São Paulo ganharia R$ 500 mi ao ano com nova gestão alimentar

Capital financeira, cidade mais populosa e principal polo gastronômico do país, São Paulo desperdiça recursos, ataca o meio ambiente e impede que seus habitantes tenham dieta saudável por manter uma economia linear do setor de alimentos. 

Um redesenho do sistema traria benefícios anuais de mais R$ 500 milhões, mais saúde aos moradores, protegeria o meio ambiente e reforçaria a posição de capital gastronômica. 

A adoção de boas práticas na agricultura, na distribuição de alimentos e no tratamento de resíduos também ajudaria a evitar 342 mil toneladas de emissões de gases de efeito estufa e economizaria o consumo de 46 milhões metros cúbicos de água doce anualmente.

Essas são conclusões do estudo Cidades e Economia Circular dos Alimentos, da Ellen MacArthur Foundation, lançado durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos. 

Segundo o relatório, para cada dólar gasto em alimentos, são gerados dois dólares de custos ambientais, econômicos e de saúde. Os impactos negativos somam US$ 5,7 trilhões por ano,  com prejuízos causados com obesidade e desnutrição.  

O estudo propõe um redesenho da indústria de alimentos global e aponta benefício de US$ 2,7 trilhões.
Por entender que as centros urbanos têm papel fundamental - 80% dos alimentos serão consumidos nelas até 2050 - a fundação escolheu quatro cidades para detalhar mais profundamente o sistema alimentar:  São Paulo, Bruxelas (Bélgica), Guelph (Canadá) e Porto (Portugal).

Segundo o estudo, muitos dos desafios de São Paulo são ligados ao crescimento urbano acelerado, que criou desertos alimentares, locais onde as populações têm acesso limitado a alimentos saudáveis. 
Para a mudança de sistema, os agricultores familiares urbanos desempenhariam papel central, na regeneração das áreas verdes. 

Com produção local e distribuída, os alimentos saudáveis se tornariam mais acessíveis e os desertos alimentares deixariam de existir. Os resíduos orgânicos seriam coletados e se tornariam nutrientes para a agricultura. Seu desvio dos aterros, além da economia financeira, daria vida mais longa a esses locais. 

Segundo Luísa Santiago, líder da Ellen MacArthur Foundation Brasil, para implementar as diretrizes do estudo, a fundação pretende conectar varejistas de grande impacto, possivelmente de atuação global, distribuidores, processadores de alimentos e poder público. Esses operadores se comprometeriam a fazer mudanças em suas práticas. 

A fundação abriu inscrições para cidades que queiram se candidatar ao posto de pioneiras, para testar as diretrizes do estudo de forma assistida. Até 1 de maio, cidades com mais de 500 mil habitantes da América Latina, do Norte ou da Europa podem se inscrever.

As cidades selecionadas terão acompanhamento da fundação e de seus parceiros para fazer o redesenho de seus sistemas alimentares ao longo dos próximos três anos. 

AGROECOLOGIA URBANA

São Paulo tem bons exemplos de agricultura regenerativa, sem agrotóxico, com rodízio de cultura, organizadas na AAZL, Associação de Agricultores da Zona Leste. O grupo tem 14 hortas e cerca de 30 agricultores em Guaianases, Cidade Tiradentes, São Miguel Paulista e São Mateus.

Nesses locais, instalados em terrenos usados por distribuidoras de energia e da Sabesp, são cultivados alface, escarola, beterraba, couve-flor, brócolis e a produção é comercializada localmente. 

Seis das hortas têm certificação social de produção orgânica. A produção vai para feiras do Tatuapé, Itaquera e São Miguel. Quatro das hortas estão em processo de transição para a agroecologia.

É numa fração de terreno de linhão de energia elétrica em São Mateus que Sebastiana Helena de Farias, 68, cultiva a sua horta. Pernambucana radicada em São Paulo há 45 anos, ela começou a cultivar há 10 anos, aprendeu a manejar a horta em programas da prefeitura e do instituto Kairós e hoje retira R$ 500 por mês, na venda para moradores da região. 

A agricultora paga um funcionário que a companha diariamente, das 7h00 às 16h30, e um ajudante que fica duas vezes por semana.
 

Sebastiana é representativa da atividade na região. Segundo a psicóloga Regiane Nigro, 41, que atua como voluntária na AAZL, as mulheres são maioria entre nas hortas da zona leste e a faixa etária das agricultoras urbanas é de 50 a 70 anos.

"Muitas dessas mulheres nasceram na roça, vieram para o centro urbano, tiveram outras profissões e depois começaram a plantar para consumo. Passaram a doar alimentos para vizinhos e então iniciaram produção para venda", diz Regiane.

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