Sócio de Witzel defende empresa fornecedora do estado

O ex-juiz Wilson Witzel (PSC), candidato ao governo do Rio de Janeiro, se tornou sócio durante a campanha eleitoral de um advogado do Espírito Santo que, no mesmo período, passou a atuar em favor de um grande fornecedor do estado.

O advogado Lucas Tristão, que há dois anos não tinha causas no Tribunal de Justiça fluminense, se tornou representante da Atrio Rio, uma das firmas ligadas à família do empresário Mário Peixoto, citado em delação premiada sobre propina no TCE (Tribunal de Contas do Estado).

Em agosto deste ano, quando a campanha eleitoral já estava em curso, Tristão propôs uma ação em nome da Atrio Rio contra a Secretaria Estadual de Educação. A empresa questiona o resultado de uma licitação na pasta.

Witzel afirmou em entrevista à Folha que se tornou sócio de Tristão durante a campanha —o mesmo ocorreu com outro escritório, o Medina Osório Advogados, no Rio de Janeiro. O ex-juiz disse também que auxiliou o novo sócio do Espírito Santo na ação movida contra o estado.

“Ele [Tristão] me apresentou a petição para que eu analisasse, se estava adequada. Entendi que estava e que haveria possibilidade de sucesso”, afirmou Witzel. A Justiça negou a liminar solicitada pela fornecedora.

A Atrio Rio está em nome de duas outras empresas, sendo uma delas de propriedade de filhos de Mário Peixoto. A firma recebeu desde 2007 cerca de R$ 450 milhões por serviços como limpeza, terceirização de mão de obras, entre outros serviços. Atualmente, tem contratos ativos com o Detran, Polícia Militar, Universidade da Zona Oeste e Cedae.

Peixoto foi citado na delação premiada do ex-presidente do TCE Jonas Lopes. Ele afirmou à Procuradoria que o empresário era um dos responsáveis por pagar uma mesada de R$ 200 mil aos conselheiros da corte entre 2012 e 2013.

Peixoto passou a ser um personagem do mundo político quando teve fotos e vídeo de seu casamento divulgadas pelo ex-governador Anthony Garotinho (PRP). A cerimônia num castelo na Itália reuniu políticos do MDB atualmente alvos de investigação sobre corrupção. É também sócio num empreendimento imobiliário do presidente afastado da Assembleia Legislativa, Jorge Picciani (MDB), que chegou a ser preso sob acusação de corrupção —está em prisão domiciliar.

Witzel tem usado sua atuação como advogado este ano para justificar a origem dos recursos que doou para a própria campanha. Ele declarou uma autocontribuição de R$ 215 mil, ainda que tenha informado à Justiça Eleitoral não ter qualquer conta bancária. O candidato do PSC afirma que o dinheiro veio de honorários e luvas pela entrada nos dois escritórios recebidos durante o período eleitoral.

Ele deixou a magistratura em março deste ano para concorrer ao cargo. Além dos dois escritórios de que se tornou sócio, Witzel é advogado do PSC e prestou consultoria no período.

Até 2016, a única ação de Tristão no TJ fluminense referia-se a dívidas de IPTU do próprio Witzel, datadas de 2008. Na Justiça Federal do Rio de Janeiro, atuava apenas em ações em cidades do Sul Fluminense.

Há dois anos, assumiu dois processos. No ano seguinte, quando já circulava no meio político ao lado do ex-juiz, assumiu duas causas tributárias contra o estado.

Este ano, além da Atrio Rio, Tristão assumiu a defesa da Industec Comercial e Serviços num processo contra o município de Resende. Neste caso, Witzel também tem procuração para atuar.

Tristão foi um dos coordenadores da campanha do candidato do PSC no primeiro turno. No segundo, foi afastado após o ex-juiz passar a ser questionado sobre supostas relações com Mário Peixoto.

Ao longo de seu mandato, o ex-governador Sérgio Cabral foi criticado porque o escritório de sua mulher, Adriana Ancelmo, havia sido contratado por diversos fornecedores do estado. A ex-primeira-dama já foi condenada por ter, para a Justiça, recebido propina por meio de sua banca de advocacia. Ela nega ter usado sua firma para obter dinheiro ilegal.

COMPARAÇÃO COM ADRIANA ANCELMO ‘É ESDRÚXULA’

Witzel afirmou em entrevista que a comparação com o caso de Ancelmo “é esdrúxula”. “A ex-primeira-dama fez o exame da ordem e mais nada. Eu sou um profissional gabaritado”, afirmou ele.

O ex-juiz negou que clientes possam procurá-lo em busca de interesses no seu futuro governo, caso seja eleito.

“Em hipótese alguma. São ações judiciais. Depende do meu talento profissional. Sou um bom advogado”, disse Witzel. 

O candidato do PSC afirmou também não ver conflito de interesse ao atuar contra o estado que pretende governar.

“Não sou governador. Está escrito em algum lugar que não posso atuar contra o estado? Qualquer coisa que o estado esteja fazendo errado, sou o primeiro a falar. Se tiver que advogar contra o estado até 31 de dezembro, vou advogar. Não vou compactuar com erros”, disse ele.

Ele declarou que vai se afastar dos escritórios em 31 de dezembro, caso seja eleito.

A Átrio afirmou, em nota, que “contrata escritórios externos sempre que tem necessidade”. “A escolha do escritório em questão se deu por sua especialização na área de direito público”, afirmou a empresa.

O empresário Mario Peixoto disse “que nunca esteve com o sr Jonas Lopes, e lembra que, na delação,  o próprio Jonas admite não ter provas do que diz”.

A Folha não conseguiu contato com o advogado Lucas Tristão. O telefone de seu escritório não atende e não houve resposta a e-mail enviado pela reportagem.

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