Às vésperas de eleição, Duterte coloca adversários políticos em lista antidrogas
Faltando dois meses para as eleições nas Filipinas, o presidente Rodrigo Duterte divulgou uma nova lista de pessoas que ele diz serem “narcopolíticos” e prometeu que seus três anos restantes na Presidência serão os mais sangrentos já vistos em sua guerra às drogas.
Divulgada na noite de quinta-feira (14), a lista inclui 46 políticos –33 prefeitos, oito vice-prefeitos, um ex-prefeito, um membro de um conselho provincial e três deputados. Muitas dos incluídos em listas semelhantes passadas acabaram mortos por policiais ou justiceiros.
Quase todos os nomes da lista são candidatos nas eleições de maio, quando os filipinos vão eleger seus senadores, deputados, prefeitos e outros políticos locais. Muitos são adversários de Duterte, que está novamente sendo acusado de fazer uso mortal da política para derrubar seus críticos.
“Quero deixar claro que meus anos remanescentes na Presidência serão os mais perigosos para quem trafica drogas”, disse Duterte na televisão nacional, falando em sua cidade natal, Davao, no sul do país, onde divulgou a lista.
O presidente disse que os envolvidos no tráfico “ostentam suas alegrias e felicidade” nas redes sociais enquanto os cidadãos comuns sofrem na pobreza e dependência de drogas.
“A decisão de desmascarar estas personalidades do tráfico se deve à minha confiança nas agências governamentais que checaram e confirmaram a lista do narcotráfico”, disse Duterte, destacando que desde ser eleito para a Presidência, em 2016, ele se “comprometeu a erradicar o problema das drogas”.
O Departamento do Interior já abriu processos administrativos contra os políticos que ele identificou, e o Conselho de Combate à Lavagem de Dinheiro e a comissão governamental de combate à corrupção vão ajudar a rastrear bens obtidos por meios ilegais.
Mas, embora Duterte tenha dito que a lista é composta de nomes já checados, ele não confirmou se já foram abertos processos criminais formais contra os citados.
Ele disse que entre os nomes da lista estão pessoas ligadas a Proceso Alcala, que foi ministro da Agricultura no governo do ex-presidente Benigno Aquino III. Duterte acusa essas pessoas de serem traficantes. Não foi possível obter declarações de Aquino ou Alcala.
Mas Duterte insistiu que a nova lista não tem relação alguma com política.
“Não me importa se ela é divulgada antes ou depois das eleições”, disse o presidente. “Não tenho a menor intenção de prejudicar ninguém nem de impedir a eleição de determinado homem que queira servir ao público.”
Pouco depois de chegar à Presidência, Duterte divulgou a primeira de sua lista de traficantes, acusando 150 juízes, prefeitos, membros da polícia e oficiais militares de envolvimento com o narcotráfico.
Ele nunca explicou como formulou a lista, e seus assessores disseram que o presidente tinha suas fontes próprias. Muitas das pessoas que constavam da lista original foram assassinadas, incluindo cerca de uma dúzia de prefeitos e vários vice-prefeitos. A maioria foi abatida em enfrentamentos com a polícia ou por atiradores pró-governo.
Entre os mortos estava um prefeito que já havia se rendido, mas foi fuzilado por policiais que invadiram sua cela de prisão. Dois prefeitos foram mortos a tiros em julho do ano passado em dias consecutivos.
Um deles, Antonio Halili, de Tanuan City, 65 quilômetros ao sul de Manila, foi fuzilado por um atirador durante uma cerimônia de hasteamento da bandeira.
Mais de 5.000 pessoas já foram mortas na guerra de Duterte às drogas, além de possivelmente milhares mais cuja morte não teria sido informada às autoridades. Quase todas morreram em circunstâncias semelhantes. Normalmente a polícia alega que a pessoa puxou uma arma, desencadeando uma troca de tiros fatal.
O deputado Vicente Veloso, da região central do país, foi citado pelo presidente e disse na sexta-feira que vai processar o governo por incluí-lo na lista. Disse que a lista de nomes não foi verificada plenamente e pediu uma investigação.
“Vou falar sem meias palavras: isto é política”, disse Veloso, ex-juiz, em uma rádio local. Ele destacou que não tem divergências com Duterte.
O advogado e ex-deputado Neri Colmenares, hoje candidato ao Senado, acusou o presidente de divulgar a lista para amedrontar seus adversários políticos.
Colmenares integra um grupo de advogados que representam os familiares de várias pessoas mortas na guerra às drogas.
Para ele, “o governo deveria mover ações criminais para que as pessoas que constam da lista sejam presas. Mas expor a lista publicamente, mesmo que as evidências sejam tênues, só serve para avisar os culpados reais e dificulta a coleta de provas.”
A Igreja Católica também critica a guerra do presidente às drogas. Vários bispos vieram a público recentemente para dizer que receberam ameaças de morte de origem desconhecida. No passado Duterte pediu à polícia que proteja os clérigos, mas na quinta-feira ele disse que não se importa se eles morrerem.
“Na verdade vocês deveriam ser fuzilados”, ele disse, usando um epíteto para aludir aos bispos.
Carlos Conde, pesquisador da Human Rights Watch nas Filipinas, disse na sexta-feira que as palavras raivosas do presidente são “uma tentativa revoltante de influenciar as eleições locais que terão lugar em maio”.
“Mais criticamente ainda, é uma verdadeira lista de alvos em sua guerra às drogas, já que políticos passados acusados de envolvimento com o tráfico muitas vezes acabaram baleados pela polícia”, ele disse, acrescentando que as pessoas citadas na lista foram privadas do direito a um processo legal justo e à presunção de inocência.
“Esta utilização da guerra às drogas para abater políticos solapa ainda mais o Estado de Direito, a democracia e as liberdades civis nas Filipinas”, ele disse.
Tradução de Clara Allain