Fica, Tite!
Completam-se 17 dias da eliminação do Brasil ante a Bélgica na Copa do Mundo da Rússia.
Tempo suficiente para a cura da ressaca, para a redução da decepção, para a aceitação de que o hexa não era para vir agora.
E para uma reflexão sobre o trabalho do técnico Tite na seleção brasileira.
Há pouco mais de dois anos, fiz um apelo: que Tite, apesar das críticas até então feitas por ele à Confederação Brasileira de Futebol, aceitasse o convite para substituir Dunga, demitido depois do fiasco na Copa América Centenário.
A explicação era simples: tem que estar no comando o melhor treinador.
No universo de treinadores brasileiros, Tite era esse cara.
E, hoje, Tite ainda é. Com sobras. (Não temos um Guardiola.)
Assim, desta vez não faço um apelo, mas um singelo pedido: fica, Tite!
Por que, questionará o leitor, se ele falhou na Copa?
Espere. Falhou mesmo?
Tite jamais garantiu que a seleção ergueria a taça. Nunca assegurou que a cada partida a seleção sairia vencedora. Pois sabe que no futebol nem sempre o melhor vence.
Ele prometeu desempenho, esforço, dedicação e comprometimento dos atletas jogo a jogo. E é inegável que isso foi visto.
Também recuperou a autoestima perdida pela equipe e pela torcida na segunda era Dunga.
Em 26 partidas sob a tutela de Tite, o Brasil ganhou 20, empatou quatro e perdeu só duas, sempre por desvantagem mínima – 1 a 0 para a Argentina, em amistoso, e 2 a 1 para a Bélgica nas quartas de final do Mundial.
Foram 55 gols marcados (média de 2,1 por partida), somente sete sofridos (0,3 por jogo), sendo que dois deles foram contra, um de Marquinhos, outro, comprometedor, de Fernandinho.
Desses 26 confrontos, nove (35%, ou um a cada três) o Brasil venceu de goleada, estando entre esses rivais os bicampeões do mundo Argentina (3 a 0) e Uruguai (4 a 1), e o Chile (3 a 0), atual bicampeão da Copa América.
Ainda ganhou da Alemanha (1 a 0), atuando em Berlim, no primeiro duelo entre as equipes principais dos países depois do 7 a 1 na semifinal da Copa de 2014.
(Em 2016, nos Jogos do Rio, os times olímpicos de Brasil e Alemanha se enfrentaram na final, e o Brasil ganhou nos pênaltis – o técnico era Rogério Micale.)
Com Tite, a seleção não tomou gol em 19 partidas (73%, ou três em cada quatro) e fez pelos menos um gol em 23 delas (88%). Só deixou de balançar as redes contra Argentina (0 a 1), Bolívia (0 a 0) e Inglaterra (0 a 0).
Mais importante que os números, o Brasil voltou a ser respeitado, eu digo até temido, pela maioria dos adversários.
O time, via de regra, jogava bem, com pouquíssimos repentes de instabilidade. Nos jogos, posso afirmar sem necessidade de cronometrar, a seleção era quase sempre dona das ações, ameaçava sem ser ameaçada.
Mesmo nas partidas que o Brasil não venceu, houve visível domínio sobre o oponente.
Diante da Suíça (1 a 1), apesar do equilíbrio na posse de bola (52% a 48%), foram 20 tentativas ao gol de Sommer – os suíços arriscaram só quatro vezes.
É necessário também lembrar que no gol da Suíça houve falta; Zuber empurrou Miranda antes de cabecear.
Contra a Bélgica, falar que o técnico dos Diabos Vermelhos, Roberto Martínez, deu um banho tático em Tite é um exagero.
A mudança de posicionamento de De Bruyne, que atuou mais avançado, foi um ótimo movimento. Ponto. Nada de nó tático, longe disso.
Nesse jogo, o Brasil deu 26 arremates a gol e esteve 57% do tempo com a bola. Inspirado, o goleiro Courtois fechou o gol: fez oito defesas, ao menos uma dificílima. Os belgas ameaçaram Alisson um terço disso (oito finalizações).
No total, em cinco partidas na Copa, o Brasil finalizou 103 vezes, de acordo com dados da Fifa. Mais, só Croácia (115) e Bélgica (106), com dois jogos a mais cada uma.
Ou seja, oportunidade e vontade de fazer gol não faltaram – a bola ter entrado pouquíssimo, só oito vezes (menos de 8% de êxito), é um escancarado motivo para estudo e correção.
Como comparação, das 83 finalizações da campeã França, 12 (ou 15%) resultaram em gol. A anfitriã Rússia foi ainda melhor na pontaria: dez gols em 46 tentativas (22% de sucesso).
Enfim, Tite fez com seu esquema (de rápidas e precisas trocas de passes), aliado à capacidade do pé de obra (Marcelo, Paulinho, Philippe Coutinho, Neymar…), o Brasil criar, criar e criar.
Ele não tinha como entrar no campo para botar a bola pra dentro – função que cabia a Neymar, Coutinho, Willian e Gabriel Jesus, principalmente. Os dois últimos fizeram zero gol no Mundial.
Tite negocia a extensão de seu contrato com a CBF por mais quatro anos. A confederação tem interesse que ele continue.
Fiz contato neste domingo (21) com Gilmar Veloz, agente de Tite, que no momento do telefonema afirmou estar dentro de um avião e por isso inabilitado a conversar.
Pessoa próxima ao treinador de 57 anos considera ser boa a chance de uma continuidade, pois Tite simpatiza com a ideia de iniciar um ciclo de quatro anos, até a Copa do Qatar, com o benefício de não ter de começar do zero – já está com dois anos de estrada.
Como lhe foram dadas, segundo ele mesmo, totais liberdade e estrutura para trabalhar nesse período, Tite não teria, caso as mesmas condições sejam mantidas, razão para capitular.
A decisão deve ocorrer nesta semana e, para o bem geral da nação, espero que a resposta seja “sim”.
Em tempo: Tite ficando, uma exigência. Nada de Taison, dramática opção de banco na Copa (e que jamais saiu do banco), daqui pra frente. Há dezenas de nomes melhores para o ataque.