Troco hino nacional por merenda em bom estado

Assistimos, nesta semana, a mais uma chanchada dos figurantes de “Chaves” ora instalados nos palácios brasilienses. O ministro da Educação propôs, numa carta endereçada a diretores de escolas públicas, que os alunos fossem filmados cantando o hino nacional.

A presepada animou um pouco a já cansada troca de ofensas virtuais entre simpatizantes e detratores do governo. Bolsonaristas ainda aguerridos dizem que “vai ter hino, sim” e que “quem reclamar vai ajoelhar no milho”.

Bonito.

Desculpe o palpite extravagante, mas não resisto. Que tal se o ministro se preocupasse com questões um pouco mais relevantes? A merenda escolar, por exemplo.

Aparentemente, as diretrizes da administração atual vão no sentido contrário. Tenta-se emplacar, em escala nacional, algum tipo de plano de educação à distância para crianças. Hectares a perder de vista de terreno fértil para a doutrinação.

E, não menos importante, sem merenda. O Telecurso 2019 exime o aparato estatal de alimentar a garotada. Imagina o quanto vão economizar? Vai dar para colocar um cabo e um soldado de plantão em cada escola que sobrar neste Brasilzão.

O nostálgicos dos anos de chumbo fingem ignorar que o regime militar –seu norte de retidão– foi quem começou o desmonte do ensino público de qualidade para crianças e adolescentes.

Sou de 1970, ano do frisson canarinho. Minhas duas irmãs, mais velhas, cursaram todo o ciclo básico em escola municipal. O que tinha de melhor. Depois saíram para um colégio de elite, privilegiadas que eram.

Eu, para usar metáfora culinária, peguei a última raspa do tacho. Minha mãe era diretora de um “parque infantil” –assim chamávamos na época as EMEIs. Fiquei por lá até os 6 anos.

A funcionária favorita era Cida, a cozinheira. Ela nos servia o básico dos básicos: macarrão com salsicha, ovo cozido, carne moída. Tonto, eu invejava os amiguinhos que precisavam levar lancheira para a escola.

A entrada no esquema particular foi traumática. As tais lancheiras continham pasta de atum, bebidas artificiais de cores berrantes e coisas indecifráveis. Tudo bem, legal mesmo era comprar a merenda na cantina.

A cantina vendia hambúrguer seboso e uma coleção de porcarias industriais. O pior era a bebida, refrigerante quente adquirido numa portinha ao lado. O engradado de Coca-Cola era de madeira, crianças!

Hoje, a escola do meu filho segue o manual do bom-moço-zona-oeste: frutas, fibras e nada de chocolate na lancheira. Já a merenda do sistema público virou lavanderia de dinheiro, fora uma ou outra boa iniciativa.

O assunto desinteressa ao circo federal. Ainda bem, pensando bem: tristes as crianças que recebessem pão com leite condensado no recreio.

 

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