Improviso marca fim do governo do presidente Michel Temer
Nos Estados Unidos, uma expressão sintetiza o melancólico fim dos mandatos presidenciais: “lame duck” (pato manco). Por aqui, o declínio do poder do ocupante do Planalto é medido por um indexador imaginário chamado “temperatura do cafezinho”. Quanto mais frio, mais perto está o governo do fim.
A frase resume a impotência do mandatário diante da inércia de seus assessores, da ausência de homenagens, dos paparicos habituais, da agenda esvaziada, dos projetos que não saem do papel. Mais impopular presidente desde 1989, Temer é considerado ruim ou péssimo 73% dos brasileiros, segundo o Datafolha. Já foi pior —82% em junho—, mas o alto índice mantém o presidente sob regime de “café frio”.
Três meses depois de ter anunciado sua desistência de concorrer à reeleição, o emedebista está preso a uma atmosfera de fim de governo, mesmo tendo pela frente mais de quatro meses de gestão.
Uma das marcas de um fim prematuro é a agenda esvaziada, com apenas um ou dois compromissos diários, e eventos cada vez mais em tom de improviso, anunciados de última hora e sem protocolo.
Há um clima de isolamento de Temer, cujas manhãs e tardes têm sido preenchidas principalmente por encontros com ministros que ficam no Planalto: Sergio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional), Gustavo Rocha (Direitos Humanos), Carlos Marun (Secretaria de Governo) e Eliseu Padilha (Casa Civil). Nenhum deles concorre às eleições de outubro.
Parlamentares aliados, antes presentes quase diariamente, como os deputados Beto Mansur (MDB-SP) e Darcísio Perondi (MDB-RS), têm se distanciado e evitado aparecer ao lado do presidente para não serem contaminados com sua impopularidade.
Perondi, que é médico, foi recentemente a um evento no Planalto para liberação de linha de empréstimos para as Santas Casas, mas não desceu a rampa ao lado de Temer, como costumava fazer.
O ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que disputa a Presidência pelo MDB, também evita fazer menções diretas a Temer em entrevistas. Ao contar sua experiência como gestor, ele cita nominalmente o ex-presidente Lula, em cuja gestão esteve à frente do Banco Central.
Na tentativa de reverter essa imagem de paralisia e fim de governo antes do tempo, a equipe presidencial tem tentado levar mais eventos para o palácio. Um exemplo é a cerimônia realizada em 16 de agosto. Em vez de ir pessoalmente ao congresso das Santas Casas, em Brasília, Temer decidiu realizar na sede do governo um evento no qual anunciou uma linha de financiamento com recursos do FGTS para as instituições.
Num intervalo de pouco mais de um mês, uma mesma medida provisória foi tema de dois eventos no Planalto, ambos com direito a discursos e participação de convidados: o primeiro em 11 de junho e o segundo em 31 de julho, anunciado com menos de meia hora de antecedência.
Tratavam da destinação de recursos da loteria federal ao Fundo Nacional de Segurança Pública, tema que o governo tenta explorar para melhorar sua popularidade desde o anúncio da intervenção federal no Rio, em fevereiro.
A primeira versão da MP foi revogada depois de um mês devido a reclamações de que o repasse de recursos para os ministérios da Cultura e de Esporte seria prejudicado. Nova medida foi editada para corrigir a diferença.
Mesmo com o esforço para transmitir a impressão de que o governo não está paralisado, os eventos têm tom de improviso: textos são assinados sem que a área de comunicação distribua explicações sobre de que se trata.
Outro exemplo é a sanção do projeto de lei que cria um mecanismo proteção de dados pessoais, em 14 de agosto. Os vetos presidenciais só foram anunciados ao fim do evento, depois da saída de Temer. Em seu discurso, o presidente afirmou que havia suprimido alguns trechos da lei, como o que se referia à autoridade reguladora de proteção de dados. Ele disse que o órgão seria criado agora por meio de um projeto de lei.
Minutos depois, teve sua declaração contrariada por seus ministros, que se esforçavam para apresentar os vetos mostrando papéis em suas mãos. Eles explicaram que, na verdade, ainda não se sabia se a autoridade reguladora seria criada por meio de lei ou de uma medida provisória.
A chefe da missão da OEA (Organização dos Estados Americanos) que acompanhará as eleições do Brasil a convite do governo federal foi recebida na última semana por Temer sem qualquer preparativo ou protocolo.
Laura Chincilla, ex-presidente da Costa Rica e responsável pela observação de eleições em países como Estados Unidos e México, entrou no Palácio do Planalto por uma porta lateral e foi abordada por jornalistas em tom de informalidade, sem que a assessoria da Presidência organizasse entrevista coletiva ou divulgasse informações oficiais sobre a missão.
Temer tem aproveitando ainda o esvaziamento do Congresso para fazer viagens internacionais. Desde julho, quando as inaugurações de obras passaram a ser proibidas devido à lei eleitoral, o presidente visitou África do Sul, Cabo Verde, México e Paraguai. Até o fim do ano, ele planeja ir aos Estados Unidos, onde participará da assembleia geral da ONU em setembro, e à Argentina, onde haverá encontro do G-20.
O emedebista estuda ir ao Líbano, onde tem familiares. A assessoria informou que não há definição sobre a ida ao país do Oriente Médio, mas não descartou a possibilidade da visita presidencial.