Guerra comercial entre EUA e China ganha força e mercados oscilam
A guerra comercial entre a China e os Estados Unidos registrou uma forte escalada na segunda-feira (13), quando Pequim anunciou que imporia tarifas a US$ 60 bilhões em produtos americanos, desafiando as ameaças de Donald Trump e causando uma onda de vendas nos mercados financeiros mundiais.
O Ministério das Finanças chinês anunciou que elevaria tarifas sobre bens que variam de gás natural liquefeito a espinafre congelado e creme dental, em resposta "ao unilateralismo e ao protecionismo comercial dos Estados Unidos" —adjetivos usados pelas autoridades chinesas à decisão do governo Trump, na sexta-feira, de elevar a 25% a tarifa incidente sobre US$ 200 bilhões em produtos chineses.
O governo Trump planejava revelar mais detalhes na segunda-feira sobre seu plano de impor tarifas de 25% a mais US$ 300 bilhões em produtos chineses —medida sinalizada na semana passada depois que as negociações comerciais entre representantes dos Estados Unidos e China, em Washington, não resultaram em acordo. No entanto, o presidente americano Donald Trump disse a repórteres na segunda-feira que ainda não havia decisão final sobre a nova rodada de tarifas.
Trump disse que retaliações eram esperadas, da parte de Pequim, e confirmou que se encontraria com o presidente da China, Xi Jinping, em uma conferência de cúpula do Grupo dos 20 no Japão, no mês que vem.
"Amo a posição em que estamos", ele disse a repórteres na Casa Branca, segunda-feira. "Acho que as coisas estão indo muito bem".
Anteriormente, na segunda-feira, Trump havia advertido a China contra novas retaliações. "A China não deveria retaliar —vai só piorar as coisas", tuitou Trump pouco antes do anúncio chinês, ameaçando Pequim de que a China "sofreria muito" se o conflito comercial continuasse. "Vocês tinham um ótimo acordo, quase concluído, & deram para trás!", escreveu.
As ações caíram em resposta à decisão chinesa, e os investidores correram para ativos mais seguros, entre os quais títulos de dívida pública. Todos os índices de mercado americanos caíram, com o S&P 500 mostrando baixa de 2,3% e o Nasdaq, no qual a tecnologia tem peso mais alto, mostrando 3,2% de queda no final da manhã, em Nova York. As ações internacionais caíram à sua posição mais baixa desde março, com o índice FTSE All World recuando em 1,8%, sua maior queda diária desde dezembro.
O aumento de tarifas anunciado por Pequim na segunda-feira vai prejudicar setores que variam da indústria pesada aos bens domiciliares. As ações da Apple registravam queda de 6% no final da manhã, e as da Caterpillar caíram em 5%.
"Empresas como a Apple e a Caterpillar têm exposição de receita considerável fora dos Estados Unidos —e ondas de vendas imediatas afetarão empresas desse tipo", disse Kristina Hooper, estrategista chefe de mercados mundiais na Invesco. "Não é uma história sobre um setor específico, e sim uma história sobre ações de alta capitalização".
No mercado, cresceram as expectativas de que o Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, reagisse com um corte nas taxas de juros. A probabilidade de um corte antes do final do ano, calculada com base nos preços futuros, era de 74%, ante 58% uma semana atrás. O título de dois anos do Tesouro dos Estados Unidos caiu em quase nove pontos básicos, para 2,18%, sua menor cotação desde fevereiro de 2018.
A tensão crescente derrubou a moeda chinesa, e as moedas de países de mercado emergente, em termos mais amplos, O yuan recuou em 0,9% diante do dólar nos mercados offshore, tendo caído abaixo da cotação de 6,90 yuan por dólar pela primeira vez este ano. O índice MSCI, que acompanha o câmbio das moedas emergentes, caiu em 0,7%, o que o coloca no caminho de seu maior recuo em 2019.
"O confronto agora se tornou uma batalha de testosterona entre dois líderes que acreditam ter muito a provar ao seu público. Mas quanto mais tempo durar essa exibição de força bruta, maior a probabilidade de uma recessão nos Estados Unidos, e talvez no mundo", disse Bernard Baumohl, do Economic Outlook Group, de Nova Jersey.
Pequim anunciou que 2.493 itens vindos dos Estados Unidos teriam sua tarifa elevada a 25% a partir de 1º de junho. Eles incluem gás natural liquefeito; produtos agrícolas como mel natural; compostos como sulfato de potássio, usado em fertilizantes; e diversos produtos industrializados, tais como lâmpadas de LED.
Sobre duas outras listas com 1.098 e 974 itens, a tarifa subiria a 20% e 10%, respectivamente. Elas incluem muitos produtos de uso doméstico, tais como alvejante e creme dental, e diversos tipos de roupas e equipamentos industriais correlatos, como trajes de banho masculinos e máquinas para produzir sapatos.
Uma lista menor, com 595 produtos, não teria tarifas elevadas para além dos 5% vigentes atualmente. Entre os itens estão produtos químicos e materiais industriais como formol e lítio. Componentes eletrônicos e mecânicos, como motores de partida para automóveis, aviões e barcos, e impressoras 3D, também ficariam isentos do aumento.
As tarifas chinesas vigorarão a partir de 1º de junho, e o aumento da alíquota americana também só se fará sentir depois dessa data, o que dá algum tempo aos negociadores para que cheguem a um acordo. Bens chineses que já estavam em trânsito antes da sexta-feira ficarão sujeitos à tarifa de 10%, desde que cheguem aos Estados Unidos antes de 1º de junho.
"A China está mantendo sua estratégia de retaliação proporcional e direcionada, contra as tarifas americanas. A mensagem do governo chinês é clara - as autoridades querem uma solução para a disputa comercial mas não evitarão um confronto, se Trump escolher esse caminho", disse Eswar Prasad, professor de comércio internacional na Universidade Cornell.
A Casa Branca e o representante do governo dos Estados Unidos para assuntos de comércio internacional se recusaram a comentar sobre a retaliação chinesa. Os dois países afirmaram que as conversações entre eles continuariam apesar da escalada.
Financial Times, tradução de Paulo Migliacci