Sábio, Putin apostou mais na Copa do que em sua seleção
A eliminação da Rússia pode não ser o cenário dos sonhos de Vladimir Putin, mas não se pode dizer que o presidente russo tenha empregado muito prestígio pessoal na sua seleção.
O objetivo de Putin é que a Copa seja um exemplo de organização e capacidade da Rússia no momento em que o seu país está mais isolado politicamente do que nunca.
Na véspera da abertura, Putin disse em discurso na Fifa que esperava isso, e não uma boa campanha da seleção.
Só foi ao jogo de abertura da Copa, no qual a Rússia arrasou a Arábia Saudita por 5 a 0, porque o protocolo assim exigia. Mas a surpreendente jornada não passou despercebida. Putin ligou para o técnico russo para elogiar vitórias, e na sexta-feira (6) fez uma declaração de apoio contra a Croácia, nas quartas de final.
Não deu, mas até aqui o presidente está logrando atingir seus objetivos políticos.
A relação da Rússia com o Ocidente está em seu pior momento desde o fim da Guerra Fria. Ao se reunir na semana que vem com o americano Donald Trump, Putin poderá ou não começar a reverter isso.
A crise não é recente, mas tornou-se aguda neste ano, quando um ex-espião russo e sua filha foram envenenados em Salisbury (Inglaterra), em março. Ambos sobreviveram.
O contestado governo britânico de Theresa May identificou que o agente neurotóxico usado no ataque tinha origem na União Soviética, e com isso acusou o Estado russo pelo crime, que nega.
O embate subsequente levou à maior expulsão mútua de diplomatas da história. Países ocidentais, liderados pelo Reino Unido, expulsaram 154 russos. Moscou fez o mesmo com 189 estrangeiros.
Na semana passada, um casal que morava perto do local do incidente acusou sintomas de intoxicação pelo mesmo agente, aparentemente por acidente. Londres voltou a acusar Moscou. O caso coroou o afastamento da Rússia do Ocidente, um processo iniciado no fim dos anos 2000.
Putin percebeu a expansão ao leste da Otan, a aliança militar liderada pelos EUA, como uma forma de cercar estrategicamente a Rússia.
Promoveu uma guerra em favor de autonomistas pró-Rússia na Geórgia em 2008. Em 2014, quando um golpe derrubou o governo pró-Moscou na Ucrânia, fomentou um plebiscito pela separação e anexou a Crimeia.
Um ano depois, Putin interveio em favor da ditadura síria na guerra civil do país árabe, voltando ao status de potência no Oriente Médio.
Por tudo isso, o chanceler britânico, Boris Johnson, disse que a Copa era equivalente à Olimpíada de 1936, que serviu de vitrine para o regime nazista. É um despropósito histórico, mas dá a medida da percepção de Putin no exterior. Quem veio à Copa, por sinal, se diz surpreso com o que considera normalidade nas ruas russas.