São as eleições

A emenda constitucional que congelou gastos públicos, permitindo só aumentos não superiores à inflação, aprovada em dezembro de 2016, foi comemorada e elogiada na época quase pela unanimidade dos observadores da cena econômica.

A imposição de limite para os gastos é medida saudável para impedir o crescimento incontrolável do endividamento dos governos, nos três níveis.

Também elogiei a emenda, mas com uma ressalva importante: ela poderia refrear mais os investimentos públicos e menos os gastos correntes. Por trás dessa ressalva estava a percepção de que a austeridade fiscal não tem, por si só, cacife para promover o crescimento. Depende de como os governos administram os recursos disponíveis, dentro dos limites legais e constitucionais.

 

Um ano e meio após a aprovação do teto de gastos, as piores previsões estão se confirmando. Dados revelados por estudos feitos na Fundação Getulio Vargas mostram que os índices de investimento público no ano passado foram os menores no país desde 1947.

Nem com reza brava o Brasil poderia ter retomado o crescimento sustentável nessas condições --a expansão do PIB em 2018, que foi prevista em até 4% há um ano, já está hoje reduzida para mísero 1,6%.

O investimento público em setores básicos e de infraestrutura é fator decisivo para induzir o crescimento de toda e qualquer economia. É fácil entender: quando o governo anuncia o investimento em um novo terminal portuário, por exemplo, sozinho ou em parceria com a iniciativa privada, outros investimentos são disparados por empresas que virão a se instalar nas proximidades com vistas a produzir para a exportação ou receber importações. Ou seja, o governo faz o papel de indutor do desenvolvimento, que vai criar empregos.

A experiência histórica mostra que a austeridade fiscal, necessária e indispensável, não leva automaticamente à expansão da economia. Se não houver ao mesmo tempo medidas estimuladoras do crescimento, a austeridade só fará efeito depois de deixar milhões de vítimas pelo caminho, sem emprego, sem os bens adquiridos com o duro trabalho ao longo de anos e com a desintegração de suas famílias.

Há anos batemos nessa tecla de que a prioridade número um do país deve ser a promoção de crescimento com criação de empregos. Espanta a frieza de autoridades públicas e formadores de opinião, que pouco se lixam com essa causa e simplesmente chamam de populistas aqueles que tentam sensibilizar a nação para a gravidade do problema.

Engana-se quem acha que as próximas eleições serão um embate entre centro, direita e esquerda. O confronto se dará entre dois grupos de brasileiros que nada têm a ver com ideologias políticas.

De um lado, os que olham com cruel frieza para o problema do crescimento e do emprego e defendem a ideia de que o mercado vai solucioná-lo mais cedo ou mais tarde --ainda que não tenham a coragem de admitir isso com todas as letras.

De outro lado, os que se revoltam contra essa crueldade e defendem, ao lado da austeridade e do ajuste fiscal, a adoção de medidas urgentes, como o investimento público (entre muitas outras), para minorar o peso da crise sobre aqueles que mais sofrem com ela.

Talvez o Brasil precise de um VAR (árbitro assistente de vídeo, na sigla em inglês), semelhante ao usado na Copa. Um mecanismo para corrigir decisões erradas, porque muitas delas, aplaudidas e comemoradas em um primeiro momento, acabam tendo o efeito oposto ao desejado no médio e longo prazo.

Na verdade, esse mecanismo já existe, mas precisa ser mais bem usado: são as eleições.

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