Promotoria investiga novos mandantes, dois anos após chacina de Colniza
Dois anos depois da chacina que matou nove trabalhadores rurais na agrovila de Taquaruçu do Norte, em Colniza (MT), em 19 de abril de 2017, o Ministério Público de Mato Grosso apura se existem outros mandantes do crime.
Alguns dos que estão presos apontados como autores dos disparos podem ser absolvidos por falta de provas, segundo a Procuradoria.
O madeireiro Valdelir João de Souza é apontado hoje como único mandante. Ele está foragido desde o dia da chacina. Souza contratou um grupo conhecido como “encapuzados” para matar os trabalhadores da região, diz a Promotoria. Os quatro supostos executores da chacina estão presos, mas nenhum deles foi a julgamento.
"Ali o interesse não era só de um madeireiro, tinha mais gente interessada, e eles sabiam que se fizessem uma 'limpeza' na área todo mundo iria embora”, afirmou o promotor de Justiça de Colniza Aldo Kawamura Almeida. “Provavelmente haverá uma nova denúncia contra outros réus e eventualmente alguns destes cinco réus podem ser inocentados. Alguns deles estão com provas muito fracas."
Depoimentos de testemunhas no processo, segundo o promotor, indicaram a possibilidade de haver outros mandantes do crime. Há indícios de que empresários de Rondônia e de Mato Grosso também foram beneficiados com as mortes, com a liberação da área para a extração ilegal de madeira.
O trabalhador rural Sandro Xavier, 28, filho de uma das vítimas do massacre, conta que a estratégia de matar nove para expulsar o restante deu certo. Atualmente menos de 20 das 200 famílias que viviam na época em Taquaruçu do Norte continuam lá, segundo ele.
Xavier nunca mais voltou ao local, e diz que sua família nunca recebeu qualquer auxílio ou proteção do governo estadual ou federal.
“Depois que houve a chacina ninguém nos procurou. Nossa família é de classe baixa e a gente vai sobrevivendo, um ajudando o outro, mas fica desestruturado porque tudo que a gente tinha estava lá, gastamos uns R$ 100 mil nas terras, coisas que meu pai vendeu para comprar a terra e produzir”, conta Xavier.
Sebastião Ferreira de Souza, 57, pai de Sandro, foi encontrado com golpes de facão na cabeça e hematomas pelo corpo. Ele morreu degolado. Pastor evangélico, liderava a Cooperoosevelt (Cooperativa Agrícola Mista de Produção Roosevelt), desativada depois da chacina.
Desde o início da ação criminal, duas testemunhas desistiram de depor; uma delas foi morta. O empresário do ramo madeireiro Alex Gimenes Garcia foi assassinado no dia 28 de julho do ano passado com 13 tiros à queima-roupa, na cidade de Ariquemes (RO). O depoimento de Garcia havia apontado que madeireiros da região sabiam do crime 50 dias antes de ter sido cometido.
A Secretaria de Estado de Assistência Social e Cidadania do Governo de Mato Grosso afirmou, em nota, que não pode informar se as vítimas citadas na reportagem estão ou estavam sob os cuidados de algum programa de proteção às testemunhas porque se trata de um assunto sigiloso.
A Polícia Civil de Mato Grosso informou que as buscas pelo mandante da chacina de Colniza não terminaram e são realizadas em parceria com policiais de Rondônia.
AS VÍTIMAS
Sebastião de Souza, 57
Pastor da Assembleia de Deus em Guatá, distrito de Colniza a cerca de 140 km de Taquaruçu do Norte. Era um dos posseiros da linha (picada) 15, alvo de disputa. Sua casa no local já havia sido incendiada em 2014. Foi encontrado com um facão enterrado na nuca.
Fábio dos Santos, 37
Trabalhava principalmente como pedreiro. Foi contratado pelo pastor Sebastião de Souza para limpar o terreno —o dia de trabalho custa cerca de R$ 55 na região. Morava em uma vila próxima e não tinha terras. Evangélico da Assembleia de Deus, deixou quatro filhos.
Ezequias de Oliveira, 26
Posseiro, tinha um lote fora da área em disputa e estava no local trabalhando como diarista. Fiel da Assembleia de Deus.
Edison Antunes, 32
Outro posseiro que estava no local contratado como diarista. Era diácono da Assembleia de Deus. Tinha quatro filhos.
Aldo Carlini, 50
Um dos que estavam no local trabalhando como diarista. Seu lote está fora da área em conflito.
Samuel da Cunha, 23
Recém-chegado de Nova Brasilândia (RO), estava no local como diarista e também tinha lote fora da linha 15.
Valmir do Nascimento, 55
Um dos três mortos que tinham lote na linha 15, área do assentamento em disputa. Foi encontrado com as mãos amarradas para trás. Tinha dois filhos.
Izaul dos Santos, 50
Posseiro da linha 15. Respondia a um processo por homicídio simples. Seu filho e sua nora são dois dos quatro que estavam na área da chacina e conseguiram fugir.
Francisco da Silva, 56
Também estava no local como diarista. Em agosto de 2015, foi multado em R$ 115 mil pelo Ibama por ter desmatado ilegalmente 22 hectares de floresta.