Pequenas atitudes podem contribuir para um Carnaval mais sustentável
Carnaval é época de celebração e fortalecimento da identidade nacional, mesmo com a diversidade de seus formatos no território brasileiro. Os primeiros registros datam do período colonial e, desde então, a forma como as festas ocorrem tem evoluído a cada ano.
Hoje em dia, o Carnaval vai muito além dos tradicionais desfiles das escolas de samba, que ocorrem em sambódromos para um público pagante. As festas tomaram também as ruas de maneira grandiosa, com o aumento da presença de blocos promovidos pelos próprios foliões, geralmente gratuitos para que todos possam participar.
Há pouco tempo atrás, era comum ver uns poucos blocos pela cidade de São Paulo com um público acanhado.
Em 2018, no entanto, São Paulo contou com 491 blocos desfilando por suas ruas (cem a mais que em 2017) e atraindo mais de quatro milhões de pessoas para brincar o carnaval, ultrapassando os números da cidade do Rio de Janeiro, um dos maiores pontos de concentração de foliões, no qual 473 blocos desfilaram durante o mesmo período.
Em razão da dimensão e das repercussões nacional e internacional das festas realizadas nesse período – que unem samba e desfiles à alegria e simpatia de um povo muito receptivo –, o feriado de Carnaval passou a ser uma época de alta movimentação turística, atraindo um grande público para os locais onde as atividades são mais intensas e gerando um enorme benefício para a economia do país.
Em 2018, o Ministério do Turismo estimou que o carnaval injetaria R$ 11,14 bilhões na economia nacional, além da alta geração de empregos temporários no período. Porém, apesar dos benefícios sociais e econômicos dessa grandiosa festa, é justamente esse aumento notável de atividades relacionadas ao turismo e das celebrações locais que trazem um dos maiores problemas do Carnaval: o consumo excessivo e a enorme geração de resíduos.
Nas festas promovidas nos sambódromos, o impacto é notado antes mesmo do período de Carnaval na fabricação dos carros alegóricos e das fantasias feitas pelas escolas de samba, o que gera grandes quantidades de resíduos como placas de plástico, estruturas de metal, restos de cola e retalhos de tecidos que precisam ser coletados e destinados com grande gasto financeiro pelas prefeituras.
O impacto pode também ser visto ao final do evento, quando os carros ou fantasias que se estragam durante os desfiles são descartados no próprio local, somando-se ao lixo e aos resíduos acumulados em função do consumo dos espectadores. No Rio de Janeiro, em apenas um dia de desfile, 62 toneladas de resíduos foram retiradas do sambódromo em 2018, sendo que apenas três toneladas eram de materiais recicláveis.
Tratando-se dos blocos de rua, os resíduos gerados caracterizam-se, majoritariamente, pelas embalagens de alimentos e bebidas consumidas pelos foliões. A popularização desse tipo de comemoração leva a um grande aumento no consumo de determinados produtos e à consequente enorme geração de resíduos.
Dimensionando o problema: somente entre a sexta que antecede o feriado até a terça de Carnaval, em 2018, os blocos de rua foram responsáveis pela geração de 486,5 toneladas de lixo no Rio de Janeiro, some-se à isso a prática pouco civilizada de urinar na rua, que levou a uma grande quantidade de foliões multados.
Em São Paulo, a situação não é diferente: no mesmo período (da sexta à terça de Carnaval, em 2018), 957,9 toneladas de resíduos foram recolhidas nas ruas e no sambódromo da cidade (um aumento de quase 60% em relação ao ano de 2017), sendo que apenas 11,8 toneladas, ou 1,2% do total, eram recicláveis.
Esses impactos, tanto os decorrentes da folia nos sambódromos quanto nas ruas, não afetam somente o meio ambiente e a orçamento público – já que mais equipamentos e trabalhadores de limpeza urbana têm que ser alocados para a limpeza dos locais –, mas afetam também os consumidores.
Quando jogadas nas ruas, as embalagens de alimentos e bebidas e os restos de fantasias podem causar o entupimento de bueiros e, em caso de chuvas, ocasionar o alagamento dos locais – muitas vezes bairros residenciais, como é o caso da Vila Madalena, na cidade de São Paulo.
Além disso, essas embalagens de comida contêm restos orgânicos que, quando jogadas no lixo sem a devida limpeza (ou jogadas nas ruas), podem atrair pragas ou servir como foco para a criação de mosquitos transmissores da dengue, zika e chikungunya, proliferando doenças. O mesmo pode acontecer quando as pessoas urinam nas ruas.
Diante de tamanhos impactos, é obviamente necessária a ação conjunta dos diversos atores envolvidos – foliões, escolas de samba, organizadores dos blocos de rua e das prefeituras – para reduzi-los. No entanto, para além das responsabilidades atribuídas às prefeituras com relação à segurança, mobilidade e limpeza urbana, é importante que os blocos se responsabilizem por ter sua própria estrutura, especialmente de limpeza urbana. Essas exigências, porém, nem sempre são atendidas e diversos blocos deixam de oferecer banheiros químicos ou não fazem a limpeza no local após o desfile, sobrecarregando os serviços públicos.
Apesar das ações realizadas para oferecer melhor infraestrutura, é muito comum, devido ao erro na previsão de público esperado nos eventos, que as lixeiras espalhadas pelas ruas e nos sambódromos fiquem superlotadas e que o lixo caia no chão, ou ainda que não haja banheiros químicos disponíveis em número suficiente e, nesse caso, de nada adianta a colaboração derivada da consciência do consumidor se não houver a dos responsáveis pelos eventos.
Por outro lado, a partir de práticas simples, o consumidor pode também contribuir para tornar o evento mais sustentável sem deixar de se divertir. O Akatu separou algumas dicas para os foliões aproveitarem o Carnaval de maneira mais consciente, que podem ser conferidas aqui. Algumas delas dizem respeito, por exemplo, à reutilização ou compartilhamento de fantasias (evitando o gasto de material na confecção de novas e a geração de resíduos das antigas), evitar o consumo de embalagens plásticas de uso único e ainda à prática do turismo consciente, sempre preservando os locais por onde passar.
É necessário reconhecer o valor e a importância do Carnaval para o país e preservar esse traço fortemente presente na cultura dos brasileiros. A educação para isso começa logo cedo: as escolas que promovem festinhas de Carnaval para as crianças ou bloquinhos de rua dedicados à diversão dos pequenos podem desempenhar esse papel atuando como agentes multiplicadores entre os mais jovens enquanto seus valores ainda estão sendo formados.
Para os mais velhos, cabe às prefeituras, escolas de samba e aos próprios blocos de rua fazerem campanhas em diversas mídias para despertar a consciência quanto aos impactos de consumo dos foliões, de modo que possam curtir o feriado de maneira mais sustentável.
Carnaval deve ser sinônimo de celebração, alegria, muito respeito e festa! Não vamos deixar que seja associado a práticas “insustentáveis” que, afinal, prejudicam a todos.