Prévias nos EUA premiam mulheres, minorias e aliados do presidente
A temporada das primárias eleitorais nos Estados Unidos, que começou em março, teve fim na última quinta (20) com a disputa em Nova York. E os resultados das urnas mostram algumas tendências que podem se manter até as eleições legislativas de novembro.
Um dos maiores destaques dos últimos meses foi o número recorde de mulheres que garantiram o direito de disputar cargos no Congresso e governos locais. Segundo dados do Center for American Women and Politics, mais de 270 venceram as primárias que disputaram para concorrer à Câmara, ao Senado e a governos estaduais.
Seis embates por uma vaga no Senado serão travados entre duas mulheres, uma de cada partido, outro número recorde. Nas eleições de 2012, duelos do tipo ocorreram em apenas três lugares.
Os resultados também mostram a ascensão de candidatos LGBTQ e de outras minorias.
Mais de 430 candidatos LGBTQ concorreram para cargos em todos os níveis de governo nas primárias, número inédito, segundo o Victory Institute, organização que defende uma maior representação pública do grupo. Destes, ao menos 244 continuam na corrida após as primárias.
A candidata democrata Christine Hallquist, de Vermont, que se tornou a primeira transexual a concorrer por um grande partido ao governo estadual, está entre eles.
O partido Democrata acolheu a maior parte dos integrantes de minorias.
"A diversidade no partido, que tem desde latinos até pessoas LGBTQ, é realmente uma grande força deles", afirma Matthew Dalleck, professor-associado da escola de gestão política da Universidade George Washington.
Candidatos que se identificam como negros venceram três primárias para governos estaduais: Andrew Gillum concorrerá na Flórida, Ben Jealous em Maryland e Stacey Abrams na Geórgia.
Eles podem mudar a história do país, que até hoje só elegeu dois governadores negros: Douglas Wilder, em 1989, na Virgínia, e Deval Patrick em 2006, em Massachusetts.
(David Paterson, que governou Nova York de 2008 a 2010, era o vice de Eliot Spitzer, que renunciou em meio a um escândalo envolvendo prostitutas).
Alguns candidatos mais à esquerda dentro do partido Democrata superaram nomes de peso do establishment em embates e surpreenderam os mais céticos, outro destaque da temporada.
Foi o caso de Alexandria Ocasio-Cortez, de Nova York, alinhada com o senador e ex-presidenciável Bernie Sanders. Na disputa para a Câmara, ela derrotou Joseph Crowley, com dez mandatos no currículo, e pode se tornar a pessoa mais jovem a assumir um cargo no Congresso.
Mas resultados do tipo, apesar de simbólicos, não foram regra no lado democrata --numa espécie de déjà vu de 2016, quando Sanders, apesar de arregimentar uma multidão de jovens, perdeu a candidatura para Hillary Clinton.
"Com algumas exceções notáveis, o establishment venceu dentro do partido", diz Michael Traugott, cientista político da Universidade de Michigan. "A ala mais à esquerda não está tão conectada à massa de eleitores do partido."
Já no outro extremo do espectro político, os candidatos apoiados por Trump tiveram vitórias significativas em relação aos apoiados pelos líderes mais tradicionais do partido Republicano. Ponto para o presidente, atualmente enrolado em polêmicas.
Antes das primárias para governador, por exemplo, Trump apoiou 12 nomes (e outros quatro depois que já tinham ganhado a disputa), segundo o site Ballotpedia, que reúne dados sobre as eleições nos EUA. Apenas um perdeu: Foster Friess, de Wyoming.
"Acho que ele conseguiu solidificar seu controle sobre o partido ao mostrar que os candidatos alinhados a ele venceram as disputas", diz Dalleck, aludindo ao fato de Trump, egresso do setor imobiliário, sempre ter se colocado como uma espécie de cavalo azarão no páreo republicano .
"Mas não acho que as coisas estão se configurando de uma forma favorável para ele, que é controverso e impopular."
O aumento no número de eleitores democratas que compareceram às urnas, incentivados pelo sentimento anti-Trump, foi outro destaque das primárias, diz Richard Arenberg, do Departamento de Ciências Políticas da Universidade Brown.
O voto nos Estados Unidos não é obrigatório, e convencer o eleitor a ir às urnas é o primeiro trabalho dos candidatos. Nas prévias, na maioria dos estados só pode votar quem está registrado como eleitor de um partido.
Enquanto em 2014, ano das últimas eleições legislativas de meio de mandato presidencial, votaram 13,8 milhões de democratas nas prévias, neste ano, o número aumentou para 22,7 milhões, um crescimento de quase 65%, segundo levantamento do site especializado em política The Hill. Em 14 dos 50 estados, mais do que dobrou a participação desse grupo.
Entre os republicanos, o aumento foi menor, mas também notável: de 15,5 milhões para 19,3 milhões, ou 24%.
O engajamento cívico tem boa chance de perdurar até novembro, em meio a tantas polêmicas envolvendo o presidente no noticiário.
Entre elas estão a nomeação para a Suprema Corte de Brett Kavanaugh, acusado por uma professora de psicologia de tê-la atacado sexualmente na adolescência, e as investigações do procurador especial Robert Mueller sobre o envolvimento da Rússia na campanha de 2016. "São questões que podem ajudar a definir a eleição", diz Arenberg.