É adequado o formato reduzido do questionário do Censo 2020? NÃO
O Censo é a única oportunidade, por década, que o poder público tem —por meio de uma organização admirada e confiável, o IBGE— de visitar cada habitação no Brasil, da mansão ao mocambo, do flat à cela de prisão, percorrendo nosso imenso território para contar quantos somos, como somos, onde e como vivemos.
Imagine que você será o gestor ou gestora do Censo 2020. Você comandará um exército de recenseadores (cerca de 180 mil), em geral jovens adultos, muitos tendo a sua primeira chance de emprego. Eles serão treinados para ir de porta em porta, Brasil afora —serão mais de 71 milhões de portas— e convencer o residente a responder ao questionário geral do Censo, com cerca de 28 perguntas, as essenciais.
Mas você pensará: esta é a chance de saber mais, como estamos em saúde, em educação, em saneamento, em transporte. São dados vitais para o planejamento público em cada município e estado brasileiros; e também na gestão comercial das empresas. O Legislativo e o Judiciário dependem do Censo para deliberar, e a repartição dos impostos é feita com base nesses dados.
Por essas boas razões, o IBGE aplica, de modo salteado, outro questionário, mais detalhado. É neste segundo que mora o debate. Você faria mais perguntas para aproveitar a visita? A questão não está no número de perguntas, tanto quanto no tempo gasto para fazê-las e obter resposta. Está na clareza e objetividade do que é perguntado. O entrevistado tem pressa. O recenseador também. O IBGE deve calibrar os dois questionários, o curto e o longo, para serem diretos, fáceis de entender e com o máximo de coleta de informações. O custo de se chegar até o entrevistado justifica o esforço. E o Brasil agradece.
O Censo 2020 custará pouco mais de R$ 2,6 bilhões. Soa muito. Mas basta multiplicar os salários de 180 mil colaboradores, por dois meses, que chegaremos perto de R$ 2,2 bilhões. Depois vêm informática, veículos, processamentos etc. Haveria modo mais econômico de saber, com precisão, sobre a realidade brasileira? A resposta é não.
No futuro, os meios digitais poderão ajudar a economizar visitas presenciais, sola de sapato e saliva. Por enquanto, não somos a Holanda. Somos milhões sem habilidade para autopreencher um questionário. Simples assim. O Censo no Brasil é do jeito que é porque o IBGE já pesquisou e comparou com técnicas usadas em outros países, trocou experiências com institutos, associações civis e governos para chegar a soluções eficientes de como levantar e processar tamanha massa de dados.
Não há improvisação no Censo. Há planejamento, detalhado e sofisticado, para nada dar errado na imensa operação. Custa caro? Sim. Mas não chega a 1% do juro anual que pagamos pela dívida pública. E só acontece a cada dez anos.
A verdade é que, no Brasil, o Censo ainda sai barato para o contribuinte. Censo é investimento, que se paga porque suas informações ajudam o governo e a sociedade a tornar mais eficientes todos os demais gastos. Nos EUA, onde também rodarão um Censo em 2020, bem semelhante ao nosso, a “conta” passará de R$ 50 bilhões. Dá para acreditar nesse custo? Nosso Censo custará apenas uma beirada, 5% do americano.
Quem sabe nosso ministro da Economia e o futuro embaixador nos EUA, que são craques, poderiam oferecer uma consultoria técnica do IBGE ao bureau do Censo americano? Com a tecnologia brasileira empregada lá, a economia de custo para eles nos pagaria o valor integral do Censo aqui. Fica a sugestão de mais uma bela exportação de serviços para nossa operosa equipe de governo.
Colaborou Roberto Olinto Ramos, ex-presidente do IBGE (jun.2017-jan.19)