'Papillon' é remake de sucesso que mostra o fim da criatividade no cinemão

Liberdade era uma experiência tão improvável no Brasil de 1974 que pode ajudar a entender o sucesso aqui da primeira versão de “Papillon”. O filme foi lançado no país em janeiro daquele ano e reprisado, por ser bom de bilheteria, enquanto durou a ditadura.

Que impacto causará hoje a luta pela liberdade do protagonista, um ladrão francês acusado da morte de um agente e condenado à prisão numa colônia mais perto do inferno que do paraíso?

Enquanto o sucesso da versão dos anos 1970 pode ter sido uma manifestação calada de um público reprimido, o que a mesma história pode representar em 2018?

Os que ainda guardam o original na memória vão ter a impressão de que suas qualidades não são mero saudosismo. Afinal, Steve McQueen e Dustin Hoffman formavam uma dupla de primeira grandeza, o roteiro de Dalton Trumbo tinha um subtexto subversivo e o diretor Franklin J. Schaffner era astuto para dar um viés crítico ao entretenimento.

Mas vivemos em outros tempos e o espectador agora é hiperativo. Por isso, o livro de memórias de Henri Charrière foi readaptado, e a direção de Michael Noer está mais preocupada com a intensidade da ação do que em explorar alguma moral da história.

Já pouco importa o fato de Henri ser condenado por uma armação, ter sido preso por injustiça e não por ser ladrão. O interesse agora se deslocou para sua obsessão de escapar, sua resistência física e psicológica aos suplícios e a simpatia de sua cumplicidade com o frágil Louis Dega.

Ou seja, nada que já não tenha sido visto em episódios da série “Prison Break” ou similares e nenhum impacto em comparação com outros filmes de cárcere. Nem o diretor da cadeia chega a ter uma crueldade apavorante.

Chama a atenção como ficou suavizado o processo de degradação. A diarreia agora é limpa, a solitária parece ser higienizada todas as manhãs e até a barata não é mostrada com repugnância.

“Por que há tantas refilmagens ruins de bons filmes?”, questiona um crítico do jornal The Guardian. Como outros remakes contemporâneos, “Papillon” não sinaliza apenas o esgotamento criativo do cinemão. Aqui, trata-se de refazer e também de limpar, de apagar os sinais negativos, tornando tudo belo e inócuo.

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