RÉPLICA: Secretaria quer limar monopólio, não fazer lobby
Máfia, truste, guilda?
Você consegue imaginar um concurso público em que os candidatos escolhem os jurados? Que uma instituição represente vários inscritos e vote diversas vezes? Que em 28 de 32 edições os três jurados escolhidos sejam indicados por essa mesma instituição? Que alguns indicados foram jurados oito vezes?
Que 88% dos projetos aprovados sejam representados por esta mesma instituição e, em algumas edições 100%!? Que nestas 32 edições do concurso esta mesma instituição receba R$ 159 milhões?
Que os vencedores recebiam, cada um, até R$ 800 mil sem sequer ter a obrigação de fazer uma apresentação? Que alguns grupos ganharam até 11 vezes? E que em sua grande maioria você nunca ouviu falar deles? Nem você nem ninguém que você conheça.
Pois isso existiu por 15 anos: o Edital de Fomento ao Teatro. Criou-se uma situação em que ou você fazia parte desta associação ou sua chance de vencer reduzia-se a quase zero.
Esta gestão da Cultura na cidade, após consulta à Procuradoria do Município, mudou a forma de votação, seguindo a lei. Para cada proponente um voto! O grupo que perdeu o controle de tal fortuna criou uma versão de que tal decisão tornava a votação menos democrática.
Ora, durante 15 anos este grupo usou e abusou da prerrogativa de escolher jurados e ganhadores. Excluindo enorme parcela da classe teatral da possibilidade de vencer o edital, ou de maneira indireta obrigando-os a se associarem.
Não satisfeitos com isso, decidiram usar de qualquer forma de intimidação e pressão. Ameaças, acusações covardes e, pior, difamação. Juntaram uma série de acusações muito graves e falsas para formalizar denúncia no Ministério Público. Naturalmente o MP, ao receber tais acusações, é obrigado a abrir investigação. Aberta a investigação (que não caracteriza uma suspeição), tal fato é divulgado imediatamente.
Lamento que esta Folha de S.Paulo, em reportagem publicada em 19/9, opte por repercutir uma investigação de suposto “lobby na secretaria em edital” —quando justamente o que se faz atualmente é acabar com o monopólio descrito acima—, e deixe de mencionar um parecer do Ministério Público, ao qual a reportagem teve acesso, e que é favorável à Secretaria quanto ao sistema de votação.
Diz o procurador: “Forçoso concluir, portanto, que no presente caso não restou configurada a alegada lesão ao direito líquido e certo sustentado pela impetrante”. Cabe ainda manifestação do juiz, mas fica bastante evidente a correção da medida.
A repórter diz que uma das acusações é de que outra instituição teria se “beneficiado das mudanças para aprovar projetos de seu interesse”. Como é possível se as mudanças se deram no edital em curso, suspenso por pedido de liminar feito pela antiga guilda?
Cabe destacar, ainda, que o presidente do sindicato que entrou com tal ação é também diretor da instituição que há anos se beneficia do monopólio. Sendo objeto ele de contestação judicial de sua eleição, pois não poderia o mesmo acumular os dois cargos.
Por fim, ao fato principal: a secretaria não deseja impedir que ninguém possa participar e vencer um edital. Mas é contra a situação anterior na qual um grupo decidia quem votava e quem ganhava.
Pergunto eu: se os projetos destes grupos são tão relevantes, por que precisam ter todos os jurados para poderem ser aprovados? Qual o medo de jurados neutros? Serão os projetos tão pouco relevantes que se não forem julgados por pessoas comprometidas com a causa não têm chance de serem contemplados?
Chega deste tempo de privatização do recurso público sob um discurso pseudo-democrático. Pela verdadeira democracia, que permita a diversidade e a variedade. Com todos podendo competir e vencer.
André Sturm é secretário municipal de Cultura
Sturm não respondeu à reportagem
Antes da publicação da reportagem “Ministério Público investiga suposto lobby no Fomento”, a Folha procurou a Secretaria Municipal de Cultura e informou o órgão do conteúdo do texto. Nem a pasta nem seu secretário responderam. Informaram que só se manifestariam após serem notificados pelo Ministério Público sobre o inquérito.