Governo une esforços para deportar imigrante que busca se legalizar nos EUA
Para muitos que buscam regularizar seu status nos EUA e obter o greencard depois de se casarem com americanos, a entrevista com o USCis, o serviço de imigração e cidadania americana, é crucial.
Nos últimos meses, porém, o agendamento tem sido antecedido por doses ainda maiores de nervosismo e apreensão, depois que começaram a surgir relatos de imigrantes que saíram da entrevista direto para a custódia do ICE, o departamento de Alfândega e Imigração.
De lá, esperam a deportação para seus países de origem —alguns já foram removidos.
É o que pode ocorrer com Lilian Pahola Calderón Jiménez, 30, que corre o risco de ser deportada para a Guatemala, de onde saiu aos três anos com os pais rumo aos EUA, pela fronteira com o México.
Desde os 15 anos, ela estava sujeita a uma ordem de remoção, depois que as autoridades americanas rejeitaram o pedido de asilo feito por seu pai. Em setembro de 2016, Lilian se casou com um americano, com quem tem dois filhos —um de 4 anos (nascido antes da formalização da união) e outro de um ano.
Dois meses depois, entrou com petição para regularizar a situação. Em 17 de janeiro de 2018, Lilian participou da entrevista no escritório do USCis em Johnston, Rhode Island.
Ao final do procedimento, porém, foi detida por agentes do ICE, com base na ordem de remoção de 2002. Ela agora aguarda o desenrolar do caso no centro de correção de Suffolk County, em Boston.
Lilian e outros quatro imigrantes são representados pela Aclu, organização de defesa dos direitos civis americanos que entrou com ação contra o Departamento de Segurança Doméstica, ao qual responde o ICE. As situações são as mesmas: eles receberam ordem de remoção e foram detidos enquanto buscavam regularizar seu status, depois de casarem com cidadãos dos EUA.
Só em Boston, segundo informações do ICE citadas pelo jornal “The Boston Globe”, 17 pessoas teriam sido detidas enquanto buscavam a cidadania por meio do casamento. Algumas delas, segundo a Aclu, já foram deportadas.
A organização apresenta ainda uma troca de emails entre funcionários do ICE e do USCis em que ambos debatem o calendário e sugerem espaçar as detenções para não chamar atenção da imprensa.
O USCis teria disponibilizado ao ICE uma lista de pessoas que entraram com pedido para regularizar a situação, e o departamento que fiscaliza as leis de imigração teria selecionado aquelas em que havia interesse de detenção.
A combinação de esforços das agências, apesar da publicidade negativa e de ter sido chamada de armadilha pela imprensa local, não pode ser considerada irregular, segundo especialistas ouvidos pela Folha.
Matthew Maiona, membro da Aila (associação americana de advogados de imigração), diz que o ICE pode deter imigrantes que se apresentam para uma entrevista com o USCis se houver uma ordem final de remoção ou uma condenação criminal contra eles.
“Um imigrante nessa situação poderia ser preso a qualquer hora —durante a entrevista, depois dela ou na rua”, afirma. “Imagino que o ICE esteja agora prendendo essas pessoas quando aparecem na entrevista por facilidade e conveniência.”
É a solução mais fácil, concorda Donald Kerwin, diretor-executivo do Center for Migration Studies. “É um uso ruim de recursos de fiscalização. Em vez de ir atrás de casos mais perigosos, eles vão atrás de pessoas que tentam legalizar seu status”, disse.
O efeito colateral mais provável da combinação de esforços é afugentar os ilegais que buscam regularizar a situação. “Essas pessoas ficam com medo de ser deportadas.”
Ele qualificou a política do governo Trump como um “projeto de deportação em massa”. “Eles não querem nem imigrantes ilegais nem imigrantes legais, não querem que essas pessoas obtenham o status regular. É um governo hostil a imigrantes legais.”
A analista política Sarah Pierce, do Migration Policy Institute, lembra que, mesmo que estejam tentando regularizar a situação, os imigrantes que receberam ordem de remoção estão submetidos às regras de imigração.
“Eu não diria que é uma boa política. Se eles têm base legal para regularizar o status, seria melhor deixá-los ficar no país e ajudar a economia”, diz.
Antes de Trump chegar à Casa Branca, era incomum que um imigrante fosse preso após a entrevista, afirma Jim Tom Haynes, do escritório Haynes Novick Immigration.
“Desde que ele assumiu a Presidência, eu deixei de preencher solicitações que exijam entrevista pessoal, porque sei que o cliente correria o risco de ser preso”, afirma.
Segundo Tom Haynes, se o imigrante casado com um americano não tiver contra si uma ordem de remoção, a probabilidade de detenção e deportação é baixa. “A não ser que o USCis tenha fortes suspeitas de que a união seja fraude”—algo que já era praxe.
O advogado afirma que a entrevista costuma ser marcada alguns meses após o casamento. Em Washington, por exemplo, a média é de 10 meses.