Doria manobra para destituir superintendente do Sebrae de SP ligado a Márcio França
A tentativa do governador João Doria (PSDB) de colocar um nome ligado à sua gestão como superintendente do Sebrae de São Paulo, entidade do Sistema S com R$ 1 bilhão em caixa, criou indisposição dentro do órgão e parou na Justiça.
Isso porque o atual superintendente, Luis Sobral, foi eleito internamente ao cargo no ano passado com um mandato que duraria até 2022.
A insatisfação de Doria tem motivo: Sobral foi indicado em uma articulação do ex-governador Márcio França (PSB) com o presidente da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo), Paulo Skaf (MDB), adversários do tucano no pleito de 2018.
Para substituir o superintendente, Doria convidou o ex-secretário de Desestatização da capital Wilson Poit. Com o apoio do governador, o conselho do Sebrae prevê destituir ad nutum (de forma imotivada) o atual superintendente e votar uma nova chapa à diretoria com Poit à frente.
Formalmente, a iniciativa partiu dos três conselheiros que o Sebrae tem ligados ao governo —ao todo, o conselho deliberativo tem 13 membros. A mudança, prevista para ser chancelada nesta terça (30), tem sido considerada por pessoas ligadas a Sobral como uma manobra do governo dentro da entidade.
O advogado do superintendente, Ricardo Penteado, entrou com um pedido de liminar (decisão provisória e urgente) na sexta (26) para que a demissão de Sobral não ocorra. Em suas argumentações, afirmou que a legislação não permite demissão ad nutum de diretores do Sebrae, embora a possibilidade conste no estatuto da entidade.
"O superintendente foi eleito em dezembro. Em janeiro, entra um novo governador do estado e, não por acaso, os três representantes do estado pedem a cabeça dele. Não por acaso, o indicado para substituí-lo é Wilson Poit, que foi secretário do governador enquanto ele era prefeito", disse Penteado.
O pedido na Justiça tem precedentes. Outros superintendentes que sofreram tentativas de demissão no meio do mandato ganharam liminares que protocolaram em juízo. É o caso de Fernando Leça (em 2001) e Bruno Caetano (em 2018).
No entanto, a ação de Sobral, anterior à decisão do conselho, acabou negada na tarde desta segunda (29) pela juíza Celina Dietrich e Trigueiros, da 15ª Vara Cível.
Segundo ela, além de existir a previsão no estatuto, a defesa de Sobral pretende inviabilizar a assembleia do conselho "com base em mera suspeita de que será destituído de seu cargo". "Não se há de proferir decisão condicional baseada em suposição", diz a magistrada.
A Superintendência do Sebrae-SP, que é o serviço de apoio às micros e pequenas empresas, é uma das três diretorias —a principal— do órgão.
Além das diretorias, a entidade tem um conselho deliberativo com integrantes dos setores que a representam: as federações da indústria, agricultura e comércio, bancos e o governo estadual (a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, o Desenvolve SP e o IPT, Instituto de Pesquisas Tecnológicas).
Atualmente, o presidente do conselho é Tirso Meirelles, da Faesp, a federação da agricultura.
Ano passado, a eleição de Sobral já foi recheada de polêmicas. Normalmente, é o governador eleito quem indica o futuro superintendente, mas o próprio Márcio França, que não havia sido reeleito, fez a indicação.
Ele e Skaf agiram numa tentativa de minar espaço do governo Doria no Sebrae. O tucano, no entanto, articulou para colocar um aliado na superintendência após assumir o mandato.
Uma das insatisfações de setores do governo nesses quatro meses da gestão Sobral foi o fim do programa Juro Zero, operado pela Desenvolve SP, que financiava microempresários. A decisão foi entendida como um afastamento das relações entre o Sebrae e o governo paulista.
Do outro lado, funcionários do Sebrae-SP afirmam que a eventual destituição criou um clima interno de insegurança. Eles temem que a previsão de troca, por decisão política, de uma gestão que mal começou prejudique a imagem do serviço num momento em que o Sistema S já tem sido contestado nacionalmente.
“Eu recebi um convite do governador João Doria”, disse Wilson Poit, o indicado do governador, à Folha. “Fui convidado para fazer parte da diretoria do Sebrae, o que está alinhado com meu propósito de vida, de inspirar empreendedores. Não tenho conhecimento da situação do Sobral”, diz.
"Me parece que sempre foi o governador que indicou o superintendente. Isso é praxe em todos os governos e aconteceu com o novo governo."
No plano nacional, também houve uma destituição na presidência do Sebrae para que alguém mais alinhado ao governo fosse colocado.
O presidente da entidade, João Henrique Sousa, foi substituído pelo ex-deputado Carlos Melles (DEM-MG). A troca foi patrocinada pelo ministro Paulo Guedes (Economia).
Procurado, o Sebrae afirma que "irá se manifestar oportunamente".
Sobral diz que aguarda a decisão do conselho. "Ainda confio no discernimento das federações e do conselho, como também do direito. Não quero me antecipar, mas uma decisão dessas pode repercutir nos outros estados e transformar os superintendentes em reféns dos governos", diz.
Também procurado, o governo afirmou que não interfere no Sebrae e respeita a autonomia da entidade.