anthony.

Mas as oportunidades para que os japoneses se familiarizem mais com a NBA estão crescendo. O acordo com a Rakuten oferece mais exposição à liga. Uma revista de basquete chamada Dabudori (duplo drible) está circulando há um ano. E dezenas de astros da NBA devem participar da Olimpíada de Tóquio em 2020.

Yuta Watanabe, ala de 2,06 metros que defendeu a Universidade George Washington nos Estados Unidos, assinou um contrato alternativo com o Memphis Grizzlies para a temporada 2018/2019, o que permitirá que ele se transfira entre o time principal e a equipe associada a este na G League, a liga de desenvolvimento de jogadores da NBA.

Rui Hachimura, ala de 2,03 metros que talvez seja o mais promissor jogador de basquete a ter surgido no Japão, está entrando em sua terceira temporada pela Universidade Gonzaga. Ele é um dos astros da seleção japonesa de basquete e, de acordo com a universidade, o quinto japonês na história a jogar por um time da primeira divisão do basquete universitário dos Estados Unidos.

Se um jogador japonês conseguir sucesso na NBA "por mais do que um par de jogos, digamos por dois ou três anos, isso faria uma grande diferença", disse Henderson.

Outra diferença poderia surgir com mudanças na forma pela qual os torcedores assistem aos jogos.

Em sua recente Summer League, na pré-temporada, a NBA testou um formato de transmissão chamado visão vertical. A experiência foi estimulada em parte pela preferência dos torcedores chineses por verem jogos com as telas de seus celulares na posição vertical e não horizontal, em suas jornadas matinais para o trabalho em transportes coletivos lotados ---é esse o horário em que jogos ao vivo americanos são transmitidos aqui. Pode ser que os torcedores japoneses demonstrem interesse semelhante por assistir em modo vertical.

A NBA agora está disponível em 215 países e 50 idiomas. Nas Filipinas, dizem dirigentes da liga, os torcedores mais sofisticados preferem transmissões em inglês comandadas por ex-treinadores e jogadores, como Jeff Van Gundy e Mark Jackson.

"Eles têm boas observações e são engraçados", disse Riel Cruz, proprietário de um restaurante nas Filipinas, na escala em Tóquio do seu voo de retorno dos Estados Unidos às Filipinas, depois de suas férias. "Os caras filipinos... parte do que eles dizem é asneira. Eles falam sobre o que comeram no café da manhã".

Os torcedores japoneses em geral preferem jogos narrados em seu idioma, com informações contextuais mais extensas do que as oferecidas nas narrações americanas, usualmente telegráficas. A linguagem do basquete é em geral formal, sem jargões extravagantes, e muitas palavras são adaptações dos termos originais americanos. Uma enterrada [dunk], por exemplo, é "dunku".

Mas também há um lado maravilhosamente sintético em algumas das expressões de basquete. Uma falta flagrante por conduta antiesportiva, por exemplo, é conhecida como "unspo" [do inglês "unsportsmanlike conduct"]. E um tênis de basquete é "basshu" ["basketball shoe"].

Reo Onishi, que foi o intérprete de Pranica nas palestras e é redator no site japonês da NBA.com, disse que sua esperança era a de que o locutor do Grizzlies inspire os comentaristas japoneses a apimentar suas transmissões.

Referindo-se à frase com que Pranica descreve um jogo em que o Memphis construiu uma vantagem intransponível, ele disse: "Agora, todo narrador japonês vai dizer: 'Martelo. Prego. Caixão. Essa já era'".

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