STF usou caminho que só ele enxerga como legal para proibir destruição de mensagens
Foram dois os caminhos pelos quais o STF frustrou a eventual destruição das mensagens que vêm sendo divulgadas pelo Intercept Brasil e outros veículos, como a Folha.
No inquérito das fake news, um procedimento cuja legalidade só o tribunal enxerga, o ministro Alexandre de Moraes requisitou cópias do inquérito da Operação Spoofing e de “todo material apreendido”.
Prorrogou ainda a duração da investigação no STF: serão mais 180 dias de recursos gastos coletando provas que não podem fundamentar ação ou condenação futuras, pois colhidas em procedimento baseado em dispositivo regimental impertinente, com relator escolhido a dedo.
Irônico o tribunal extrapolar funções judiciais para resguardar provas contra os ímpetos do ex-juiz que extrapolou funções judiciais.
Horas antes, uma liminar havia sido concedida pelo ministro Luiz Fux na ADPF 605. A ação foi ajuizada para impedir que o ministro Sergio Moro desse fim naquelas provas.
Relembrando: Moro avisara que destruiria o material apreendido com os hackers. Com isso, deu pistas de que teve acesso a investigação sigilosa, que apura fatos que põem em dúvida sua conduta judicial.
Ainda, ensaiou intervenção imprópria do Poder Executivo no inquérito. Nos tempos da boa e velha 13a Vara Federal de Curitiba, coisas assim renderiam condução coercitiva, prisão preventiva e ação penal por “obstrução à Justiça”.
A inicial da ADPF pedia que se impedisse a ação de Moro, pois a decisão de destruir o material apreendido cabe ao Judiciário. Fux foi além: resguardou o material contra quem quer que fosse —inclusive o juízo competente. Até quando? “Até o julgamento final desta causa”, a ADPF 605. Isso será, bem sabemos, quando ele quiser. No STF, cada ministro é senhor individual e absoluto do tempo.
Fux é textualmente citado nas mensagens vazadas. “In Fux we trust” não sugere patente ilegalidade sua, mas aguça dúvidas pertinentes. Se quem atua perante o STF é a PGR, por que Fux e Deltan tiveram múltiplas interações sobre o caso (“conversei com o ministro mais uma vez”)? Por que em segredo (“reservadamente”)? No que consistiria o “conte comigo”, que o procurador diz ter ouvido do ministro?
O escândalo com a tal conversa talvez seja tempestade em copo d’água. Talvez não. É saudável a precaução em relação a um magistrado cujo alarme ético não apitou ao reunir-se com réus a quem julgaria na Ação Penal 470 (Mensalão) para pedir vaga no tribunal, como ele próprio confirmou a Mônica Bergamo.
Fux negou as conversas relatadas por Deltan.
Se ocorreram com aquele teor, são desgastantes para a imagem de um Poder cuja imparcialidade está sob escrutínio da opinião pública. “Conte comigo” é um afago que juízes não devem distribuir.
Mas, mesmo que o papo não tenha ocorrido, o comprometimento de Fux permanece: como acreditar na imparcialidade decisória do ministro em um caso que interessa a Deltan se, a crer na negativa, sua integridade terá sido falsamente conspurcada pelo procurador?
As provas devem ser preservadas, é certo. A matéria pode ser conhecida pelo STF, é certo também. Mas não em um inquérito ilegal; e não com protagonismo de um ministro nominalmente vinculado a condutas questionáveis por alguém interessado no desfecho da ação por ele relatada.
O tribunal errou acertando, ou acertou errando. Eis um luxo a que o STF não pode ser dar. Celso de Mello disse bem: mais do que nunca, precisamos do Supremo em plena forma.