Por que Bolsonaro precisa ler Paulo Freire
O presidente eleito Jair Bolsonaro quer acabar com a progressão continuada, combater a suposta doutrinação nas escolas, eliminar Paulo Freire das salas de aula e implantar educação à distância no ensino fundamental para as regiões rurais. Essas são algumas das ideias mais presentes no seu plano de governo e nas entrevistas que ele ou seus assessores deram.
Não concordo com essa agenda, e explicarei a razão na próxima coluna –portanto, esperem alguns dias para me ofender. Porém, mesmo se fosse um apoiador de Bolsonaro, eu ficaria bem preocupado. Esses pontos não atacam os principais problemas da educação pública no país. Eles não garantem que todo professor vai ter prazer em ensinar e todo aluno, prazer em aprender.
Se Bolsonaro quer dar uma educação de qualidade japonesa aos brasileiros, precisa tapar os ouvidos, por um minuto, para as pessoas que o chamam de mito. Fãs não são bons conselheiros. Afinal, independente da posição ideológica, há um razoável consenso sobre o que melhora a educação no Brasil. É fundamental investir na formação e valorização de professores e na infraestrutura das escolas, para ficar em dois pontos simples.
Dito isso, quero deixar cinco sugestões de leituras para o presidente. Aliás, elas servem não só para ele, mas para qualquer pessoa que deseja aprender mais sobre a área. Afinal, não se faz educação sem aprender sobre ela, certo? Vamos lá.
Plano Nacional de Educação
O documento foi construído durante os governos passados, mas a participação foi da sociedade toda, da direita à esquerda. Ele tem metas claras em várias frentes. Educação infantil, alfabetização, ensino fundamental, ensino médio, o PNE abrange tudo o que o país considera essencial na área. O presidente eleito pode até discordar de alguns pontos, mas não seria sábio jogar fora esse conjunto de objetivos. Nele, o Brasil diz que educação quer construir para o futuro próximo.
Base Nacional Comum Curricular
A BNCC (Base Nacional Comum Curricular) do Ensino Infantil ao Fundamental atravessou dois governos, um impeachment e vários ministros da educação. Embora sofra críticas da direita e da esquerda, ela é um bom documento. Ajuda a discutir qualidade educacional porque prevê o que cada estudante deve aprender em qual ano. Aliás, a BNCC estava prevista na Constituição justamente por ser essencial para o debate de qualidade educacional. O documento é bem técnico, mas a Nova Escola o explicou detalhadamente para facilitar a compreensão de todo mundo interessado no tema. Se Bolsonaro quiser ler, tem tudo explicadinho aqui.
Nenhum presidente acorda de manhã e pensa “quero me inspirar nos piores sistemas educacionais do mundo”. Quem tem boas equipes claramente vai buscar inspiração, referências, dados e evidências em países nos quais a educação é de qualidade para todo mundo, todos os dias. Para facilitar essa discussão, Nova Escola fez uma reportagem mostrando o que os melhores países em educação têm em comum. Dica: todos investem pesado na formação de professores.
“Formando mais que um professor”, de Elizabeth Green
Bolsonaro tem grande admiração pelos EUA, mas é bom saber que a educação americana tem seus problemas também – alguns, muito graves. Neste livro, a jornalista e educadora Elizabeth Green analisa as reformas educacionais nos EUA, explica o que deu certo, o que deu errado e mostra por que investir em professores é fundamental.
"Educação como Prática de Liberdade", de Paulo Freire
Eu sei, eu sei... Vai parecer provocação, mas não é. Bolsonaro e seus apoiadores são grandes críticos de Paulo Freire. A questão é que Paulo Freire entrou naquela categoria de intelectuais muito discutidos, mas pouco lidos. Quem se aprofunda no trabalho dele pode até discordar de vários pontos, mas certamente vai admirar sua paixão pelo estímulo ao pensamento livre, à diversidade, à educação conectada ao mundo real. E, mesmo que Bolsonaro discorde de cada linha do livro, é bom conhecer o pensamento de quem você discorda. Eu faço isso sempre –e é um exercício excelente.